January 31, 2018

Guerra de informações durante a votação do TRF-4

Pablo Ortellado



Enquanto os três juízes do TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região) decidiam o destino de Lula, uma guerra de informações tomava as mídias sociais. O debate sobre se Lula era culpado ou perseguido veio acompanhado de uma enxurrada de links de matérias noticiosas. Analisar o compartilhamento dessas notícias ilustra bem a dinâmica do debate político nas mídias sociais.

Do que é possível depreender dos dados públicos a que Facebook e Twitter dão acesso e de pesquisas de opinião realizadas com manifestantes, o consumo de notícias entre antipetistas e apoiadores da esquerda é bastante diferente.

Resumindo e generalizando um pouco. A esquerda é mais politizada e ideologicamente mais coerente, ela desconfia mais da grande imprensa, mas a lê, e os sites engajados do seu campo são mais profissionais, sendo produzidos por jornalistas que passaram pelas grandes redações.
O antipetismo —do qual a direita é apenas uma parte— é, por sua vez, menos politizado, mas tem uma interlocução muito maior com o público que não abraça ideologia; ele desconfia menos dos meios de comunicação de massa, embora isso pareça estar mudando, e os sites engajados do campo, com algumas exceções, não são feitos por profissionais.

Embora o dia da votação e o seguinte tenham sido dominados por matérias da imprensa alternativa, matérias da grande imprensa também foram bastante compartilhadas no Facebook, mas apenas na medida em que apoiavam a narrativa de um dos dois campos: a de que Lula comanda uma quadrilha que se apossou do Estado brasileiro ou a de que Lula é perseguido por uma elite que não tolera os avanços sociais conquistados pelo PT.

Assim, na esquerda, foi muito compartilhada (19 mil compartilhamentos) a manchete do "Globo", "Rachel Dodge vê prescrição e pede arquivamento de inquérito contra Serra" que reforçava o discurso de que a Lava Jato é seletiva e que a limpeza ética prometida pela investigação não alcança os tucanos. Foi também bem compartilhada na esquerda (12 mil compartilhamentos), a matéria da Folha sobre a perseguição de Juscelino Kubitschek na ditadura, "Nos anos 1960, um ex-presidente era investigado por causa de apartamento" que reforçava o discurso dos defensores de Lula de que o impeachment de Dilma foi um golpe de Estado em alguns sentidos semelhantes ao golpe de 1964. Já na direita, foi muito compartilhada (19 mil compartilhamentos) a manchete de "O Estado de S. Paulo", "Cúpula da PF começa a preparar a prisão de Lula" que respaldava o discurso antipetista de que a Lava Jato tem sido eficaz e de que, em breve, Lula vai estar atrás das grades.

Mas apesar dessas matérias da grande imprensa, o que se viu mesmo nas mídias sociais, foi uma guerra de compartilhamento de matérias produzidas pelos sites engajados.

No antipetismo, circularam várias informações falsas ou de credibilidade duvidosa como a matéria produzida pelo site "Imprensa Viva", "Ladrão de celular do 'Fantástico' foi visto em ato em defesa de Lula em Porto Alegre" (22 mil compartilhamentos). Ainda mais espetacular foi a matéria produzida pelo site "Pensa Brasil" (4 mil compartilhamentos) que dizia que "Dona Marisa estaria viva e esperando fuga de Lula na Etiópia" em cujo texto se lia que a fonte seriam "as más línguas na web". Por fim, matéria do site "Diário do Brasil", que supostamente tinha feito a apuração, dizia que "Militantes do PT se revoltam em Porto Alegre: não pagaram a gente e roubaram até o recheio do pão" (22 mil compartilhamentos).

Embora notícias falsas ou de credibilidade duvidosa como as que foram compartilhadas nos meios antipetistas sejam menos frequentes na esquerda, elas também existem. Entre as que circularam no período da votação estava uma foto divulgada pela conta do deputado José Guimarães (PT) no Twitter que mostrava uma longa fila de ônibus com militantes que estariam indo a Porto Alegre prestar apoio a Lula. A autenticidade da foto foi contestada e descobriu-se depois que se tratava de uma foto antiga de um ônibus de sacoleiros indo ao Paraguai.

Muito mais comum na esquerda, no entanto, foram as matérias especulativas. No meio da transmissão do julgamento do TRF4, a rede "BandNews" inseriu uma legenda que dizia que a votação tinha acabado e que o presidente tinha sido condenado por unanimidade. Logo, sites de esquerda começaram a insinuar que o julgamento tinha cartas marcadas e que o tribunal teria vazado o resultado antecipado para a imprensa. Matérias no site da "Revista Fórum", "BandNews faz legenda antecipando condenação de Lula por unanimidade" (16 mil compartilhamentos), no site "Diário do Centro do Mundo", "Band pede desculpas por antecipar resultado do julgamento de Lula: falha técnica" (4 mil compartilhamentos) e no site "Falando Verdades", "Circo: BandNews se adianta e anuncia condenação de Lula por unanimidade" (3 mil compartilhamentos) disseminaram a suspeita entre os ativistas de esquerda.

