March 31, 2017

Documentos da censura oferecem nova leitura sobre relação entre ditadura e samba


Para pesquisador americano, papéis comprovam o silenciamento dos negros

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March 27, 2017

Uma cronica visual de 300 desenhos: IMS inaugura exposição sobre J. Carlos


Mostra traz obras do caricaturista que comentou costumes e fatos no país

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Desenho publicado na revista “Para Todos” em maio de 1931: traço único e técnica impecável do artista sobreviveram ao período de quase 50 anos em que atuou na imprensa - Divulgação


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RIO — Na primeira metade do século XX, com a fotografia ainda parcamente utilizada na imprensa, e geralmente muitas vezes com borrões imprecisos, caricaturistas e chargistas cumpriam o papel de traduzirem com seus traços fatos e costumes da época. José Carlos de Brito Cunha (1884-1950), o J. Carlos, foi um dos maiores deles — em 49 anos de atividade, iniciada em 1902, quando publicou no “Tagarela”, semanário de Raul Pederneiras. Caricaturista histórico, produziu mais de 50 mil desenhos, vistos em revistas como “Careta”, “O Malho” e “Para Todos”. Através deles, comentou temas tão diversos, desde trânsito no Rio em vias de virar metrópole às guerras que assolavam a Europa — sem falar nos desenhos dirigidos a crianças. Uma parte reduzida, mas ainda assim bastante expressiva desse material, pode ser vista a partir de hoje no Instituto Moreira Salles na exposição “J. Carlos: originais”.

A mostra traz um panorama da produção do artista dividida em quatro seções: a primeira delas exibe as suas pesquisas estéticas, com capitulares, vinhetas, lay-outs de páginas (ele chegou a ser diretor artístico de dez revistas simultaneamente, quando trabalhava para a empresa O Malho S.A., editora da revista de mesmo nome e também de publicações como “O Tico-Tico”, “Cinearte”, “Ilustração Brasileira” e “Leitura Para Todos”, entre outras).

ACERVO: No centenário de J. Carlos, a reportagem da filha de Drummond

A seção Brasil reúne desenhos que fazem a crônica da vida urbana e doméstica no país, além de um pequeno período (1945-50) na “Careta”, em que registrou acontecimentos políticos. No segmento Segunda Guerra traz traço e olhar afiados de um atento comentarista internacional: Churchill, Mussolini, Stálin, Hitler e Roosevelt, nenhum protagonista do conflito esteve imune à sua pena.
— Esse monstro trabalhou quase 49 anos. Fez bem acima de 50 mil desenhos em menos de 18 mil dias. Nesse painel gigantesco, tudo o que aconteceu no Rio de Janeiro, no Brasil e no mundo nesses 50 anos foi tema para ele. Era um cronista fabuloso — diz Cássio Loredano, colaborador do GLOBO e curador da exposição ao lado de Paulo Roberto Pires e de Julia Kovensky.




A quarta parte da mostra é dedicada a seus desenhos para crianças. Ele publicou principalmente no semanário “O Tico-Tico”, dirigida ao público infantil. A exposição reúne vários exemplos de seus trabalhos, como sete dos oitos desenhos produzidos como aberturas de capítulos para o único livro que escreveu, o infantil “Minha babá”, que seriam reproduzidos nas capas da revista; e as histórias em quadrinhos com os personagens Goiabada, Lamparina, Jujuba e Carrapicho, que ocupavam a contracapa da revista, nas quais chama a atenção o arroubo gráfico.

Os quase 300 desenhos exibidos fazem parte da coleção Eduardo Augusto de Brito e Cunha, filho do artista, formada por mil originais e ainda toda a coleção encadernada das muitas revistas onde publicou. Loredano teve acesso a ela quando, em 1995, ganhou uma bolsa de pesquisa da Rioarte, instituto da prefeitura do Rio, para inventariar a obra do caricaturista. O trabalho de um ano estendeu-se, como diz, por 22 anos e, desde então, além de três exposições (incluindo a atual), já rendeu seis livros organizados por ele, entre os quais “O Rio de J. Carlos” (1998), com texto de Zuenir Ventura, “Lábaro estrelado” (2000), com texto de Luciano Trigo — uma reunião de desenhos que exaltam os símbolos nacionais, numa afirmação da República contra os saudosistas do Império —, e “J. Carlos contra a guerra” (2000), com texto de Arthur Dapieve — além da Segunda Guerra, ele comentou, em cartuns e charges, outros três conflitos: a Primeira Guerra, a Guerra Civil Espanhola e o início da Guerra Fria.

A pesquisa incansável de Loredano acabou trazendo à tona o trabalho de um artista, que, apesar de ser muito associado à Belle Époque do Rio (são notáveis as suas melindrosas, refletindo seu mergulho nos estilos art-nouveu e no art-déco), não se restringiu ao período em que esteve presente na mídia.

— São poucos os caricaturistas que têm uma presença permanente, geralmente são conhecidos durante o período em que estão atuando — observa Julia. — O J. Carlos, não. As pessoas podem não saber o seu nome, onde trabalhou, mas quando veem um desenho seu, reconhecem o traço. É uma particularidade sua, essa personalidade tão forte.


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Os quase 300 desenhos exibidos fazem parte da coleção Eduardo Augusto de Brito e Cunha, filho do artista, formada por mil originais e ainda toda a coleção encadernada das muitas revistas onde publicou. Loredano teve acesso a ela quando, em 1995, ganhou uma bolsa de pesquisa da Rioarte, instituto da prefeitura do Rio, para inventariar a obra do caricaturista. O trabalho de um ano estendeu-se, como diz, por 22 anos e, desde então, além de três exposições (incluindo a atual), já rendeu seis livros organizados por ele, entre os quais “O Rio de J. Carlos” (1998), com texto de Zuenir Ventura, “Lábaro estrelado” (2000), com texto de Luciano Trigo — uma reunião de desenhos que exaltam os símbolos nacionais, numa afirmação da República contra os saudosistas do Império —, e “J. Carlos contra a guerra” (2000), com texto de Arthur Dapieve — além da Segunda Guerra, ele comentou, em cartuns e charges, outros três conflitos: a Primeira Guerra, a Guerra Civil Espanhola e o início da Guerra Fria.
A pesquisa incansável de Loredano acabou trazendo à tona o trabalho de um artista, que, apesar de ser muito associado à Belle Époque do Rio (são notáveis as suas melindrosas, refletindo seu mergulho nos estilos art-nouveu e no art-déco), não se restringiu ao período em que esteve presente na mídia.
— São poucos os caricaturistas que têm uma presença permanente, geralmente são conhecidos durante o período em que estão atuando — observa Julia. — O J. Carlos, não. As pessoas podem não saber o seu nome, onde trabalhou, mas quando veem um desenho seu, reconhecem o traço. É uma particularidade sua, essa personalidade tão forte.

March 26, 2017

Alone in the Wild for a Year, TV Contestants Learn Their Show Was Canceled


Contestants on “Eden,” filmed in the Scottish Highlands, were to “take on the challenge of building a new life and creating a society from scratch.” Credit Kieran Dodds for The New York Times Foto de: Kieran Dodds for The New York Times

