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March 17, 2020

O futuro desanimador do Anima Mundi




Camila Zarur

Cena de “A era do gelo”, em cuja equipe esteve o brasileiro Carlos Saldanha. Foto: Reprodução
Cena de “A era do gelo”, em cuja equipe esteve o brasileiro Carlos Saldanha. Foto: Reprodução
O Anima Mundi, maior festival de animação da América Latina, em que foram revelados nomes como Carlos Saldanha (das franquias A era do gelo e Rio) e Alê Abreu (do indicado ao Oscar O menino e o mundo), corre sério risco de não acontecer em 2020. Após um 2019 de cortes em verbas públicas para a Cultura e fim de contratos de patrocínio que sustentavam a mostra, pela primeira vez desde sua criação, em 1993, não há planos para a realização do evento. Tradicionalmente, as inscrições são feitas em dezembro de cada ano para a premiação que ocorre em outubro. Mas, passados mais de 15 dias deste janeiro, o cronograma para a inclusão dos trabalhos nem sequer foi divulgado. E o planejamento para que o festival aconteça está na etapa zero.
Para se manter, o Anima Mundi contava com o que recebia de parcerias, editais e patrocínio. Entre 2015 e 2018, o número de patrocinadores entrou em declínio. O auge da crise aconteceu no ano passado, quando a Petrobras, então detentora da maior cota de patrocínio, anunciou que deixaria de bancar projetos culturais — entre eles, o festival de animação. Em 2018, a estatal já demonstrava menos disposição em apoiar o evento. Prova disso foi o corte de um terço do valor destinado, de R$ 1,1 milhão, em 2017, para R$ 750 mil. Em média, o custo para produzir um festival como o Anima Mundi é de R$ 2 milhões ao ano.
A animação “Tito e os pássaros”, pré-selecionada para concorrer ao Oscar em 2019. Foto: Reprodução
A animação “Tito e os pássaros”, pré-selecionada para concorrer ao Oscar em 2019. Foto: Reprodução
Foi preciso um financiamento coletivo em 2019 para que a 27ª edição do festival saísse do papel. A mobilização contou com a ajuda de diversos animadores, que aderiram à campanha #EuAnimo na redes sociais e disponibilizaram algumas de suas obras como recompensa para levantar fundos. Foi o caso de Alê Abreu, que doou dez ilustrações originais de seu longa O menino e o mundo — cada uma por R$ 550. A empreitada rendeu R$ 400 mil, a meta mínima estipulada para a realização do festival. Mas os organizadores haviam traçado duas outras linhas de captação: uma de R$ 600 mil, para a realização do Papo Animado, nome da sessão de conversa com animadores convidados; e a outra de R$ 800 mil, para o Anima Fórum, em São Paulo, o lado mais empresarial do festival. Nesses dois casos, a campanha fracassou. Houve apenas apoios pontuais, como os R$ 150 mil dados pela Spcine, empresa municipal paulistana de fomento ao audiovisual.
“O menino e o mundo”, de Alê Abreu, foi indicado ao Oscar no ano passado. Foto: Reprodução
“O menino e o mundo”, de Alê Abreu, foi indicado ao Oscar no ano passado. Foto: Reprodução
A crise do Anima Mundi não afetou apenas a realização do festival, mas também o dia a dia do escritório que cuidava de sua produção. Com poucos recursos, o salário de funcionários chegou a atrasar por alguns meses. O término da 27ª edição também coincidiu com o fechamento do espaço que a equipe ocupava, na sobreloja de um prédio na Rua Voluntários da Pátria, no bairro de Botafogo, Rio de Janeiro. A equipe fixa do Anima Mundi foi avisada antes do festival de que os contratos não seriam renovados. O motivo alegado pela direção foi a falta de uma perspectiva mais estável para a realização do evento. Apesar das demissões, os pagamentos de todos os funcionários foram honrados.
“O criador das franquias ‘A era do gelo’ e ‘Rio’, Carlos Saldanha, foi uma das revelações do Anima Mundi — e sua proximidade com o festival foi tamanha que ele passou a bancar, do próprio bolso, dois prêmios entregues na mostra”
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Diante da incerteza sobre uma nova edição, as inscrições para 2020 não foram abertas — e, entre expoentes do setor, há pouca convicção de que ventos mais favoráveis voltem a soprar. “É o fim, acabou”, afirmou um deles. Questionados sobre o fim do festival, dois diretores do Anima Mundi, que falaram com a reportagem em condição de anonimato, negaram — apesar de reconhecerem que ainda não há prazo para inscrições nem planejamento para que o evento ocorra neste ano. Eles não quiseram, contudo, emitir nenhum posicionamento oficial sobre o fim da mostra.
