April 22, 2016

O golpe no exterior


Fernando Molica

É compreensível que a oposição tente jogar na conta da Dilma a responsabilidade pelas muitas reportagens e editoriais de importantes jornais, revistas e TVs internacionais que criticam o processo de impeachment. Mas chega a ser constrangedor que jornalistas brasileiros afirmem que colegas do New York Times, Wall Street Journal, Le Monde, Guardian, CNN e Economist (para citar apenas os principais) estejam sendo enganados pela presidente.

Chega-se a dizer que os repórteres desses veículos são desinformados, inocentes, incapazes de separar a realidade do discurso oficial. Engraçado é que as reportagens internacionais que eles publicaram sobre o Petrolão eram sempre destacadas por aqui e tomadas como exemplos de verdade absoluta. Parece que, agora, nossos coleguinhas internacionais ficaram idiotas e governistas.

Li vários artigos e reportagens que saíram nos últimos dias na imprensa internacional. Em linhas gerais, iam na mesma linha: Dilma não é acusada de roubo; o presidente da Câmara e centenas de deputados respondem a processos; o vice-presidente articula para chegar ao poder; a votação do impeachment foi constrangedora; o afastamento da presidente tem tudo para piorar a situação econômica do país. Uai, alguma novidade nisso tudo, tem alguma mentira aí? Vale citar que os colegas gringos não negaram a roubalheira na Petrobras, a corrupção no governo petista e as tais pedaladas fiscais.

Alguns de nossos colegas brasileiros afirmam que, ao falar em golpe, Dilma transforma o Brasil numa republiqueta, algo que afetará os investimentos estrangeiros, que aumenta a insegurança institucional. Bem, a sessão de domingo e os votos em nome de Deus, dos netos, da família e do torturador não ajudaram a melhorar nossa imagem, né? E, caramba, ao falar em fraude nas eleições, ao dizer que as urnas eletrônicas tinham sido manipuladas, o PSDB também contribuiu para nos atrelar aos países mais folclóricos da região. Até hoje a derrota nas urnas não foi deglutida, o que contribui para aumentar a instabilidade política.

Ao falar em "golpe", Dilma e seus aliados apenas reforçam o caráter político do processo de impeachment, uma característica ressaltada o tempo todo pela oposição - citada até mesmo para justificar a necessidade de o STF não entrar no mérito do eventual impedimento da presidente, afinal de contas, impeachment é um processo político (quantas vezes não ouvimos isso nas últimas semanas?). Enfim, se a oposição pode (e pode mesmo, é do jogo) tratar do tema politicamente, é razoável que o governo também possa.

É muita inocência também achar que os petistas não iriam lutar contra o impeachment, que iriam ficar quietos. Claro que fariam barulho. O governo é acusado de, ao resistir ao impeachment, manter o país na confusão por, pelo menos, mais seis meses (tempo do julgamento de Dilma pelo Senado), mas a oposição também contribuiu para o caos, principalmente depois da eleição de Eduardo Cunha para a presidência da Câmara, ajudou a piorar um governo que já era muito ruim. Enfim, o processo é político, os lados em disputa têm o direito de usar suas armas.

O DIA , 22 DE ABRIL DE 2016 

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