The remaining contestants on a reality television series have emerged after surviving 12 months in the Scottish wilderness — fending off hunger, infighting and fatigue — only to learn that the show stopped broadcasting after four episodes, the last of them in August.
The show, “Eden,” was billed as a unique social experiment in which 23 men and women living in isolation “would take on the challenge of building a new life and creating a society from scratch,” according to a statement promoting the show.
The contestants were taken to a 600-acre estate on the remote Ardnamurchan peninsula on the west coast of Scotland, which is known for its forests, lochs and beaches.
But “Eden” proved to be anything but paradise.
Over time, all but 10 contestants quit the show, The Press and Journal of Aberdeen, Scotland, reported. Those who left cited concerns about health and safety, boredom and swarms of tiny biting insects called midges.
The contestants were on an uninhabited private estate that the Ministry of Defense used as a training ground during World War II, The Radio Times of London reported. A six-foot fence was erected on three sides of the estate, with the fourth side bordered by the sea, it said.
The series was filmed with a crew of four embedded with the contestants, who also had personal cameras. A rig of 45 cameras, described by The Radio Times as a network of closed-circuit television cameras that could be controlled remotely, was also used.
Unlike American reality television shows, such as the “Survivor” series — in which contestants compete against one another — “Eden” had no winners or losers. It was intended to feature the making of a society from scratch.
The show followed the contestants, which included a doctor, a chef, a carpenter and a shepherd, as they debated their own rules and laws and decided on their living arrangements.
“The series aims to challenge everything about modern living, raising questions about what we need to be happy, what we want from our communities and how we are influenced by society as a whole,” the television station behind the series, Channel 4, said in a statement.
Goats, sheep, pigs and chickens and equipment for fishing and hunting were supplied. Materials for building, cooking and safety and hygiene were also provided.
But for some, the primitive accommodations proved too much, and they took to getting food and liquor from the pockets of civilization that dot the region, according to news accounts.
Four episodes of the show were aired and viewership dropped to 800,000 from 1.7 million. The first episode aired on July 18 and the last on Aug. 8.
Channel 4 said the show would return later this year, The Guardian reported.
“The appeal of Eden is that it was a real experiment, and when filming began we had no idea what the results would be and how those taking part would react to being isolated for months in a remote part of the British Isles,” the station said.

March 22, 2017

Ex-chefe de campanha de Trump agia em favor do Kremlin, diz agência



O ex-diretor da campanha do presidente Donald Trump, Paul Manafort, trabalhou secretamente para um bilionário russo para promover os interesses do presidente russo, Vladimir Putin, há dez anos, e propôs uma estratégia política ambiciosa para minar a oposição à Rússia nas antigas repúblicas soviéticas. O trabalho parece negar afirmações do governo Trump e do próprio Manafort de que ele nunca trabalhou para interesses russos.

Manafort propôs em um plano estratégico confidencial, em junho de 2005, que influenciaria a política, negócios empresariais e a cobertura da imprensa dentro dos EUA, na Europa e nas antigas repúblicas soviéticas para beneficiar o governo Putin, embora as relações EUA-Rússia estivessem piorando durante o governo do presidente republicano George W. Bush. Manafort apresentou os planos ao magnata russo do alumínio Oleg Deripaska, um aliado próximo de Putin com quem Manafort acabou assinando um contrato anual de US$ 10 milhões a partir de 2006, segundo entrevistas com várias pessoas ligadas a pagamentos a Manafort e registros empresariais obtidos pela agência AP.

Manafort e Deripaska mantiveram relações de negócios até pelo menos 2009, segundo uma pessoa familiarizada com o trabalho.
Drew Angerer/Getty Images/AFP
Paul Manafort, chefe de campanha do candidato presidencial republicano Donald Trump
Paul Manafort, ex-chefe de campanha de Donald Trump
"Hoje somos da opinião de que esse modelo poderá beneficiar muito o governo Putin, se for empregado nos níveis corretos com o comprometimento adequado para ter sucesso", escreveu Manafort no memorando de 2005 a Deripaska. A iniciativa, escreveu Manafort, "oferecerá um grande serviço, capaz de reenfocar, interna e externamente, as políticas do governo Putin".

Os planos de Manafort foram expostos em documentos obtidos pela AP, entre os quais memorandos estratégicos e registros que mostram transferências de valores internacionais de milhões de dólares. Não fica claro, porém, o volume de trabalho que Manafort realizou sob o contrato.

A revelação ocorre em meio a investigações do FBI e do Congresso sobre os supostos contatos da equipe de campanha de Trump com autoridades russas. Os serviços de inteligência dos EUA acusam o Kremlin de ter interferido nas eleições presidenciais do ano passado por meio de ciberataques para beneficiar o republicano.

Manafort refutou as investigações como politicamente motivadas e desorientadas, e disse que nunca trabalhou para os interesses russos. Os documentos obtidos pela AP mostram que os laços de Manafort com a Rússia eram mais estreitos do que fora revelado anteriormente.

Em uma declaração à AP, Manafort confirmou que trabalhou para Deripaska em vários países, mas declarou que o trabalho está sendo pintado injustamente como "inadequado ou mal intencionado" como parte de uma "campanha de difamação".

"Eu trabalhei com Oleg Deripaska há quase uma década, representando-o em negócios e assuntos pessoais em países onde ele tinha investimentos", disse Manafort. "Meu trabalho para Deripaska não envolvia representar os interesses políticos da Rússia."

Deripaska tornou-se um dos homens mais ricos da Rússia sob Vladimir Putin, comprando ativos no exterior de maneiras amplamente consideradas benéficas aos interesses do Kremlin. Telegramas diplomáticos dos EUA a partir de 2006 descreveram Deripaska como "entre os dois a três oligarcas a quem Putin recorre regularmente" e "um elemento mais ou menos permanente nas viagens de Putin ao exterior". Em resposta a perguntas sobre a firma de consultoria de Manafort, um porta-voz de Deripaska em 2008 –pelo menos três anos depois que começaram a trabalhar juntos– declarou que Deripaska nunca contratou a firma. Outro porta-voz de Deripaska em Moscou não quis responder a perguntas da AP na semana passada.

Perguntado na quarta-feira (15) sobre o trabalho de Manafort para Deripaska, a porta-voz da Casa Branca Sarah Huckabee disse: "Não achamos apropriado comentar sobre alguém que não é funcionário da Casa Branca".

Manafort trabalhou como presidente não remunerado da campanha de Donald Trump de março até agosto do ano passado. Trump pediu que Manafort renunciasse depois que a AP revelou que Manafort tinha orquestrado uma operação de lobby encoberta em Washington até 2014 em prol do partido político governante da Ucrânia, pró-russo.
Os registros empresariais recém obtidos ligam Manafort mais diretamente aos interesses de Putin na região. Segundo esses registros e pessoas que conhecem diretamente o trabalho de Manafort para Deripaska, Manafort fez planos para abrir um escritório em Moscou, e pelo menos parte de seu trabalho na Ucrânia foi dirigido por Deripaska, e não por interesses políticos de lá. O escritório em Moscou não foi aberto.
Manafort é um dos principais focos da investigação da inteligência americana sobre associados de Trump e a Rússia, segundo uma autoridade dos EUA. A pessoa falou sob a condição do anonimato porque detalhes da investigação são confidenciais. Enquanto isso, promotores criminais federais se interessaram pelas atividades de Manafort anos atrás, como parte de uma ampla investigação para recuperar ativos roubados da Ucrânia depois da deposição do presidente pró-russo Viktor Yanukovich, no início de 2014. Nenhuma acusação criminal foi aberta sobre o caso nos EUA.

O diretor do FBI, James Comey, ao confirmar ao Congresso a investigação de inteligência federal nesta semana, não quis dizer se Manafort foi um alvo. O nome de Manafort foi mencionado 28 vezes durante a audiência na Comissão de Inteligência da Câmara, principalmente sobre seu trabalho na Ucrânia. Ninguém mencionou Deripaska.
Na segunda-feira (20), o secretário de imprensa da Casa Branca, Sean Spicer, citou Manafort quando perguntado sobre possíveis contatos da campanha de Trump com a Rússia. Ele afirmou que Manafort "exerceu um papel muito limitado durante um tempo muito limitado" na campanha, embora como chefe da campanha presidencial de Trump ele a tenha dirigido durante a fase crucial antes da Convenção Nacional Republicana.

Manafort e seus sócios continuam na órbita de Trump. Manafort disse a um colega neste ano que continua falando com Trump por telefone. O ex-sócio de Manafort no Leste Europeu, Rick Gates, esteve na Casa Branca em diversas ocasiões. Gates ajudou a planejar a posse de Trump e hoje dirige uma organização beneficente, America First Policies, que apoia a agenda da Casa Branca.

Gates, cujo nome não aparece nos documentos, explicou à AP que entrou na firma de Manafort em 2006 e sabia que Manafort tinha uma relação com Deripaska, mas não estava inteirado do trabalho descrito nos memorandos. Gates disse que seu trabalho na época se concentrou em lobby interno nos EUA e consultoria política na Ucrânia. Ele disse que parou de trabalhar para a firma de Manafort em março de 2016, quando entrou na campanha presidencial de Trump.

