January 7, 2010

OS MELHORES DISCOS DE 2009

“PIMENTEIRA”: Em seu segundo disco, o sambista Pedro Miranda justifica a reverência de Caetano à sua “musicalidade, cultura entranhada, naturalidade e frescor”. Cria da Lapa, Miranda, que integra o grupo Semente e o Cordão do Boitatá, e isso não é novidade alguma, é uma das melhores traduções do samba atual.


“DOIS”: Adriana Calcanhotto retomou seu heterônimo Partimpim e novamente acertou, arrebatando corações e mentes de crianças, de todas as idades, incluindo aquelas já pais e avós. No repertório cabem tanto Caetano (com “Alexandre”) quanto Dylan em versão de Zé Ramalho (“O homem deu nome a todos animais”), passando por João Gilberto (“Bim bom”), Roberto & Erasmo (“Gatinha manhosa”), Villa-Lobos & Ferreira Gullar (“O trenzinho do caipira”) e uma canção de Adriana com seu produtor e baixista, Dé Palmeira (“Baile partimcundum”). Musicalmente, passa, sem fronteiras estéticas, por rock, frevo, samba-reggae...

“MARIA GADÚ”: Em seu disco homônimo de estreia, lançado em julho, então aos 22 anos, Maria Gadú impressionou pela voz forte e bem colocada, indo de “Baba baby” e “Ne me quitte pas”, e também como compositora, caminhando com segurança do samba “Altar particular” à balada pop, em tom de mantra, “Shimbalaiê”.

“CERTA MANHÃ ACORDEI DE SONHOS INTRANQUILOS”: “Há sempre um lado que pesa/ E outro lado que flutua” são os versos que abrem o quarto CD de Otto. É esse o assunto central do pernambucano em seu disco: o peso e a leveza da vida, do amor, da despedida. Com contundência e lirismo, ele une batuques do candomblé, guitarras de rock da década de 1970, programações, naipes de cordas e metais. As participações de Céu, Lirinha e da mexicana Julieta Venegas dão ainda mais força ao repertório, autoral até mesmo quando relê os clássicos “Lágrimas negras” e “Naquela mesa”.

“ODILÊ, ODILÁ”: Quando desembarcou no Brasil há quase dez anos, Nicolas Krassik era apenas um violinista apaixonado pelo samba e pelo choro. E as melodias de João Bosco foram uma de suas primeiras paixões. Hoje podemos dizer que ele é um de nossos melhores músicos, agregado à horda de instrumentistas de todos os lugares que desembarcam o tempo inteiro na Lapa. Seu passeio pela obra do autor de “Coisa feita”, “Linha de passe” e “Corsário”, com arranjos do pianista e acordeonista Marcelo Caldi e produção de Luís Felipe de Lima, é delicioso e pertinente.

“IÊ IÊ IÊ”: Radiofônico até o osso, mas sem deixar de lado a inteligência que caracteriza seu trabalho, Arnaldo Antunes fez talvez o melhor disco de sua carreira. Dialogou com a tradição mais popular de nossa música, visitou clichês de forma original e mostrou que a contribuição tribalista foi maior do que poderia parecer à primeira vista. O artista usou como base o trio que o vem acompanhando nos últimos anos (o baixista Betão Aguiar, o guitarrista Chico Salem e o pianista Marcelo Jeneci) e convidou músicos jovens como Curumin e Fernando Catatau (produtor do CD), e seu antigo parceiro Edgar Scandurra. A alquimia perfeita se completa com versos maduros, apesar de adolescentes — em sua pureza, malícia e vigor.

“UHUUU!”: Quatro anos depois do elogiado “E o método Túfo de experiências”, a banda cearense Cidadão Instigado reafirmou seu caminho singular com “Uhuuu!”. Fernando Catatau (voz, guitarra e teclado), Regis Damasceno (guitarra e violão), Rian Batista (baixo) e Clayton Martin (bateria acústica e eletrônica) aproximam melancolia à la Roberto Carlos, surf music, disco, psicodelia, guitarrada, paranoia e classic rock com resultados surpreendentes — tão estranhos quanto sedutores.

“SÃO MATEUS NÃO É UM LUGAR ASSIM TÃO LONGE”: O título do CD de estreia do cantor, compositor e cavaquinista paulista Rodrigo Campos é grande, assim como sua arte. O disco tem a estrutura de um romance, cada canção é um capítulo, com personagens que estão em mais de uma faixa. Paralelo literário sem perda da musicalidade, passando por sambas, toadas, baladas, em produção (Beto Villares) que mistura instrumental acústico e eletrônico. Um clássico instantâneo.

“CHIAROSCURO”: Pitty não tem pressa: seu terceiro disco de carreira (além de um DVD ao vivo) foi lançado em 2009, depois de o Brasil ouvir e consagrar com calma os dois primeiros, “Admirável chip novo” (2003) e “Anacrônico” (2005). À frente de sua banda — Joe no baixo, Martin na guitarra e Duda na bateria —, a cantora baiana mergulhou no estúdio e saiu com um disco que dá um passo à frente em relação aos anteriores, mais elaborado, experimental. Com isso tudo, ela não deixa de ser Pitty, com humor (como em “Me adora”, talvez a música do ano), fúria e o amor de sempre pelo rock.
“BENITO DI PAULA AO VIVO”: Ícone de uma geração de sambistas populares do discriminado sambão-joia dos anos 1970, juntamente com Luiz Ayrão e Agepê, Benito di Paula ganhou um merecido tratamento de luxo da EMI em sua volta discográfica, com produção de Jorge Cardoso, após 13 anos sem gravar. O cantor, que chegou a bater de frente com Roberto Carlos em número de discos vendidos, com sucessos como “Retalhos de cetim”, ”Mulher brasileira”, “Charlie Brown” e “Do jeito que a vida quer”, teve um justo acerto de contas com sua própria história musical.

Os melhores discos de 2009 foram escolhidos por Antonio Carlos Miguel, Bernardo Araujo, João Pimentel, Leonardo Lichote e Tom Leão. 

O Globo, 31 de dezembro de 2009

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