Chama a atenção que as matérias mais informativas que foram produzidas analisando a consistência das provas apresentadas, mostrando e discutindo a estratégia de apelação da defesa ou avaliando os impactos políticos de se ter um candidato a presidente com uma condenação em segunda instância foram todas soterradas pela ação coordenada dos ativistas. Ao compartilharem apenas as matérias úteis às narrativas dos dois campos, eles inundaram nossos feeds de notícias com um discurso que todo mundo já conhece: o de que Lula é o chefe da quadrilha ou o de que Lula é um benfeitor perseguido. Em comum aos dois lados a crença de que a salvação do país passa de algum modo pelo ex-presidente.

FOLHA DE SÃO PAULO


January 29, 2018

Após um ano, delação da Odebrecht só tem um denunciado


RUBENS VALENTE
REYNALDO TUROLLO JR.
DE BRASÍLIA
FOLHA DE SÃO PAULO



  • Paulo Lisboa/Folhapres


    Anunciada como a "delação do fim do mundo" por provocar uma limpeza no meio político do país, a colaboração da empreiteira Odebrecht completará um ano no Supremo Tribunal Federal na terça-feira (30) sem nenhum político tornado réu, nenhum preso e apenas um denunciado (1% do total investigado).
    Dos 83 inquéritos abertos no STF para investigar parlamentares de vários partidos, 78 (94%) estão inconclusos. As suspeitas contra cinco parlamentares, no bojo de quatro inquéritos, já foram arquivadas por prescrição da pena.
    O cenário não é diferente no Senado e na Câmara, que tiveram dezenas de seus membros acusados pelos delatores. As duas casas não investigaram nem puniram nenhum parlamentar com base nas delações da empreiteira.
    Em 30 de janeiro de 2017, a presidente do STF, Cármen Lúcia, homologou o acordo de delação que vinha sendo negociado desde meados de 2016 pela equipe do então procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Era um momento tenso porque, apenas 11 dias antes, o relator da Operação Lava Jato no STF, Teori Zavascki, havia morrido em um acidente aéreo e não se sabia quem seria seu substituto na relatoria.
    Em março, a PGR (Procuradoria-Geral da República), que tem o controle da investigação, protocolou as petições que deram início aos inquéritos que ficaram conhecidos como "segunda lista de Janot" ou "lista de Fachin".
    Passado um ano, a consequência jurídica é próxima de zero no STF. Por exemplo, dois dos principais investigados eram o presidente do Senado, Eunício Oliveira (MDB-CE), e o atual presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Até o momento eles não são réus nem sofreram qualquer sanção judicial.

    ÚNICA DENÚNCIA
     
    A única denúncia apresentada pela PGR, contra o senador Romero Jucá (MDB-RR), está desde agosto sem decisão no STF. O tribunal precisa dizer se há indícios mínimos de autoria para dar início a uma ação penal, o que tornaria o senador réu.
    Neste caso, a demora pode ser atribuída a dois motivos principais: primeiro, o STF gastou quase 30 dias apenas avaliando se o ministro Edson Fachin deveria continuar como relator do caso. Acabou sendo substituído por Marco Aurélio.
    Em segundo lugar, o STF tem optado por notificar os congressistas a apresentar defesa antes da apreciação da denúncia –mesmo que, mais adiante, ele tenha que apresentá-la de novo.
    A maioria dos casos derivados da delação da Odebrecht ou está em vista na PGR ou em diligências cumpridas pela Polícia Federal a pedido da PGR.
    Há três casos, no entanto, que expõem a morosidade no tribunal. O inquérito que trata do senador Lindbergh Farias (PT-RJ) está parado desde junho na seção de acórdãos, para onde foi enviado para a publicação de uma decisão sobre recurso apresentado pela defesa no inquérito.
    A investigação sobre o deputado Carlos Zarattini (PT-SP) está desde junho de 2017 no gabinete do relator, Ricardo Lewandowski. E o inquérito sobre o deputado Arthur Maia (PPS-BA) está com vista no gabinete do ministro Alexandre de Moraes desde novembro do ano passado.
    Parte da delação da Odebrecht também foi usada pela PGR na segunda denúncia formulada contra o presidente Michel Temer, sobre a suposta "quadrilha do PMDB" –o caso está parado porque a Câmara não autorizou a investigação.



    ANIVERSÁRIODelação da Odebrecht faz um ano com apenas uma denúncia contra político com foro

    PRIMEIRA INSTÂNCIA
     
    A velocidade para o acolhimento de uma denúncia nos casos da Lava Jato é bem diferente na primeira instância. O juiz Sergio Moro, de Curitiba, por exemplo, gastou em média 3,5 dias para decidir sobre a abertura da ação penal em dez dos principais casos da operação.
    Em julho, na 42ª fase da Lava Jato, o ex-presidente do Banco do Brasil e da Petrobras Aldemir Bendine foi preso a partir da delação da Odebrecht. Foi denunciado e se tornou réu em agosto, sob acusação de ter recebido R$ 3 milhões em propina. Em setembro, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região manteve a prisão preventiva.
    No Rio, também em primeira instância federal, o Ministério Público usou delações da Odebrecht para reforçar a denúncia contra os deputados estaduais Jorge Picciani, Paulo Melo e Edson Albertassi, todos do MDB. Considerado um dos principais líderes políticos do Estado, Picciani foi preso em novembro e denunciado em dezembro, sob acusação de ter recebido R$ 11 milhões da Odebrecht. Foi afastado da presidência da Assembleia do Rio.
    Em outro processo abastecido pela delação da Odebrecht, o ex-presidente Lula se tornou réu em agosto no Paraná sob a acusação de ter se beneficiado de obras em um sítio em Atibaia (SP).