Manafort disse a Deripaska em 2005 que estava promovendo políticas como parte de seu trabalho na Ucrânia, "nos níveis mais elevados do governo americano –a Casa Branca, o Capitólio e o Departamento de Estado", segundo os documentos. Ele também afirmou que havia contratado uma "importante firma de advocacia internacional com relações estreitas com o presidente Bush para apoiar os interesses de nossos clientes", mas não identificou a firma. Manafort também disse que estava empregando peritos legais não identificados para a iniciativa em importantes universidades e grupos de pensadores, inclusive a Universidade Duke, a Universidade de Nova York e o Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais.
Manafort não revelou detalhes sobre o trabalho de lobby para o Departamento de Justiça no período em que o contrato estava em vigor.
Sob a Lei de Registro de Agentes Estrangeiros, as pessoas que fazem lobby nos EUA em prol de líderes ou partidos políticos estrangeiros devem fornecer relatos detalhados de seus atos ao departamento. Deixar de registrar-se propositalmente é crime e pode resultar em até cinco anos de prisão e multa de até US$ 250 mil, mas o governo raramente oferece denúncia criminal.

Deripaska é dono da Basic Element Co., que emprega 200 mil pessoas em todo o mundo nos setores de agricultura, aviação, construção, energia, serviços financeiros, seguros e industrial, e dirige uma das maiores companhias de alumínio do mundo. A "Forbes" estimou seu valor líquido em US$ 5,2 bilhões. Quanto Deripaska pagou a Manafort ao todo não está claro, mas pessoas que conhecem a relação disseram que as transferências de dinheiro a Manafort chegaram a dezenas de milhões de dólares e continuaram até pelo menos 2009. Elas falaram sob a condição do anonimato porque não tinham autorização para discutir publicamente os pagamentos secretos.

Em memorando estratégicos, Manafort propôs que Deripaska e Putin se beneficiassem de lobby junto aos governos ocidentais, especialmente os EUA, para permitir que oligarcas mantivessem a posse de ativos antes estatais na Ucrânia. Ele propôs a construção de "relações em longo prazo" com jornalistas ocidentais e diversas medidas para melhorar o recrutamento, as comunicações e o planejamento financeiro por partidos pró-russos na região.

Manafort propôs ampliar seu trabalho existente no Leste Europeu ao Usbequistão, Tadjiquistão e Geórgia, onde prometeu reforçar a legitimidade de governos amistosos a Putin e cortar figuras antirrussas por meio de campanhas políticas, grupos sem fins lucrativos e operações de mídia.
Para o contrato de US$ 10 milhões, Manafort não usou sua consultoria de atuação pública, a Davis Manafort. Preferiu uma empresa, a LOAV Ltd., que ele registrou no Estado de Delaware (EUA) em 1992.

Ele listou a LOAV no mesmo endereço de suas firmas de lobby e consultoria em Alexandria, na Virgínia. Em outros registros, o endereço da LOAV constava como a casa de Manafort, também em Alexandria. Manafort vendeu a casa em julho de 2015 por US$ 1,4 milhão. Hoje possui um apartamento na Trump Tower em Nova York, além de outras propriedades em Nova York e na Flórida.

Um memorando estratégico para Deripaska foi escrito por Manafort e Rick Davis, seu sócio na época. Em respostas por escrito à AP, Davis declarou que não sabia que sua firma tinha apresentado um plano para promover de maneira encoberta os interesses do governo russo.

Davis disse acreditar que Manafort usou seu nome sem sua permissão no memorando estratégico. "Meu nome estava em todos os papéis timbrados usados pela empresa e em todo memorando anterior a 2006. Isso não significa que eu tive algo a ver com o memorando descrito", afirmou Davis. Ele tirou licença da firma no final de 2006 para trabalhar na campanha presidencial de John McCain em 2008.

O trabalho de Manafort com Deripaska continuou durante anos, apesar de eles terem uma ruptura exposta em 2014 em um tribunal de falências nas nas ilhas Cayman. O bilionário deu a Manafort quase US$ 19 milhões para investir em uma empresa de TV ucraniana chamada Black Sea Cable, segundo documentos legais apresentados por representantes de Deripaska. Eles disseram que depois de pegar o dinheiro Manafort e seus sócios pararam de responder às indagações de Deripaska sobre como os fundos foram usados.

No início da campanha presidencial nos EUA em 2016, representantes de Deripaska acusaram abertamente Manafort de fraude e prometeram recuperar o dinheiro. Depois que Trump conseguiu a nomeação, os representantes de Deripaska disseram que não falariam mais sobre o caso.
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Lei Rouanet: produtores avaliam mudanças apresentadas pelo Ministério da Cultura

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De instrumento fundamental para o financiamento da cultura brasileira a legislação impossível de ser cumprida. Produtores ouvidos pelo GLOBO divergem sobre a Lei Rouanet, mas defensores e críticos concordam que mudanças eram necessárias. O ponto positivo apontado por todos é a maior transparência, da apresentação do projeto à prestação de contas, trazida pela nova Instrução Normativa, apresentada ontem pelo ministro da Cultura, Roberto Freire. Contudo, alguns produtores ressaltam que o teto para cachês pode inviabilizar algumas produções.

Renata de Almeida, diretora da Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, acredita que a reforma era necessária e vê a prestação de contas como o principal gargalo:


Renata de Almeida, diretor da Mostra Internacional de Cinema 
em São Paulo, aponta gargalo na prestação de contas - Divulgação
— Na Lei Rouanet temos que ficar com os papéis por dez anos. Temos um galpão inteiro alugado só para guardar notas. Tudo o que vem para democratizar e facilitar os processos é bem-vindo. Quanto mais burocrático, mais custo vai gerar e pior vai ser — afirma Renata.


‘A melhor notícia é que o valor de cada item poderá ser alterado dentro de um limite de até 50%, sem autorização prévia do ministério.’

- Eduardo Barata Presidente da APTR

Sobre este tema, Eduardo Barata, presidente da Associação dos Produtores de Teatro do Rio de Janeiro (APTR), destaca que a prestação de contas on-line, em paralelo à execução, permite que o proponente encerre o projeto com as contas fechadas. Barata aponta outra boa notícia para os produtores:

— A melhor notícia é que o valor de cada item poderá ser alterado dentro de um limite de até 50%, sem autorização prévia do ministério. No ato da inscrição dos projetos, estamos inseridos numa realidade econômica. Na execução, geralmente passado, no mínimo, um ano, a realidade do país e do setor cultural, certamente, já possui outra configuração.

Diretor do Instituto Itaú Cultural, observa que "antes tínhamos vários entendimentos do TCU e do MinC sobre o que era ou não como contrapartida":

— Pela primeira vez teremos uma declaração do que é ou não permitido. Isso também é uma aposta na transparência. As exigências aumentam, mas a transparência também é maior. Agora, vamos ter uma curva de aprendizado. É preciso que o MinC esteja atento a isso. As melhorias vão vir, mas elas acontecem com a prática.

TETO PARA PROJETOS E CACHÊS

As novas regras também trazem o limite de R$ 10 milhões para os projetos, que será ampliado em 50% caso eles sejam realizados nas regiões Nordeste, Norte e Centro-Oeste. Os cachês de artistas e modelos solo não poderão exceder R$ 30 mil, enquanto a remuneração de grupos ficará limitada a R$ 60 mil. No caso das orquestras, o valor será de R$ 30 mil para o maestro e R$ 1,5 mil por músico. Esse teto já tinha sido estabelecido pela Comissão Nacional de Incentivo à Cultura (CNIC) em 2013. Renata Borges, produtora de musicais como “Cinderela” e “Peter Pan”, vê problemas.

— O teatro musical tem necessidades especiais. Temos maestro, orquestra. O teto de R$ 10 milhões não faz a conta fechar. Um projeto que ficará seis meses em cartaz pode precisar de mais do que isso. Cada caso deveria ser analisado individualmente — questiona a produtora. — Esse teto pode ser ampliado para projetos voltados a regiões como Nordeste, mas e os teatros de lá? Há funcionários suficientes? Todos nós queremos viajar, mas como fazer? O buraco é mais embaixo.

