- Jim RutenbergEle fez de novo.
Às 3h14 de sexta-feira (26), o presidente dos EUA, Donald Trump, estava acordado e tuitando.
"Engraçado como a mal vista CNN e outras podem me criticar à vontade, até me culpando pela atual série de bombas e comparando-as ridiculamente ao 11 de Setembro e ao bombardeio em Oklahoma City", escreveu ele, "mas quando eu as critico elas enlouquecem e gritam: 'Isso não é presidencial!'"
Ele digitou essa enquanto as autoridades federais investigavam as 12 bombas caseiras enviadas ao bilionário George Soros, a políticos democratas, ao ator Robert De Niro e à CNN. Horas depois, o tuíte de Trump era notícia nacional.
"Presidente culpa a mídia por tentativas de bombas", dizia a mensagem no rodapé da tela em "Good Morning America", enquanto um correspondente da ABC News, Jonathan Karl, informava ao âncora George Stephanopoulos sobre a última tirada digital do presidente, do gramado da Casa Branca, ainda escuro.
Depois de zombar e insultar repórteres na campanha, Trump continuou perseguindo jornalistas um dia depois de assumir o cargo, sobre o tamanho do público em sua posse. Depois veio a campanha de rótulos negativos —"fake news", "inimigo do povo"— contra os que o responsabilizavam pelos fatos.
Pouco antes de as autoridades federais prenderem Cesar Sayoc Jr. —um eleitor republicano registrado, com um histórico criminal, cujas contas nas redes sociais estavam cheias de memes de conspiração direita—, o presidente voltou ao Twitter.
"Os republicanos estão se saindo tão bem no início da votação, e nas pesquisas, e agora essa história da 'bomba' acontece e o momento perde grande impulso —notícias não falam de política", escreveu ele numa postagem às 10h19 de sexta-feira.
Ao se referir ao provável terrorismo doméstico como "essa história da 'bomba'" e ligá-la às próximas eleições de meio de mandato, Trump estava fazendo uma sugestão não muito velada de que a mídia está exagerando a história por algum motivo político. Mesmo em uma crise nacional, ele mantinha sua estratégia antimídia.
A pergunta é: está funcionando?
A resposta rápida é sim. Cada vez mais os ataques quase diários do presidente parecem produzir o efeito desejado, apesar dos muitos exemplos de reportagem poderosa sobre sua Presidência. Segundo uma pesquisa da CBS News feita durante o verão, 91% dos "fortes apoiadores de Trump" confiam nele para dar informações precisas; 11% disseram o mesmo sobre a mídia.
Trump foi franco sobre a tática em uma conversa em 2016 com Lesley Stahl, da CBS News, que ela compartilhou no início deste ano: "Faço isso para desacreditar vocês todos e diminuir vocês todos, assim quando vocês escreverem matérias negativas sobre mim ninguém acreditará em vocês", teria dito ele a Stahl.
E com o presidente se apoiando em "medo e mentiras" como estratégia eleitoral, como disse o jornal The Washington Post na semana passada, o sistema de informação política está inundado de afirmativas enganosas ou totalmente erradas, mais do que os repórteres podem acompanhar. É como se Trump tivesse atingido a indústria jornalística com um ataque de negação de serviço.
Antes que as bombas caseir
Um mito se tornou viral: os milhares de hondurenhos desesperados que avançavam lentamente para a fronteira dos EUA eram atores em um drama criado pelos democratas e financiado pelo eterno vilão da direita, o bilionário George Soros, ideia que Trump pareceu endossar em um comício em Montana.
Os repórteres reagem apontando que essas afirmativas não se baseiam em fatos, assim como tentam derrubar o conteúdo fabricado por Trump produzindo contagens ao vivo de suas declarações falsas —mais de 5.000, segundo a coluna Checagem de Fatos do Washington Post.
De vez em quando os jornalistas recorrem à palavra "mentira", como faz o jornal The New York Times ocasionalmente. Outros alvos frequentes do desprezo do presidente, a CNN e a MSNBC, desbancaram suas afirmações com manchetes na tela e intermináveis debates.
Esses esforços de boa fé, porém, parecem cada vez mais ineficazes. O presidente conseguiu projetar os jornalistas como os principais coadjuvantes em seu interminável reality-show, para deleite dos que o aplaudem nos comícios.
Ao se envolver com seus ataques incessantes e afirmações infundadas, os jornalistas estariam caindo numa armadilha? Essa é a opinião de Steven Pinker, professor de ciência cognitiva em Harvard, que descreveu o presidente como o promotor de uma "ideologia de contrailuminismo". Mesmo com a cobertura saturada das bombas caseiras, afirmou Pinker no Twitter, "a imprensa mais uma vez cai no jogo".
Em uma entrevista por telefone, ele disse que a mídia acreditou demais nos atos de uma pessoa perturbada. "Não é um reflexo, em si, do clima do país", disse Pinker.
Ele admitiu, porém, que a mídia não pode ignorar Trump. E há o enigma. Este presidente "fala muito e tuíta muito sem que seu material seja vigorosamente aprovado, e há muitas outras imprecisões factuais que temos de enfrentar", disse Glenn Kessler, antigo colunista da Checagem de Fatos no "Post".
Mas ao colocar com tal frequência suas palavras sob um microscópio os jornalistas podem dar a impressão aos apoiadores de Trump e até a alguns eleitores indecisos que estão a persegui-lo.
"Isso indica que há uma questão diferente em jogo, que é um desejo de constantemente retratar Trump e tudo o que ele e seu governo dizem como mentiras", disse Danielle Pletka, vice-presidente sênior da organização de pesquisa conservadora Instituto de Empresas Americanas. Ela acrescentou que a mídia deveria parar de implicar com as minúcias de sua retórica e em vez disso se concentrar em seus maiores erros.
Mas quanto tempo a mídia vai demorar para encontrar uma maneira mais eficaz de atacar a litania de falsas alegações que inundam o ciclo de notícias?
Nesse ritmo, a solução poderá chegar no terceiro mandato de Trump.
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