    OUTRO LADO
     
    A Procuradoria-Geral da República afirmou, em nota, que a duração de cada investigação depende do caso concreto e de uma série de variáveis.
    "É importante frisar que uma colaboração premiada representa o início de uma apuração. A conclusão dessa etapa depende da realização de diligências, perícias e outras providências que têm o objeto de reunir provas que possam corroborar as informações fornecidas pelos colaboradores. É o que tem sido feito pela PGR nos inquéritos e demais procedimentos", afirmou.
    Sobre os inquéritos da Odebrecht que estão no Supremo Tribunal Federal, a PGR informou que todos estão com diligências em curso. "Boa parte depende de perícias, inclusive, nos sistemas de dados fornecidos pela própria construtora."
    O tempo médio para uma manifestação da PGR em um inquérito, segundo levantamento do órgão, foi de 10,5 dias desde 18 de setembro, quando Raquel Dodge assumiu o cargo.
    O STF não respondeu às perguntas da reportagem sobre o andamento dos casos.
    Em nota à Folha, a Odebrecht "reforça a consistência e plenitude de sua colaboração com a Justiça".
    A Polícia Federal aumentou de nove para 17 o número de delegados do grupo destinado às investigações sobre políticos com foro, com o intuito de acelerar investigações. O diretor-geral, Fernando Segovia, pretende encerrar essas investigações até o final do ano.

January 28, 2018

Mort Walker, criador do Recruta Zero, falece aos 94 anos - UNIVERSO HQ













"De inicio, a tira abordava a vida universitária. Mas, apesar de ter sido publicada em apenas alguns jornais, não fez o sucesso esperado. Walker não sabia, mas o King Features estava estudando terminar com seu contrato. No entanto, com o início da Guerra da Coréia, ele decidiu fazer o jovem Beetle ingressar no Exército. Foi então que o sucesso chegou.

O fator decisivo, que impulsionou em definitivo o personagem, foi o jornal de o exército Stars & Stripes ter banido suas histórias, por considerar que elas ridicularizavam os oficiais em geral. O fato teve grande repercussão na imprensa, e a tira disparou em publicação."









leia obit de Marcelo Naranjo​



Mort Walker, criador do Recruta Zero, falece aos 94 anos - UNIVERSO HQ:




Au Brésil, une démocratie en déliquescence

"Après les manifestations monstres de 2015 et 2016 réclamant au nom de la « morale » le départ de Dilma Rousseff, les scandales, dignes d’un film de série B, mêlant mallettes d’argent sale et tractations en sous-sol, se sont succédé au point d’étourdir les Brésiliens. Mais le statut de foro privilegidao (« citoyen privilégié ») protège les politiciens en fonctions ; l’immunité dont ils bénéficient, légitime dans son principe, est dévoyée et instrumentalisée avec le plus grand cynisme.

L’élite de Brasilia baigne dans un climat d’impunité de nature à écœurer le peuple. A quelques mois de l’élection présidentielle, le Brésil, pays parmi les plus inégalitaires au monde, renvoie l’image d’une société de castes où les dirigeants n’obéissent pas aux mêmes lois que les miséreux. C’est indigne et dangereux pour la plus grande démocratie d’Amérique latine.


En savoir plus >>



Au Brésil, une démocratie en déliquescence:

January 27, 2018

Artigo: Ursula K. Le Guin nos deixou a tarefa de sonhar

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"Suas obras mais conhecidas de ficção científica são “A mão esquerda da escuridão” e “Os despossuídos”, publicados no Brasil pela Aleph. No cerne dessa produção, há uma preocupação central: descolonizar nossa imaginação sobre o que seja o futuro. Dessa forma, Ursula Le Guin solicita-nos exercícios imaginativos. No primeiro, pede para que imaginemos: como seria se não existissem diferenças de gênero? No segundo, como seria se não houvesse pronomes como “teu” e “meu”? Em ambos, como seria o mundo se pudéssemos conversar e voar entre as galáxias?

Em lugar de jogar somente com física ou matemática, Ursula Le Guin, filha de antropólogos, utiliza-se de ciências humanas para imaginar possibilidades para nossa vidinha terráquea, nos exigindo pensar além do que está posto no tabuleiro das relações humanas atuais. "


leia artigo de Ana Rüsche​



Artigo: Ursula K. Le Guin nos deixou a tarefa de sonhar | Só Fatos | Só Fatos:

Davos 4.0

Flávia Oliveira

O convescote anual da elite econômica e financeira planetária elegeu a quarta revolução industrial como tema da vez. Cerca de três mil participantes, 79% homens, foram à pequena Davos especular sobre processo produtivo, trabalho e cotidiano que emergirão da era da inteligência artificial, da robótica, da tecnologia digital. Mirando o mundo dos Alpes Suíços, é fácil fantasiar um futuro confortável, operado por máquinas ultramodernas e mão de obra megapreparada ocupando vagas que sequer foram inventadas. Das planícies do Hemisfério Sul — em particular, de um certo gigante sul-americano — a visão não é tão promissora. A Davos 4.0 contrapõe-se o Brasil 1.0.