Carla Camurati, ex-diretora do Theatro Municipal, vê possível
 dificuldades para montagem de óperas
Marcos Ramos / Marcos Ramos/19-06-2016
Para Carla Camurati, cineasta e ex-presidente do Teatro Municipal, o teto dos cachês pode atrapalhar a música clássica.

— Uma ópera, por exemplo, precisa de uma voz específica, alguém especial. Nesse caso, pode ser um problema. Enfim, o dia a dia vai mostrar os problemas, mas só o fato de o ministério estar se propondo a realizar transformações é algo bom. Antes, estava difícil para todo mundo — diz Carla.

 'Vai virar uma colcha de retalhos para se tentar corrigir o que está errado. Não adianta estabelecer o valor dos cachês, cada artista é um artista'’

- Manoel Poladian  Empresário de shows

Nem todo mundo crê que as mudanças farão diferença. Manoel Poladian, empresário responsável pela produção de grandes shows nacionais e internacionais, é firme:

— Essa lei nasceu morta tecnicamente, ela foi feita sem nenhum zelo e é, desde o início, inexequível. Ela faz exigências irreais e nenhum contador, por mais mágico que seja, consegue aplicá-la corretamente. Usei a Rouanet uma vez só, há mais de 20 anos, e acabei tendo prejuízo. Ela só dá certo para aquele cara que faz festa de casamento do filho, é uma lei muito propícia a fraudes. Agora, ela vai virar uma colcha de retalhos para se tentar corrigir o que está errado. O governo está bem intencionado, mas não adianta estabelecer o valor dos cachês, cada artista é um artista, e cada evento é um evento. Melhor era revogar a Rouanet e criar outra lei que proíba abusos, como o dos patrocinadores que usufruem dos convites para fazer política de relacionamento com os seus clientes.

SEM IMPACTO NA LITERATURA

As mudanças não devem afetar as festas e feiras literárias. Os organizadores explicam que os eventos, hoje, já estão enquadrados abaixo do teto estabelecido pelas novas regras. Tatiana Zaccaro, diretora do Núcleo Bienal na Fagga/GL Events Exhibitions, que realiza a Bienal do Livro do Rio junto ao Sindicato Nacional dos Editores de Livros (Snel), disse que o evento recebeu as alterações com tranquilidade, pois utiliza a lei federal de incentivo à cultura há muito tempo e nunca teve problemas.

‘Em relação ao teto para o valor dos ingressos, a Bienal já tem uma entrada compatível com a renda familiar média.’

- Tatiana Zaccaro Diretora do Núcleo Bienal na Fagga/GL Events Exhibitions

— Em relação ao teto para o valor dos ingressos, a Bienal já tem uma entrada compatível com a renda familiar média, pois o intuito é possibilitar o acesso a um extrato maior da sociedade carioca. Além de receber gratuitamente mais de 170 mil alunos por meio do programa de visitação escolar, professores, educadores, profissionais do livro e autores também têm acesso gratuito ao evento — explica Tatiana.

A Associação Casa Azul, que realiza a Festa Literária Internacional de Paraty (Flip), informou, em nota, que já está adequada às novas regras, pois oferece ingressos a preços populares e tem cotas de gratuidade, além de orçamento inferior ao teto estabelecido. Por ser uma entidade sem fins lucrativos, a Casa Azul afirma que “reinveste toda e qualquer receita excedente em suas próprias atividades culturais”.

Já Afonso Borges, idealizador e curador do Festival Literário de Araxá (Fliaraxá), destaca que o grande diferencial da nova regulamentação apresentada pelo MinC é buscar redistribuir geograficamente os recursos da Lei Rouanet.

— Isso nunca foi tentado antes. E mais: o olhar dedicado do ministro Roberto Freire à questão do livro e da leitura pode fazer diferença na sua gestão — afirma Borges.

Jerônimo Vargas, diretor da Base Eventos, que faz a LER — Salão Carioca do Livro, vê com bons olhos o limite para microempresas estabelecido pela nova regulamentação do MinC. Pela nova norma, o valor máximo autorizado para captação por empresário individual (MEI) ou pessoa física é de R$ 700 mil. Vargas torce por mais agilidade no processo de aprovação de projetos.

— Não creio que vá haver mudança para as feiras literárias, que ficam abaixo do teto. Acho que o mais importante é ter agilidade maior na aprovação. O tempo para aprovar é tão grande que muitos projetos são cancelados no caminho.

*Colaboraram Alessandro Giannini, Bolívar Torres, Luiz Felipe Reis e Silvio Essinger

March 21, 2017

Moro determina condução coercitiva e quebra sigilo de comunicação de blogueiro


mônica bergamo

O juiz Sergio Moro, da 13ª Vara Federal do Paraná, determinou a condução coercitiva do blogueiro Eduardo Guimarães, que edita o Blog da Cidadania. A Polícia Federal cumpriu o mandado na manhã desta terça (21) e levou o profissional para a superintendência do órgão, onde ele deu depoimento.
O juiz ordenou ainda "a apreensão de quaisquer documentos, mídias, HDs, laptops, pen drives, arquivos eletrônicos de qualquer espécie, aquivos eletrônicos pertencentes aos sistemas e endereços eletrônicos utilizados pelos investigados, agendas manuscritas ou eletrônicas, aparelhos celulares, bem como outras provas encontradas relacionadas aos crimes de violação de sigilo funcional e obstrução à investigação policial".

Foram apreendidos dois celulares e um notebook na casa do blogueiro, cuja página na internet se caracteriza por duras críticas ao governo de Michel Temer e às condutas de integrantes da Operação Lava Jato, sendo considerada alinhada com partidos de esquerda, como o PT.

No ano passado, Guimarães antecipou informações sobre a condução coercitiva do ex-presidente Lula, que ocorreu em março. Na época, o Ministério Público Federal reclamou e disse que o fato, que teria atrapalhado a operação, seria investigado, embora vazamentos sejam comuns na operação.
De acordo com o advogado Fernando Hideo Lacerda, que representa Guimarães, a PF perguntou ao blogueiro, no depoimento, quem foi a fonte da informação.

"Foi uma arbitrariedade. Ninguém tem a obrigação de revelar o nome de sua fonte. O sigilo é garantido pela Constituição", afirma Hideo Lacerda.

 Segundo ele, a PF já sabia quem passou a informação a Guimarães e, por isso, ele acabou abrindo o sigilo e confirmando o nome. "Ele falou antes de eu chegar e de orientá-lo quanto à garantia de sigilo", diz o advogado.
 
A condução coercitiva foi objeto de protesto do deputado Paulo Teixeira (PT-SP), que interpelou Moro nesta terça, ao prestar depoimento por videoconferência como testemunha em um inquérito da Lava Jato.

De acordo com Teixeira, ele afirmou a Moro que "ninguém, no Brasil, pode ser preso por delito de opinião". Moro teria respondido que Guimarães não era jornalista. Teixeira disse então que não há exigência de diploma para que uma pessoa mantenha um blog, e que também a ela é garantido o sigilo da fonte.

A Folha enviou o relato de Teixeira ao juiz e também o questionou sobre os protestos do advogado do blogueiro. A assessoria de Moro enviou a seguinte resposta do magistrado: "Sem comentários".
"O que está em jogo é a liberdade de expressão. Moro quer chegar à fonte do Eduardo Guimarães. É um precedente perigosíssimo", disse Teixeira à Folha.

Além da apreensão de aparelhos eletrônicos de Guimarães, o juiz autorizou "o exame e a extração de cópias de mensagens eletrônicas armazenadas nos endereços eletrônicos utilzados pelo investigado".
Permitiu também o acesso dos policiais a arquvos eletrônicos "e mensagens eletrônicas armazenadas em eventuais computadores ou em dispositivos eletrônicos de qualquer natureza, inclusive smartphones, que forem encontrados, com a impressão do que for encontrado e, se for necessário, a apreensão de dispositivos de bancos de dados, disquetes, CDs, DVDs ou discos rígidos".

