Florência Costa
NOVA DÉLHI. Com seus longos cabelos negros, seu sári colado ao corpo curvilíneo e um apetite sexual insaciável, a bela dona de casa indiana Savita Bhabhi era a maior inspiração das fantasias sexuais de milhões de indianos. Ela nasceu há um ano, ganhou vida na internet e se transformou na primeira estrela pornô em quadrinhos online da Índia. Mas Savita ganhou um poderoso inimigo: o governo do país a considerou obscena e inaceitável. Assim, as aventuras sexuais dessa “cunhada” indiana — o sobrenome Bhabhi significa mulher do irmão mais velho — chegaram ao fim.
O mais curioso foi que o governo decidiu exterminar a estrela pornô valendose de uma lei usada para casos de segurança nacional, decretada após o ataque terrorista ao sistema de trens de Bombaim em 2006. A legislação permite ao Estado censurar sites que ameaçam a integridade do país e possam perturbar as relações de amizades da Índia com os países vizinhos.
“O que Savita fez para merecer isso?”, era a chamada de um dos muitos artigos da mídia indiana sobre o assunto. Os tradicionalistas acusaram Savita de ser um atentado contra os valores mais arraigados da conservadora sociedade hindu. O flerte com a cunhada mais velha é tema tradicional na cultura popular indiana.
Savita era um símbolo de pensamentos impuros, sonhos sexuais, fantasias, infidelidade. Ela seduziu os indianos: o site
A cada dia havia uma nova história no site. Mesmo casada, ela tinha escapadas sexuais com vários homens: vendedores ambulantes, adolescentes e até juízes de concurso de miss. Um dos últimos episódios mostrava-a seduzindo um personagem que lembra o ator Amitabh Bachchan, ícone de Bollywood.
O autor do quadrinho erótico é um empresário britânico de origem indiana, Puneet Agarwal, de 38 anos. Ele explicou que sua intenção era mostrar a sensualidade das mulheres indianas: — Elas também têm desejo sexual.
Os que criticaram a censura alegam que outros sites pornôs continuam no ar, mesmo com a pornografia proibida no país. Então por que o governo aplicou a lei somente com relação a Savita? A sedutora cunhada usava todos os adereços de uma indiana típica: o sári, o bindi no meio da testa, o mangalasutra (colar que sinaliza o status de casada). Há quem aposte que foi por isso mesmo — por simbolizar a sociedade indiana — que ela acabou vítima da pena de morte.
A vida breve e a morte repentina de Savita provocaram um debate sobre a reprimida sexualidade na terra do Kama Sutra, o milenar tratado erótico indiano.
Para alguns, o episódio revelou a problemática relação dos indianos com o sexo. Muitos achavam que Savita era um símbolo de liberdade, poder e sexualidade da reprimida mulher indiana.
— Isso mostra que somos uma sociedade hipócrita e sexualmente reprimida, ainda que tenhamos monumentos como Khajuraho, com pedras esculpidas há milênios com cenas eróticas — disse o publicitário e comentarista de TV Suhel Seth.
Logo após a censura, no início de junho, o criador de Savita organizou uma campanha de ressurreição de sua criatura: “Salve Savita online”. Foi um sucesso. Mas, na semana passada, o empresário jogou a toalha. Nem ele teve forças para resistir à pressão da conservadora família indiana: — Lamento os problemas causados a todos os blogueiros e fãs que apoiaram essa causa. Questões pessoais e familiares me obrigam a encerrar essa campanha — publicou Punnet Agarwal recentemente em sua página.
O Globo, 9 de agosto de 2009
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