Michel Temer foi à reunião do Fórum Econômico Mundial avisar que a crise brasileira acabou. Fazia quatro anos um presidente brasileiro não subia a montanha. A recessão chegou ao fim no ano que passou, a inflação (2,95%) não alcançou o piso da meta, a taxa básica de juros (7%) é a menor da História. Temer e membros da equipe econômica levaram na bagagem a promessa de aprovação da reforma da Previdência, aceno à solvência de longo prazo das contas públicas, e um cardápio de potenciais investimentos para parceiros estrangeiros. Deixaram de contar que, em plena revolução digital, depois de contingenciarem metade dos recursos para ciência e tecnologia em 2017, tesouraram um quarto do orçamento deste ano.

À espreita do futuro promissor concebido pelo mundo desenvolvido, há negligência com a modernidade e uma agenda do século XIX jamais cumprida. Um quarto da população vive com renda de até R$387 por mês, segundo a Síntese de Indicadores Sociais 2017 (IBGE). Quatro em cada dez brasileiros moram em domicílios sem água encanada, rede de esgoto ou fossa séptica e coleta de lixo. A mobilidade urbana é precária. A epidemia da vez é a febre amarela, inserida no rol de doenças negligenciadas.

O Brasil tem 11,8 milhões de analfabetos; só 15% dos adultos completaram o curso superior; sete em dez crianças de até 3 anos não entraram na creche. A escolaridade média de quem tem mais de 25 anos equivale ao ensino fundamental. Não chega a dez anos o nível de instrução dos jovens negros e nordestinos. Um quarto dos habitantes de 16 a 29 anos não estuda nem trabalha, boa parte é formada por meninas que engravidaram precocemente e se dedicam aos afazeres domésticos.

O Brasil chegou ao fim de 2017 com 12,6 milhões de desocupados. É gente que não exerce nenhuma atividade paga e procura vaga. Havia 11,2 milhões de empregados sem carteira assinada e 6,3 milhões de trabalhadores domésticos, postos de baixa remuneração. Outros 23 milhões eram autônomos penando para subsistir sem políticas públicas de capacitação, apoio técnico, acesso a crédito e desburocratização.

É consenso que a economia moderna vai prescindir dos profissionais de baixa qualificação. Em relatório divulgado esta semana, a Organização Internacional do Trabalho alertou que 1,4 bilhão de pessoas no planeta estavam em empregos vulneráveis no ano passado. O contingente será elevado em 35 milhões no biênio 2018-19.

A quarta revolução carrega um risco imenso de ampliar o fosso de desigualdades que separa o Brasil do mundo rico e, internamente, o topo e base da pirâmide. Aqui o 1% mais rico ganha 38 vezes a renda da metade mais pobre da população. Não haverá o bem-estar da quarta revolução, se o país não se ocupar dos que, hoje, já estão para trás. É acelerar ou fracassar.

January 26, 2018

O precedente que subverte o ideal democrático




Entre os loucos que passaram o dia de hoje assistindo ao julgamento dos recursos do “caso tríplex”, no canal do TRF4 no Youtube, eu fui um deles. Movido por curiosidade acadêmica e preocupação profissional, fiquei das 8h30 às 17h e pouco ouvindo todas as manifestações e votos. Com base na experiência e conhecimento dos desembargadores e uma ponta de esperança num julgamento bem técnico, eu esperei (mesmo) ouvir uma explicação que me convencesse da materialidade e autoria dos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro, porque a sentença do Moro não me havia convencido. Na minha humilde posição de muito menos experiência e estudo dos que os julgadores, digo que continuo não convencido. Problema meu se não estou, certo? Pode ser. Mas, como tenho esse gosto pelo Direito Criminal e uma comichão que não consigo conter de escrever sobre ele – e na falta de outro canal, já que estou enfurnado pela dissertação (pausada hoje) – escrevo aqui no Face mesmo, só pra extravasar, atendo-me unicamente ao aspecto técnico-jurídico, sem externar nenhum tipo de paixão política ou coisa do gênero.

Eis o que diz o art. 317 do Código Penal: “Corrupção passiva. Art. 317 - Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem: Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa”.

Pois bem. Está descartada, pelo que vi, a hipótese mais comum da corrupção passiva que é a de “receber” a vantagem indevida, já que o patrimônio de Lula em nada se fez acrescer com a negociação do apartamento. Com efeito, Marisa (pq o contrato estava em nome dela, mas tudo bem até podemos incluir Lula como beneficiário tbm, afinal eram casados), pagou várias prestações ao Bancoop de um apartamento normal no tal prédio no Guarujá. Ocorre que, lá pelas tantas, a OAS (substituindo o Bancoop), segundo a denúncia, iria lhe entregar um outro apartamento com muito mais valor: um tríplex, com várias reformas. A vantagem indevida apontada adviria de se pagar X e receber um bem no valor de XXX; um “duplo X” de vantagem. Em troca, segundo a denúncia: vantagens da OAS em 3 contratos relativos a obras/serviços da Petrobrás. 