Guimarães já tinha sido intimado, em fevereiro, para prestar esclarecimentos em outra investigação, sobre supostas ameaças que ele teria feito ao juiz Sergio Moro nas redes sociais. Ele chamou o magistrado de psicopata no Twitter e disse, dirigindo-se aos leitores, que os "delírios" do juiz "vão custar seu emprego, sua vida".

A página que ele edita informou que o depoimento do blogueiro estava marcado para "daqui a várias semanas". E afirmou: "O intimado avisa que só irá dar novas informações após o depoimento. O blogueiro também informa que tem 57 anos e, durante essas quase seis décadas de vida, nunca, jamais foi acusado de qualquer tipo de ilegalidade nem na Justiça e muito menos na polícia".

FOLHA, 21 DE MARÇO DE 2017





March 20, 2017

He’s a Local Pillar in a Trump Town. Now He Could Be Deported.

Elizabeth Hernandez with her sons, from left, Gianluca, 6, Kharloz, 8, and Maximus, 2, at their home in West Frankfort, Ill. Ms. Hernandez’s husband, Juan Carlos Hernandez Pacheco, was taken into custody earlier this month by Immigration and Customs Enforcement. Credit Whitney Curtis for The New York Times Foto de: Whitney Curtis for The New York Times

Elizabeth Hernandez with her sons, from left, Gianluca, 6, Kharloz, 8, and Maximus, 2, at their home in West Frankfort, Ill. Ms. Hernandez’s husband, Juan Carlos Hernandez Pacheco, was taken into custody earlier this month by Immigration and Customs Enforcement. Credit Whitney Curtis for The New York Times Foto de: Whitney Curtis for The New York Times

WEST FRANKFORT, Ill. — Ask residents of this coal-mining crossroads about President Trump’s decision to crack down on undocumented immigrants and most offer no protest. Mr. Trump, who easily won this mostly white southern Illinois county, is doing what he promised, they say. As Terry Chambers, a barber on Main Street, put it, the president simply wants “to get rid of the bad eggs.”
But then they took Carlos.

Juan Carlos Hernandez Pacheco — just Carlos to the people of West Frankfort — has been the manager of La Fiesta, a Mexican restaurant in this city of 8,000, for a decade. Yes, he always greeted people warmly at the cheerfully decorated restaurant, known for its beef and chicken fajitas. And, yes, he knew their children by name. But people here tick off more things they know Carlos for.
How one night last fall, when the Fire Department was battling a two-alarm blaze, Mr. Hernandez suddenly appeared with meals for the firefighters. How he hosted a Law Enforcement Appreciation Day at the restaurant last summer as police officers were facing criticism around the country. How he took part in just about every community committee or charity effort — the Rotary Club, cancer fund-raisers, cleanup days, even scholarships for the Redbirds, the high school sports teams, which are the pride of this city.

“I think people need to do things the right way, follow the rules and obey the laws, and I firmly believe in that,” said Lori Barron, the owner of Lori’s Hair A’Fairs, a beauty salon. “But in the case of Carlos, I think he may have done more for the people here than this place has ever given him. I think it’s absolutely terrible that he could be taken away.”

On Feb. 9, Mr. Hernandez, 38, was arrested by federal immigration agents near his home, not far from La Fiesta, and taken to a detention facility in Missouri. The federal authorities confirmed that he remained in custody, but would not comment on the precise reason for or timing of his arrest.
Immigration officials noted that Mr. Hernandez had two drunken-driving convictions from 2007, a circumstance that could make him a higher priority for deportation. Friends of his say he crossed into the United States from Mexico in the late 1990s and had started but never completed efforts to legalize his status.

What happened when federal immigration agents showed up in a small town that voted overwhelmingly for President Trump, transforming his campaign rhetoric into reality.



As Victor Arana, a lawyer for Mr. Hernandez, began pressing in court to seek release for Mr. Hernandez on bond until his case can be heard, the community has rallied around him, writing pleas for leniency to the officials who will decide his fate.
Tom Jordan, the mayor of West Frankfort, wrote that Mr. Hernandez was a “great asset” to the city who “doesn’t ask for anything in return.” The fire chief described him as “a man of great character.”
The letters have piled up — from the county prosecutor, the former postmaster, the car dealer, the Rotary Club president. In his note, Richard Glodich, the athletic director at Frankfort Community High School, wrote, “As a grandson of immigrants, I am all for immigration reform, but this time you have arrested a GOOD MAN that should be used as a role model for other immigrants.”
This is an uncomfortable stance for a place like West Frankfort. This county, Franklin, backed Mr. Trump with 70 percent of the vote, largely on hopes, people here say, that he could jump-start the coal industry, which has receded painfully here over decades. Illegal immigration was by no means the most pressing issue for this overwhelmingly white area, residents say.
Still, many say they concur in principle with Mr. Trump’s wish to be more aggressive in blocking those who seek to sneak across the border. Things grew more tangled when principle met West Frankfort’s particular reality, in the form of Carlos.
Many people said they had no idea Mr. Hernandez lacked legal status until word of his arrest began spreading.
“I knew he was Mexican, but he’s been here so long, he’s just one of us,” said Debra Johnson, a resident. She said she saw a distinction between “people who come over and use the system and people who actually come and help.”
Mr. Hernandez has been the manager of La Fiesta for a decade. Townspeople say he has done much more than serve them Mexican food. Credit Whitney Curtis for The New York Times Foto de: Whitney Curtis for The New York Times



Not everyone feels Mr. Hernandez should be treated unlike anyone else without permission to be here. As friends have gathered words of support for him through an email address — istandwithcarlos@gmail.com — other messages have arrived there, too. “Carlos is probably a nice man, but he broke our country’s law,” one email read. Some critics point to the two drunken-driving cases. (His friends say he quit drinking after that.)

Asked about Mr. Hernandez, a spokesman for Immigration and Customs Enforcement released a statement that read, in part: “Every day, as part of routine operations, ICE officers target and arrest criminal aliens and other individuals who are in violation of our nation’s immigration laws.”
After a report of his detention appeared in a local newspaper, The Southern Illinoisan, some comments were pointed:
“No U.S. citizen is above the U.S. law! If a U.S. citizen breaks a law they go to jail or prison! No illegal alien is above the U.S. law!”
And: “I get that this man has been here for years and years and has contributed to society, but he isn’t LEGAL, therefore the U.S. has every right to throw him out.”
And: “A couple thousand down, millions to go.”
Around West Frankfort, some people grow quiet when asked whether some undocumented people should be granted exceptions.
“With everything that’s gone on — we’ve had years of unemployment rates that are skyrocketing — I would like to see some of the people that I know go back to work before I worry about people from other countries coming here and making a better life for themselves,” said Audrey Loftus, 38, a bartender at the local Veterans of Foreign Wars post.
But Mr. Hernandez, Ms. Loftus said, has left her “on the fence” about what should happen now. “I hate to use the word rednecks, but this is southern Illinois,” she said. “This is the definition of a good old boys’ club, and you don’t have a lot of people of different ethnicities that are in this area.
Juan Carlos Hernandez Pacheco with his wife, Elizabeth, in a photograph provided by her.

“And then there’s Carlos,” she continued. “You will not find a single person that has anything bad to say about him.”

Mr. Hernandez’s lawyer said that a hearing was expected in his case on Wednesday and that he was hoping Mr. Hernandez might be released on bond as any legal action went forward.

His wife, Elizabeth Hernandez, who attained United States citizenship late last year, according to Mr. Arana, said she was struggling to sleep, since her husband was detained. The couple has three sons, the youngest 2.

“What I’m really worrying about,” she said in a telephone interview, “is what am I going to tell my three boys if he can’t stay here?”

Tim Grigsby, who owns a local printing shop and considers Mr. Hernandez one of his closest friends, has been helping to lead the efforts to bring Mr. Hernandez back to West Frankfort. He said he had always known that Mr. Hernandez did a lot around town. But he said that even he did not grasp the scope of it all until the letters started flowing in.

There was the pastor who described Mr. Hernandez helping at a funeral, the family that remembered him raising hundreds of dollars for its son’s hearing aid, the businessman who said that he was mostly a private person but that Mr. Hernandez was one of the few people he invites over for dinner.