“Guaxuma”, de Nara Normande, conquistou mais de 50 prêmios em 2018. Foto: Reprodução
“Guaxuma”, de Nara Normande, conquistou mais de 50 prêmios em 2018. Foto: Reprodução
Criado por quatro animadores — Aída Queiroz, Cesar Coelho, Lea Zagury e Marcos Magalhães —, o festival começou como uma pequena mostra de animações estrangeiras exibidas em uma sala do Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB) do Rio. A ideia era conseguir reunir e fomentar um mercado ainda tímido no país. Até então, o setor se resumia a trabalhos esporádicos e voltados para a área de publicidade e propaganda. Diretor e roteirista do documentário Luz, anima, ação (2013), Eduardo Calvet contou que o Anima Mundi virou uma base para artistas no país. Mas, hoje, ele vê com tristeza as perspectivas para o festival. “É como se fosse o caldeirão de uma locomotiva. Se você não alimentar o caldeirão, a locomotiva vai começar a perder velocidade. É por isso que o Anima Mundi não pode parar. Se isso acontecer, toda essa motivação que o festival gera, esse frescor, essa coisa de você assistir a um misto de tudo que tem de novo, de vanguarda no mundo, para”, afirmou.
“Rio”, de Carlos Saldanha, retratava as aventuras de uma dupla de araras-azuis. O diretor é um dos maiores incentivadores do festival, tendo participado desde as primeiras edições. Foto: Reprodução
“Rio”, de Carlos Saldanha, retratava as aventuras de uma dupla de araras-azuis. O diretor é um dos maiores incentivadores do festival, tendo participado desde as primeiras edições. Foto: Reprodução
Até o ano passado, as 27 edições do festival exibiram mais de 10 mil filmes — entre curtas e longas-metragens, de criações autorais de artistas consolidados a projetos experimentais de estudantes. Quase todos os principais animadores do país começaram em seus corredores e nas oficinas gratuitas oferecidas durante o festival. Entre eles, Alê Abreu, que concorreu ao Oscar em 2016, e Pedro Iuá, que fez parte da equipe do também premiado Guaxuma (2018). Além do criador das franquias A era do gelo e Rio, Carlos Saldanha — e sua proximidade com o festival foi tamanha que ele passou, em 2018, a bancar, do próprio bolso, dois prêmios entregues na mostra.
“Assim como muitos amigos animadores, sou fruto desse primeiro contato. O Anima Mundi me trouxe referências artísticas do mundo todo, reflexões, muito trabalho, vontade de meter a mão e sair fazendo coisas”, contou Iuá, cujo trabalho também pode ser visto na minissérie Hoje é dia de Maria (2005).
Saldanha
Saldanha
Afora a visibilidade proporcionada pelo festival, animadores vislumbravam outro incentivo para inscrever seus filmes: desde 2012, o Anima Mundi tem o selo de qualificador da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas dos Estados Unidos. Significa que o vencedor do principal prêmio do festival entra na pré-lista do Oscar, para concorrer como um dos indicados a levar uma estatueta para casa. Sem essa qualificação, um artista brasileiro só pode disputar um lugar na lista prévia caso seja premiado em algum festival internacional que também disponha do selo. Em sete anos, quatro curtas ganhadores do Grande Prêmio Anima Mundi foram indicados.
Só em 2018, o festival movimentou R$ 31,35 milhões na capital fluminense, segundo uma pesquisa feita pela Fundação Getulio Vargas, que não se repetiu em 2019. O público daquele ano, estimado em 50 mil pessoas, lotou as salas do CCBB e as oficinas gratuitas que ensinavam a montar filmes a partir da técnica de massinha ou mostravam como funcionava um zootrópio — tambor giratório criado pelo matemático inglês William Horner, em 1834, que transformou em realidade a mágica das imagens em movimento. Hoje, o Brasil tem ao menos cinco mostras de animação — e todas surgiram na esteira do Anima Mundi. O provável fim do festival traz, portanto, um rosário de desvantagens: enfraquece os eventos em sua órbita, penaliza um setor em que o Brasil produziu referências e inviabiliza a ida de novas animações ao Oscar.
Posted by Ricky at 12:27 PM

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