Ocorre que esse recebimento do apartamento nunca se efetivou. Lula/Marisa nunca tiveram a posse ou a propriedade, ou qualquer outro direito real, sobre o bem, de acordo com as provas. O que tiveram foi uma espécie de “reserva” do apartamento, não se sabe para quando. Todos vamos concordar que só haveria vantagem se o bem realmente fosse recebido pelo valor de XXX, sendo pagos apenas X. Se eles recebessem o apto. X, não haveria problema algum. Só que nem isso ocorreu. Com efeito, Lula/Marisa não receberam nem o apto. X, nem o XXX, nem o dinheiro de volta, o que os fez mover uma ação contra o Bancoop e a OAS, pedindo R$ 300.000,00 de indenização. Pausa. Por que quem iria, em tese, receber o apto. XXX ilicitamente, ou seja, pagando apenas X, foi reclamar na justiça o apartamento X? Se iria receber esse bem da OAS "de boa", porque processá-la? Só pra adiantar um pouco a questão da ocultação de bens (lavagem de dinheiro), por que iria dar publicidade ao negócio, na Justiça (!), se, em tese, queria que ninguém soubesse que receberia XX de vantagem no negócio? Não faz sentido nenhum.

Também não houve prova de que Lula fosse realmente conseguir receber o tríplex, pagando apenas X. Não se pode descartar a hipótese de que a OAS fosse exigir que pagasse mais XX ou qualquer outro valor, posteriormente, para fazer a troca do apto. X pelo XXX. A acusação disse que essa troca ocorreria, assim mesmo, “de graça”, com o pagamento de apenas X. Concluiu isso com base em contratos rasurados e não assinados – rasurados e não assinados, repita-se – de mudança da unidade X para a unidade XXX. Também com base em depoimentos de pessoas que conheciam o apto. (corretores, instaladores de móveis, porteiro etc.) como o “apto. de Lula”, por ouvir falar. Marisa e o filho – Lula, não – foram vistos duas vezes visitando o apto. XXX por algumas dessas pessoas e isso bastou como prova de que tinham a chamada “transmissão” do bem. O que é isso, juridicamente falando? Nada. Ir ver um apto., com interesse nele, não tem efeito jurídico nenhum, muito menos penal. 

Alguns argumentos em prol da absolvição de Lula, diziam que se não há prova da vantagem indevida efetivamente auferida, não há crime. Aí discordo. A coisa não é tão simples assim. Outros núcleos verbais do art. 319 ainda ficam pendentes de exame. Refiro-me a “solicitar” a vantagem indevida ou “aceitar” a promessa de tal vantagem. A questão aí é: existe prova de que Lula solicitou ou aceitou a vantagem de receber o apto. XXX pagando apenas X? Penso que não. Nenhuma pessoa (nem o Léo Pinheiro) disse que o Lula tomou a iniciativa de propor à OAS essa negociação espúria. E quanto a “aceitar”? Aí há o depoimento de Léo Pinheiro afirmando que fazia o “meio-de-campo” entre a OAS e o João Vacari, relativamente à compra do imóvel e às suas reformas. Veja que Léo Pinheiro nem tratava diretamente com Lula sobre o assunto, mas com Vacari. Isso faz com que o primeiro nunca tenha levado uma proposta da OAS a Lula, nem presenciado a aceitação de Lula de uma proposta da OAS.

Aí também vêm os problemas relativos ao valor e à suficiência da prova. Léo Pinheiro é corréu-delator. Embora não tenha tido delação premiada homologada, recebeu redução de 2/3 da pena. Isso torna seu depoimento bastante suspeito, por seu interesse direto (e compreensível) em não “mofar” na prisão, seja como culpado, seja como inocente. João Vacari, contudo, não foi ouvido como testemunha, nem acusado como corréu. Cabia à acusação o ônus de ouvi-lo, para confirmar com alguma coisa mais o depoimento de Léo Pinheiro. No entanto, não o chamou ao processo. Dizer que podia a defesa arrolá-lo é inverter o ônus da prova, o que é o contrário ao devido processo legal, mas foi isso que os desembargadores disseram. Disso resulta que a conclusão de que Lula “aceitou” a promessa de vantagem indevida se assenta sobre o depoimento de um delator coacusado.

Os julgadores, então, se ativeram aos indícios. Concluíram que havia indícios (leia-se: suspeitas, mas não provas) de que as acusações eram verdadeiras. E condenaram, declaradamente, com base nisso. De fato, existe uma disposição do Código de Processo Penal (CPP) que define o que são indícios: “Art. 239. Considera-se indício a circunstância conhecida e provada, que, tendo relação com o fato, autorize, por indução, concluir-se a existência de outra ou outras circunstâncias”. E para que servem os indícios? De acordo com o mesmo CPP, servem para: a decretação de sequestro de bens (art. 126), a hipoteca legal (art. 134), ir no encalço de réu foragido (art. 290, §1º, b), para a pronúncia (art. 413) ou para abrir novas investigações (art. 417). Veja-se que se tratam de decisões não definitivas sobre a culpa, mas relativas a medidas cautelares, à atividade investigativa e ao juízo perfunctório de envio do processo ao Tribunal do Júri. 

Pergunta: serve para condenar? Resposta: NÃO! Nem o CPP, que é de 1941, época do Estado Novo (ditadura de Getúlio), escrito pelo mesmo autor do AI-1 do golpe de 1964, Francisco Campos, chega ao absurdo de dizer que se pode condenar alguém com base em indícios, mas a 8ª Turma do TRF4 chegou.