Mr. Grigsby said he still would vote for Mr. Trump. One never agrees with everything a politician does, “but maybe this should all be more on a per-case basis,” he said. “It’s hard to be black and white on this because there may be people like Carlos.”

© 2017 The New York Times Company.

March 19, 2017

Prefeito do Rio proibiu esta matéria e fez com o repórter fosse demitido. E O DIA aceitou.


Febre amarela: população critica filas e falta de informações nos postos

Caio Barbosa

O medo da febre amarela fez o carioca acordar cedo, ontem, para correr aos postos de saúde em busca de vacinas para se proteger da doença. Mas em vez de uma solução, o que se viu foram filas, mau atendimento e falta de informação. Na Tijuca, moradores chegaram antes das 7h ao Centro de Saúde Heitor Beltrão, na Rua Desembargador Isidro, e tiveram de esperar até 13h para serem vacinados. A falta de cuidado, de informação e atenção dos funcionários com quem chegava à unidade de saúde davam o tom do atendimento.
 
"Cheguei aqui às 7h e só vacinaram os 80 primeiros. Eu fui a de número 81. Quando chegou a minha vez, disseram que só havia mais 80 vacinas para a parte da tarde. E que eu deveria ficar aqui até a tarde se quisesse ser vacinada. Uma falta de respeito", reclamou Sônia Penha de Oliveira Nascimento, de 53 anos.

O engenheiro Hugo Blasquez, que estava exatamente atrás de Sônia na fila, se aborreceu pela segunda vez nesta semana no posto de saúde da Tijuca. Na terça-feira, sua esposa, maior de 60 anos, foi ao posto munida de um atestado médico que lhe autorizava a receber a vacina, e ainda assim saiu sem receber a dose.

"Ela ficou na fila e, na vez dela, quem a atendeu se recusou a vacinar porque no atestado estava a palavra "liberada" em vez de "apta". É inacreditável. Hoje, colaram cartaz informando que apenas quem está com viagem marcada seria vacinado. Mas a própria pessoa que colou o cartaz, diretora do posto, disse que a informação estava errada. Como pode uma coisa dessas?" reclamou.

A diretora do posto de saúde, que se apresentou como Patrícia, disse que não poderia dar declarações, e que estas seriam de responsabilidade da secretaria municipal de Saúde. Quem esperava por uma vacina, no entanto, cobrava explicações que não vinham.

"Não era essa a gestão que prometeu cuidar das pessoas? Bem, pelo que a gente está vendo até agora, parece mais humilhar as pessoas", criticou a professora Luiza Souza Gomes.

Na Zona Sul, no Centro de Saúde Píndaro de Carvalho Rodrigues, na Gávea, a falta de vacinas suficientes também provocou filas. Naquela unidade, apenas 100 pessoas foram vacinadas pela manhã, e outras 100 à tarde. Muitas voltaram para casa insatisfeitas. Caso do cantor Leo Jaime, que não conseguiu vacinar o filho Davi, de 9 anos.

"Os funcionários até que nos explicaram a situação. A culpa não é deles. São 100 vacinas, mas a questão é que há um caso de urgência, há muitas pessoas apavoradas. Cinco macacos morreram na região devido à doença. Eu moro em frente ao Parque Lage e todos lá consideram que a questão é urgente, menos a prefeitura. Aumentar a vacinação nas escolas, a informação, tomar medidas que tranquilizem a população, pelo visto, não é com a prefeitura", lamentou Leo Jaime.

A secretaria municipal de Saúde informou que até o dia 28 haverá a ampliação do número de pontos de vacinação – de 34 para 233 unidades da rede de Atenção Primária (Clínicas da Família e Centros Municipais de Saúde), após reforço no estoque da vacina. Ao todo, o Rio receberá 1,5 milhão doses.
Em nota oficial divulgada na segunda-feira, a secretaria informou que o "Rio permanece fora da zona de risco da doença" e "que não há casos de febre amarela urbana no país desde 1942".




 “É muito importante que a população tenha em mente que poderá buscar a vacina na rede durante todo o ano e que é muito importante respeitar as indicações para a vacina, uma vez que este imunizante é feito com vírus vivo atenuado, o que pode gerar efeitos colaterais graves. Todos serão imunizados, não há motivo para alarde ou corrida aos postos”, explicou o secretário municipal de Saúde, Carlos Eduardo, na nota.


A vacina da febre amarela tem contraindicações que serão rigorosamente seguidas pelas equipes técnicas. Não podem tomar a vacina crianças menores de 9 meses e adultos acima de 60 anos; gestantes e mulheres que estejam amamentando crianças menores de 6 meses; pacientes com doença ou em tratamento que cause imunodeficiência, como câncer ou HIV sintomático; pessoas com história de reação anafilática relacionada a substâncias presentes na vacina ou alergia a ovo de galinha e seus derivados.

Os pontos de vacinação abrem diariamente às 7h e distribuem senhas para a vacina da febre amarela, conforme suas capacidades técnicas de segurança dos pacientes e boas práticas de vacinação. As senhas também são distribuídas na parte da tarde. Em abril, todas as unidades de Atenção Primária estarão aptas a aplicá-la e a vacina passará a fazer parte do calendário de imunização do Estado do Rio.

O DIA, MARÇO DE 2017 

March 18, 2017

Philip Roth E-Mails on Trump






In 2004, Philip Roth published “The Plot Against America.” The four main characters of the novel, which takes place between June, 1940, and October, 1942, are a family of American Jews, the Roths, of Newark—Bess, Herman, and their two sons, Philip and Sandy. They are ardent supporters of Franklin Delano Roosevelt, but, in Roth’s reimagining, Roosevelt loses his bid for a third term to a surprise Republican candidate—the aviator Charles Lindbergh—whose victory upends not only politics in America but life itself.

The historical Lindbergh was an isolationist who espoused a catchphrase that Donald Trump borrowed for his Presidential campaign, and for his Inaugural Address: “America First.” The fictional Lindbergh, like the actual Trump, expressed admiration for a murderous European dictator, and his election emboldened xenophobes. In Roth’s novel, a foreign power—Nazi Germany—meddles in an American election, leading to a theory that the President is being blackmailed. In real life, U.S. intelligence agencies are investigating Trump’s ties to Vladimir Putin and the possibility that a dossier of secret information—kompromat—gives Russia leverage with his regime.

Roth wrote in the Times Book Review that “The Plot Against America” was not intended as a political roman à clef. Rather, he wanted to dramatize a series of what-ifs that never came to pass in America but were “somebody else’s reality”—i.e., that of the Jews of Europe. “All I do,” he wrote, “is to defatalize the past—if such a word exists—showing how it might have been different and might have happened here.”

Last week, Roth was asked, via e-mail, if it has happened here. He responded, “It is easier to comprehend the election of an imaginary President like Charles Lindbergh than an actual President like Donald Trump. Lindbergh, despite his Nazi sympathies and racist proclivities, was a great aviation hero who had displayed tremendous physical courage and aeronautical genius in crossing the Atlantic in 1927. He had character and he had substance and, along with Henry Ford, was, worldwide, the most famous American of his day. Trump is just a con artist. The relevant book about Trump’s American forebear is Herman Melville’s ‘The Confidence-Man,’ the darkly pessimistic, daringly inventive novel—Melville’s last—that could just as well have been called ‘The Art of the Scam.’ ”

American reality, the “American berserk,” Roth has noted, makes it harder to write fiction. Does Donald Trump outstrip the novelist’s imagination?

Roth replied, “It isn’t Trump as a character, a human type—the real-estate type, the callow and callous killer capitalist—that outstrips the imagination. It is Trump as President of the United States.
“I was born in 1933,” he continued, “the year that F.D.R. was inaugurated. He was President until I was twelve years old. I’ve been a Roosevelt Democrat ever since. I found much that was alarming about being a citizen during the tenures of Richard Nixon and George W. Bush. But, whatever I may have seen as their limitations of character or intellect, neither was anything like as humanly impoverished as Trump is: ignorant of government, of history, of science, of philosophy, of art, incapable of expressing or recognizing subtlety or nuance, destitute of all decency, and wielding a vocabulary of seventy-seven words that is better called Jerkish than English.”

Roth retired from writing at seventy-seven, but, given Trump’s threats to muzzle journalism that is critical of him, what role does he see for American writers of today?