Mas vamos admitir, apenas por hipótese, que existisse prova plena de que Lula pagou X e realmente solicitou, recebeu ou aceitou promessa de receber o apto. XXX. Isso já configuraria o crime de corrupção passiva? Não. Seria necessário provar duas coisas, antes. Primeiro que essa vantagem era indevida. À primeira vista, a OAS é a prejudicada: entregaria o apto. XXX recebendo apenas X. Prejuízo a ela de XX. Isso não configuraria o crime do art. 317 porque, para tanto, seria necessária a prova do segundo ponto: haver prejuízo concreto ou potencial à Administração Pública. Aí vem a explicação da acusação: a OAS propôs/aceitou esse negócio porque iria receber suas vantagens nos 3 contratos da Petrobrás. O que a acusação tem que provar? Que a negociação Lula/OAS do tríplex estava ligada aos 3 contratos da Petrobrás. Ah, podia ser a qualquer contrato da Petrobrás? Não, tinha que ser a esses 3, porque a denúncia delimita a acusação e todo o conteúdo do processo. Se se descobrisse que essa negociação dizia respeito, não a esses 3 contratos da Petrobrás, mas a outros contratos, a denúncia teria que ser aditada e começar o processo quase que todo de novo. Pergunta: houve prova de que essa negociação do Léo Pinheiro, com Vacari, a mando de Lula, e a OAS tinha como pano de fundo os 3 contratos com a Petrobrás da denúncia? Resposta: não. Quem disse que não? Juiz Sérgio Moro, no julgamento dos embargos de declaração da defesa de Lula. Disse que eles tinham a ver com um “grande esquema de corrupção”, mas não com contratos da Petrobrás, muito menos com os 3 contratos da denúncia, especificamente. Resta esse ser abstrato: a grande quimera dos contratos que tinham dinheiro de corrupção e que concentra todo o mal e atrai todas as penas.

Por falar em atrair, foi essa circunstância de a vantagem indevida advir dos 3 contratos da Petrobrás, que foi usada como fator de atração de competência do “juiz da Lava-Jato”. Ah, mas o apto. ficava no Guarujá, São Paulo, por que ser julgado em Curitiba e na Justiça Federal? Pois é. O MP de São Paulo também questionou isso, dizendo que o caso tinha que ser processo na Justiça Estadual paulista. Mas é assim: por ter começado a investigação de propinas relativas a contratos da Petrobrás, em 2014, na Justiça Federal de Curitiba, esta ficou preventa para todos os processos relativos a isto: propinas de contratos da Petrobrás. Daí quando o MPF põe na denúncia que o apto. XXX foi adquirido/reformado com negociação relativa a “esquema” com a Petrobrás, o “buraco negro” da JF Curitiba suga a ação penal num flash. O problema reside no momento em que o juiz admite não haver prova de nenhuma relação da promessa de vantagem indevida (apto. XXX) com os contratos da Petrobrás. A premissa que fixava a competência pela prevenção se esvai e resta uma sentença proferida por um juiz materialmente incompetente, não natural e, por consequência, nula. O TRF4 entendeu que isso não tinha problema.

Então, temos, quanto ao crime de corrupção passiva, nenhuma prova de que a vantagem foi indevida, nem que essa vantagem teve ligação com contratos da Petrobrás, nem que Lula solicitou, aceitou ou recebeu essa vantagem. Sem prova, sem crime. Ilícita a condenação. Antes disso, ilícito o processamento na JF de Curitiba.

Aí vem o crime de lavagem de dinheiro. “Lei 9.613/98. Art. 1º Ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de infração penal”. Esse é mais simples. Primeiro, tem que haver uma infração penal provada, no caso, o crime de corrupção passiva, que, como vimos, não tem prova. Já podíamos parar por aí. Mas se houvesse, o que Lula teria ocultado? Em princípio, na sentença de Moro, seria a “propriedade de fato” do apto., que seria dele e não da OAS. Como essa tese já tinha sido pisoteada no mundo do Direito “normal”, que exige (do tipo: “se, e somente se”) registro no cartório de imóveis, para a transferência da propriedade, a 8ª Turma, principalmente o Revisor, veio com esta saída: Lula não dissimulou a propriedade, que, de fato, não tinha, mas ocultou os “direitos” que tinha sobre o imóvel, como negociado com a OAS. Mas que direito seria esse? O de “reserva”? Como reivindicar esse direito, sem um contrato de promessa de compra e venda registrado em cartório? Ma’nunca! Qualquer credor da OAS que, por exemplo, penhorasse esse imóvel para pagar dívida da OAS (como de fato ocorreu recentemente) teria mais direito que o Lula. Nem a posse Lula teria para reclamar em juízo, já que nunca passou um único dia ou noite no imóvel. Enfim, tirar esse imóvel do Lula, era mais fácil que roubar doce de criança. Em outras palavras, Lula não tinha como ocultar a origem daquilo que nunca entrou na sua esfera de direitos patrimoniais. A acusação – agora a condenação – se resume a ocultar uma possível vantagem ilícita futura e incerta. “Estou ocultando aqui, pra ninguém saber, a aquisição ilícita de um patrimônio que estou tramando realizar um dia”. Se for assim, todo ato de corrupção que não seja feito às claras e confessadamente será, automaticamente, um crime de ocultação de capitais. Isso não tem nada a ver com o crime tipificado na legislação especial, mesmo. Mas o TRF4 achou que tinha. Discordo.

“Ih, mas não adianta espernear. O juízo de fato, ou seja, quanto às provas da autoria e materialidade se esgotaram na segunda instância. Não tem como discutir mais no STJ ou no STF: Lula era o proprietário de fato do apto, ponto, acabou. Aceita que dói menos”. Calma lá. Primeiro, tem um catatau de nulidades (questões de direito) a serem rediscutidas no STJ e no STF. Segundo, cabe ao STJ e ao STF dar a última palavra sobre a interpretação da legislação federal e constitucional que rege a valoração da prova, para, por exemplo, dizer que indícios, delação isolada de corréu etc. não servem como prova. Terceiro, cabe ao STJ interpretação da lei penal, incluindo o art. 317 do CP e o art. 1º da Lei 9.613/98. O STJ pode muito bem partir do fato declarado pelo TRF4 como ocorrido – “propriedade de fato”, “direito de reserva do apto” ou “aquisição/ocultação desse direito de reserva” – e como não ocorrido – “não houve relação com contratos da Petrobrás” – e entender que esse fato não se enquadra nos crimes citados ou que não atrai a competência da JF. Do mesmo modo, cabe ao STF interpretar tal legislação à luz da Constituição e por aí vai. Enfim, ainda tem água pra rolar.

Tudo bem, você pode concluir que o Lula não conseguiu explicar a história do apto. direito, nem das intenções/vantagens dele e da OAS no negócio. Concordo. Mas isso não autoriza, por si só, a presumir que os crimes descritos na denúncia efetivamente ocorreram. Se autorizar pro Lula, vai autorizar para mim e para você também. No dia que você não conseguir explicar um negócio que você fez, vão poder presumir que teve crime por trás. E nem vai achando que isso foi assim porque ele é um ex-presidente. Como operador do direito posso dizer isto: as coisas que são decididas nos processos “grandes”, por assim dizer, depois servem de fundamento para uma infinidade de processos “pequenos”. Sim, o seu, por exemplo, ou daquele seu parente. Todo mundo que tem um parente está sujeito a ter um caso criminal na família, pode crer, o que alcança, claro, todo mundo, afinal ninguém nasceu de uma chocadeira. E quando for a vez dele, advinha: vai ter uma certa interpretação da lei, mais severa, que vai se aplicar ao caso dele, por conta de um precedente. Esse precedente pode ter sido estabelecido hoje.

A coisa, portanto, é mais grave do que parece. Com certeza muito mais grave do que o Lula se safar dessa e concorrer à Presidência de novo e até de ganhar. Se a gente achar que a candidatura de Lula é um risco tão grande que vale a pena condená-lo ilicitamente, outras coisas ilícitas serão possíveis para atingir fins supostamente não desejados por um grupo de gente insatisfeita. E se a maioria de fato não deseja o Lula mais como Presidente, a melhor forma de definir isso é nas urnas, dizendo não à sua eleição. “Ah, mas o Lula será eleito por uma massa de ignorantes”. Ainda que o seja, a regra democrática ainda é a da maioria e, como disse, Winston Churchil, “a democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas” (aproveita que tá no cinema). Rejeitar a maioria democrática é rejeitar a possibilidade de a maioria do povo escolher seu governante, e partindo da premissa presunçosa de que “nós”, uma minoria, sabemos escolher melhor do que a maioria. Por quê? Porque “nós” somos melhores. Mas quem é “nós”? Quem nos define e nos escolhe como “os melhores”? A Constituição escolheu esse “nós” como a maioria do eleitorado. Subverter isso é subverter o ideal democrático tão jovem ainda no Brasil (vai fazer só 30 anos em 2018).

Como cidadão e como profissional do Direito, eu ficaria mais tranquilo com essas interpretações do TRF4 sendo afastadas, pelo STJ e STF. Não pelo destino do Lula. Mas pelo destino dos que vão ter que viver sob um ordenamento jurídico interpretado da forma como foi, com extensão do conceito de crimes, de inversão do ônus da prova, das regras de jurisdição etc. Eu ficaria mais tranquilo com Lula solto e concorrendo, mesmo eu não votando nele, do que no cenário desenhado para o futuro a partir do julgamento de hoje.

NIC 0 LAU

January 24, 2018

Ursula K. Le Guin, Acclaimed for Her Fantasy Fiction, Is Dead at 88


  • By Gerald Jonas, www.nytimes.com
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    Foto de: Jill Krementz, All Rights Reserved 
  • Ursula K. Le Guin, the immensely popular author who brought literary depth and a tough-minded feminist sensibility to science fiction and fantasy with books like “The Left Hand of Darkness” and the Earthsea series, died on Monday at her home in Portland, Ore. She was 88.
    Her son, Theo Downes-Le Guin, confirmed the death. He did not specify a cause but said she had been in poor health for several months.

    Ms. Le Guin embraced the standard themes of her chosen genres: sorcery and dragons, spaceships and planetary conflict. But even when her protagonists are male, they avoid the macho posturing of so many science fiction and fantasy heroes. The conflicts they face are typically rooted in a clash of cultures and resolved more by conciliation and self-sacrifice than by swordplay or space battles.