“Unlike writers in Eastern Europe in the nineteen-seventies, American writers haven’t had their driver’s licenses confiscated and their children forbidden to matriculate in academic schools. Writers here don’t live enslaved in a totalitarian police state, and it would be unwise to act as if we did, unless—or until—there is a genuine assault on our rights and the country is drowning in Trump’s river of lies. In the meantime, I imagine writers will continue robustly to exploit the enormous American freedom that exists to write what they please, to speak out about the political situation, or to organize as they see fit.”

Many passages in “The Plot Against America” echo feelings voiced today by vulnerable Americans—immigrants and minorities as alarmed by Trump’s election as the Jews of Newark are frightened by Lindbergh’s. The book also chronicles their impulse of denial. Lindbergh’s election makes clear to the seven-year-old “Philip Roth” that “the unfolding of the unforeseen was everything. Turned wrong way around, the relentless unforeseen was what we schoolchildren studied as ‘History,’ a harmless history, where everything unexpected in its own time is chronicled on the page as inevitable. The terror of the unforeseen is what the science of history hides, turning a disaster into an epic.”

Asked if this warning has come to pass, Roth e-mailed, “My novel wasn’t written as a warning. I was just trying to imagine what it would have been like for a Jewish family like mine, in a Jewish community like Newark, had something even faintly like Nazi anti-Semitism befallen us in 1940, at the end of the most pointedly anti-Semitic decade in world history. I wanted to imagine how we would have fared, which meant I had first to invent an ominous American government that threatened us. As for how Trump threatens us, I would say that, like the anxious and fear-ridden families in my book, what is most terrifying is that he makes any and everything possible, including, of course, the nuclear catastrophe.” 

March 17, 2017

Desigualdade não é detalhe



A reforma da Previdência em tramitação não leva em conta que a situação dos mais pobres


Flávia Oliveira

 O defeito da reforma da Previdência proposta pelo governo de Michel Temer em fins de 2016 — e, agora, assombrada por uma centena e meia de emendas parlamentares — está menos na necessidade que no conteúdo. O debate sobre a mudança de regras na concessão de aposentadorias e pensões divide o país entre os que a consideram essencial, desejável ou dispensável. O que os dois primeiros grupos não conseguiram explicar à sociedade brasileira é por que motivo a conta será paga por quem menos tem. É essa a consequência de, na formulação do projeto, a burocracia ter desprezado as diferentes dimensões da desigualdade brasileira. Assim, ignora exatamente o fator que forjou — e ainda molda — essas terras. Isso não é detalhe.

Vivêssemos na Suécia, onde o Índice de Gini (principal medidor da desigualdade de renda) é metade do brasileiro, este artigo sequer precisaria ser escrito. Mas — aquele abraço à torcida do Flamengo, da qual tomei o bordão — isso aqui é Brasil. Nas bandas de cá, tratar desigualmente os desiguais é que faz diferença. A proposta de reforma ignora assimetrias de gênero, raça, região e acesso ao mercado de trabalho. De quebra, fratura a rede de proteção que livra da pobreza extrema idosos e pessoas portadoras de deficiência.


O Brasil, IBGE à frente, produz informações socioeconômicas suficientes para a equipe econômica desenhar um modelo de previdência e seguridade que, para variar, privilegie quem menos tem. Os arquitetos da reforma, contudo, preferiram, por medo dos enfrentamentos processuais, assegurar direitos adquiridos e despejar a fatura no colo dos mais pobres, deixando para trás tanto o conceito de justiça social quanto os efeitos pró-cíclicos da transferência de renda. Sete em cada dez cidades brasileiras têm nas aposentadorias e pensões um volume de recursos superior ao que recebem do Fundo de Participação dos Municípios, segundo estudo do Anfip-Dieese. Sem a Previdência, portanto, irão a nocaute.


A reforma que está em tramitação no Congresso Nacional não leva em conta que os brasileiros mais pobres, em particular mulheres e negros, começam a trabalhar muito cedo, mas a contribuir mais tarde. Do emprego sem carteira assinada, da ocupação autônoma e da atividade auxiliar em empreendimento familiar 44% das mulheres brasileiras tiram o sustento. Significa que, mais por distorções do mercado que por vontade própria, estão em atividade profissional, mas não recolhem ao INSS. Sem falar na jornada semanal feminina, que supera em sete horas e meia a dos homens, informou o Ipea, em razão das atribuições domésticas e familiares. É mais trabalho sem contribuição, que não vale para a Previdência.


Mulheres, negros e jovens são os três grupos populacionais com as maiores taxas de desemprego e os menores rendimentos. Portanto, além de quase sempre subempregados no começo de carreira, eles passam mais tempo à procura de ocupação e têm baixa remuneração. É a essa gente que o governo brasileiro quer impor dez anos mais de contribuição (de 15 para 25 anos), não de trabalho, e idade mínima de 65 anos. Quem quiser se aposentar pelo teto aos 65 terá de contribuir por 49 anos, a partir dos 16. Regras como essas fazem da aposentadoria um sonho distante.


Mas a reforma também dificulta o acesso aos benefícios dos que estão abaixo da linha da pobreza. O projeto eleva a idade para receber o benefício de prestação continuada. Se não conseguir se aposentar, o idoso com renda domiciliar per capita inferior a um quarto do salário mínimo só fará jus ao repasse governamental ao completar 70 anos, em vez dos atuais 65. O pagamento não mais será vinculado ao piso nacional. Seguirá valor arbitrado pelo governo e corrigido por índice de inflação — ou seja, ficará abaixo do mínimo, hoje de R$ 937.


Por fim, a idade mínima única, sem atenuantes regionais, vai impor injustiça adicional aos brasileiros do Norte, do Nordeste e das periferias e das comunidades populares nos grandes centros. A dispersão na esperança de vida é conhecida: maranhenses vivem 70,3 anos, catarinenses, 78,7. Mas há também diferenças no total de idosos nas unidades da federação. Segundo o IBGE, estados como Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul têm hoje 21,7% dos habitantes com 60 anos ou mais de idade. No outro extremo (geográfico e etário) estão Amapá (8,5%), Roraima (10,8%) e Amazonas (11,4%). A proporção de idosos é baixíssima, porque não é tarefa fácil envelhecer por lá. Impor uma idade mínima única ao país limará o extremo Norte dos repasses previdenciários.


Tantas desigualdades deveriam ser consideradas, em vez de ignoradas. É justo.


O GLOBO, 17 DE MARÇO DE 2017

March 15, 2017

Villalobos: Façamos o muro


JUAN PABLO VILLALOBOS

Façamos o muro. Nós, os mexicanos, o pagaremos, de acordo. Mas o faremos nós mesmos e colocaremos um posto de socorro a cada 20 quilômetros. Um albergue com médicos, comida, água, camas para descansar e recuperar as forças, aulas de inglês. E o mais importante: vamos incluir muitas portas ao longo do muro, milhares. Portas que só tenham travas de um lado: o nosso.

Façamos o muro. Nós, os mexicanos, pagaremos por ele, de acordo. Mas primeiro vamos pedir um empréstimo aos Estados Unidos para construí-lo. Ao Banco Mundial. Melhor ainda: ao Fundo Monetário Internacional. Faremos uma licitação para o projeto arquitetônico do muro. Outra licitação para a construção. E outra, quando ele estiver pronto, para a gestão.

Convidaremos apenas nossos amigos para participar das licitações, é claro. E que ganhem as licitações os mais amigos entre todos nossos amigos. Os do projeto arquitetônico atrasarão sua entrega muito, muito mesmo: anos (são arquitetos medíocres, mas são nossos melhores amigos).
A construção só começará com anos de atraso. E em pouco tempo haverá problemas com alvarás de construção. E mais problemas com os fornecedores dos materiais. E greves dos trabalhadores. Depois de dois meses a primeira parte construída apresentará rachaduras e umidade, levando à suspensão temporária da construção do muro.

Assim se passarão os anos e, com um pouco de sorte, também passarão os presidentes dos Estados Unidos, até que chegue um a quem a construção de um muro não interesse. Melhor ainda: até que chegue um que dê ordens de parar com a construção do muro (não devolveremos o dinheiro do empréstimo, é claro.)

Façamos o muro. Nós, mexicanos, pagaremos por ele, de acordo. Um muro verde, ecológico, uma cerca viva. Uma cerca, para sermos específicos, feita de pés de maconha. Primeiro, é claro, legalizemos a maconha para finalidades de construção de muros. E então veremos como mudarão os fluxos migratórios: as pessoas do Norte correndo em debandada rumo ao Sul, para fumar nosso muro.

Contrariamente ao que se poderia esperar, não os deteremos. Pelo contrário. Todos nos encontraremos na fronteira, e uma nova época de amizade e fraternidade surgirá entre os dois povos.
Façamos o muro. Pagaremos por ele nós, os mexicanos, de acordo. Mas façamo-lo como atração turística, como parque de diversões. Vamos chamá-lo de "o Muro da Vergonha" ou algo desse estilo. Ao lado dele instalaremos museus sobre o racismo, o imperialismo, a discriminação. E mirantes para poder ver de longe como são as coisas do outro lado do muro.

Virão turistas japoneses, chineses, alemães, escandinavos, turistas do mundo inteiro. Nosso muro será um grande negócio e criará milhares de postos de trabalho. Que, é claro, serão ocupados pelos migrantes que não possam atravessar o muro.

Façamos o muro. Nós, mexicanos, pagaremos por ele, de acordo. Um muro invisível, como a roupa invisível do imperador. Um muro que apenas as pessoas inteligentes possam ver. Nós, mexicanos, o construiremos com tijolos invisíveis e aço também invisível. Libertos de restrições materiais, o ergueremos altíssimo: mil metros de altura. E muito espesso: dois quilômetros de largura.

No dia da inauguração, diremos ao presidente dos Estados Unidos: cá está seu muro; é muito alto, muito largo, mas apenas os inteligentes podem vê-lo. Tenho certeza de que o presidente dos Estados Unidos ficará muito contente.

JUAN PABLO VILLALOBOS, escritor mexicano, é autor dos livros "Festa no Covil", "Se Vivêssemos em um Lugar Normal" e "Te Vendo um Cachorro"

March 14, 2017

Não há déficit na Previdência Social. É isso mesmo?


Marcello Corrêa
 
Uma tese polêmica circula pela internet: não há déficit na Previdência Social. A ideia tem como principal base um estudo da Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Anfip), que sustenta que as contas do Orçamento da Seguridade Social — que engloba os gastos com aposentadorias, pensões, assistência social e saúde — poderiam estar no azul, caso fossem calculadas de forma diferente. Segundo a entidade, o governo deixa de contabilizar receitas e acrescenta despesas a esse orçamento, o que provoca o rombo. A metodologia é contestada pela maioria dos especialistas em contas públicas e pela equipe econômica.

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Considerando o dinheiro que entra, a principal crítica da Anfip é em relação a um mecanismo chamado Desvinculação das Receitas da União (DRU), criado em 1994 para dar mais flexibilidade à forma como o governo pode gastar os recursos arrecadados com impostos e contribuições. Isso porque a Constituição prevê que alguns desses tributos são carimbados — ou seja, devem ser destinados para determinadas áreas. A DRU, criada por emenda constitucional, alterou essas regras, permitindo que o governo mexesse livremente em 20% dessas receitas — no ano passado, esse percentual passou a ser de 30%. As contribuições ao INSS não são afetadas pela DRU.

Mas, para a Anfip, a regra tira dinheiro da Seguridade. Um vídeo, distribuído pelo Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais (Sindifisco), resume o estudo e destaca que o Orçamento da Seguridade Social perdeu R$ 66 bilhões em 2015 por causa da DRU. A legenda diz que “não há rombo na Previdência, e sim um desvínculo anual”, com uso de impostos para outros fins. Nas contas da entidade, haveria superávit de R$ 11,2 bilhões naquele ano, valor suficiente para pagar as despesas da Previdência Social. A Anfip também alega que as desonerações fiscais tiraram dinheiro da seguridade ao longo dos anos.
Os dados do governo estão de acordo com os dos auditores fiscais, mas a equipe econômica nega que seja esse o motivo para o rombo da Previdência. Também em vídeo, criado para rebater a tese de que não há déficit no sistema, o Ministério da Fazenda confirma que as desvinculações chegaram a R$ 61 bilhões em 2015 — número semelhante ao usado pela Anfip —, mas que a Seguridade Social continuaria no vermelho em R$ 106 bilhões naquele ano, mesmo que os recursos não fossem desvinculados. Descontando as receitas usadas na DRU, o déficit calculado pela Fazenda é de R$ 166,5 bilhões.
Déficit da Previdência
A diferença entre os resultados é porque a associação, além de contabilizar volume diferente de receitas, desconsidera algumas despesas em sua metodologia. A principal delas são os gastos com aposentados e pensionistas do serviço público. Na avaliação da Anfip, esses gastos não fazem parte do Orçamento da Seguridade Social, pois são regidos por outro capítulo da Constituição Federal, que detalha o funcionamento dos Regimes Próprios de Previdência Social (RPPS).

Criador da DRU, o economista Raul Velloso explica que, na prática, a DRU não faz mais tanta diferença na conta, por causa do déficit na Seguridade, que se intensificou em 2016. Ele conta que a ideia surgiu para flexibilizar o dinheiro dos impostos criados em 1988, muitos com destinação exclusiva. Mas a estratégia só tem sentido quando sobra dinheiro da Seguridade Social — que, então, pode ser movimentado para dar conta de outros gastos.

Como os gastos com Previdência são obrigatórios, o governo até desvincula esse dinheiro, mas tem de devolver o que tirou e complementar para pagar os benefícios. Esse déficit é bancado pelo Tesouro Nacional.

— A DRU hoje é inócua. Minha invenção foi superada pelos fatos. Ela não consegue tirar mais dinheiro, o que adianta?

Para o presidente da Anfip, o mecanismo é prejudicial ao sistema previdenciário.
— A Contribuição Social sobre Lucro Líquido (CSLL) é destinada exclusivamente para o social. A Cofins é destinada para seguridade social. Como o governo inventa uma DRU que permite retirar 30% dessas receitas, quando o sistema é solidário, e as receitas são de destinação exclusiva? — critica Vilson Romero, presidente da Anfip.
Ele contesta, ainda, a inclusão dos gastos com servidores na conta da Seguridade.
— É uma pedalada na Constituição — resume.

Para o governo, é correto contabilizar os gastos com servidores nessa parte do Orçamento.
— Hoje, o déficit (da Previdência) dos servidores públicos é de R$ 77 bilhões. Eles falam que não é um gasto com seguridade social porque não está no capítulo da seguridade social. Da mesma forma que gasto com professor é de educação, gasto com aposentado, do setor público ou privado, tem que ser Previdência — diz Arnaldo Lima, assessor especial do Ministério do Planejamento.
Benedito Passos, diretor do Núcleo Atuarial de Previdência, concorda com a visão da Anfip.
— A seguridade social poderia ter mais de R$ 1 trilhão de recursos hoje se nos últimos 12 anos não estivéssemos fazendo as transferências — avalia.

A opinião de Passos, porém, não encontra eco entre outros analistas. A maioria dos economistas especializados em contas públicas destaca que a tese do superávit não se sustenta, principalmente porque, no fim das contas, o dinheiro é um só.

— A Previdência Social, e ainda mais a dos servidores, não é uma ilha da fantasia descolada do resto dos Poderes e recursos públicos. Ainda mais porque o seu déficit será sempre pago pelo próprio governo, logo, fica capenga fazer uma análise em que se considera apenas uma parte dos gastos — destaca José Roberto Afonso, economista do Ibre/FGV e professor do IDP.

O economista da FGV Samuel Pessôa destaca que, independentemente da forma de se contabilizar, há déficit, não só no sistema previdenciário, como na Seguridade Social:
— (A tese da Anfip) não pode ser considerada. Há déficit a partir de 2016 (mesmo sem a DRU) e ele será crescente independentemente da forma de contabilizar e de se devolver ou não as desonerações.

O GLOBO, 12 DE MARÇO DE 2017