    Her books have been translated into more than 40 languages and have sold millions of copies worldwide. Several, including “The Left Hand of Darkness” — set on a planet where the customary gender distinctions do not apply — have been in print for almost 50 years. The critic Harold Bloom lauded Ms. Le Guin as “a superbly imaginative creator and major stylist” who “has raised fantasy into high literature for our time.”

    In addition to more than 20 novels, she was the author of a dozen books of poetry, more than 100 short stories (collected in multiple volumes), seven collections of essays, 13 books for children and five volumes of translation, including the Tao Te Ching of Lao Tzu and selected poems by the Chilean Nobel Prize winner Gabriela Mistral. She also wrote a guide for writers.

    “The Left Hand of Darkness,” published in 1969, takes place on a planet called Gethen, where people are neither male nor female. 
     
    Ms. Le Guin’s fictions range from young-adult adventures to wry philosophical fables. They combine compelling stories, rigorous narrative logic and a lean but lyrical style to draw readers into what she called the “inner lands” of the imagination. Such writing, she believed, could be a moral force.

    “If you cannot or will not imagine the results of your actions, there’s no way you can act morally or responsibly,” she told The Guardian in an interview in 2005. “Little kids can’t do it; babies are morally monsters — completely greedy. Their imagination has to be trained into foresight and empathy.”

    The writer’s “pleasant duty,” she said, is to ply the reader’s imagination with “the best and purest nourishment that it can absorb.”

    She was born Ursula Kroeber in Berkeley, Calif., on Oct. 21, 1929, the youngest of four children and the only daughter of two anthropologists, Alfred L. Kroeber and Theodora Quinn Kroeber. Her father was an expert on the Native Americans of California, and her mother wrote an acclaimed book, “Ishi in Two Worlds” (1960), about the life and death of California’s “last wild Indian.”

    At a young age, Ms. Le Guin immersed herself in books about mythology, among them James Frazer’s “The Golden Bough,” classic fantasies like Lord Dunsany’s “A Dreamer’s Tales,” and the science-fiction magazines of the day. But in early adolescence she lost interest in science fiction, because, she recalled, the stories “seemed to be all about hardware and soldiers: White men go forth and conquer the universe.”

    She graduated from Radcliffe College in 1951, earned a master’s degree in romance literature of the Middle Ages and Renaissance from Columbia University in 1952, and won a Fulbright fellowship to study in Paris. There she met and married another Fulbright scholar, Charles Le Guin, who survives her.

     
    Author Ursula K. Le Guin in July 1996. Credit Jill Krementz, All Rights Reserved Foto de: Jill Krementz, All Rights Reserved
     
    On their return to the United States, she abandoned her graduate studies to raise a family; the Le Guins eventually settled in Portland, where Mr. Le Guin taught history at Portland State University.

    Besides her husband and son, Ms. Le Guin is survived by two daughters, Caroline and Elisabeth Le Guin; two brothers, Theodore and Clifton Kroeber; and four grandchildren.
    By the early 1960s Ms. Le Guin had written five unpublished novels, mostly set in an imaginary Central European country called Orsinia. Eager to find a more welcoming market, she decided to try her hand at genre fiction.

    Her first science-fiction novel, “Rocannon’s World,” came out in 1966. Two years later she published “A Wizard of Earthsea,” the first in a series about a made-up world where the practice of magic is as precise as any science, and as morally ambiguous.

    The first three Earthsea books — the other two were “The Tombs of Atuan” (1971) and “The Farthest Shore” (1972) — were written, at the request of her publisher, for young adults. But their grand scale and elevated style betray no trace of writing down to an audience.

    The magic of Earthsea is language-driven: Wizards gain power over people and things by knowing their “true names.” Ms. Le Guin took this discipline seriously in naming her own characters. “I must find the right name or I cannot get on with the story,” she said. “I cannot write the story if the name is wrong.”

     
    Ms. Le Guin speaking in 2014 at the University of Oregon. Credit Jack Liu Foto de: Jack Liu
     
    The Earthsea series was clearly influenced by J. R. R. Tolkien’s “The Lord of the Rings” trilogy. But instead of a holy war between Good and Evil, Ms. Le Guin’s stories are organized around a search for “balance” among competing forces — a concept she adapted from her lifelong study of Taoist texts.

    She returned to Earthsea later in her career, extending and deepening the trilogy with books like “Tehanu” (1990) and “The Other Wind” (2001), written for a general audience.

    “The Left Hand of Darkness,” published in 1969, takes place on a planet called Gethen, where people are neither male nor female but assume the attributes of either sex during brief periods of reproductive fervor. Speaking with an anthropological dispassion, Ms. Le Guin later referred to her novel as a “thought experiment” designed to explore the nature of human societies.
    “I eliminated gender to find out what was left,” she told The Guardian.

    But there is nothing dispassionate about the relationship at the core of the book, between an androgynous native of Gethen and a human male from Earth. The book won the two major prizes in science fiction, the Hugo and Nebula awards, and is widely taught in secondary schools and colleges.

    Much of Ms. Le Guin’s science fiction has a common background: a loosely knit confederation of worlds known as the Ekumen. This was founded by an ancient people who seeded humans on habitable planets throughout the galaxy — including Gethen, Earth and the twin worlds of her most ambitious novel, “The Dispossessed,” subtitled “An Ambiguous Utopia” (1974).

    As the subtitle implies, “The Dispossessed” contrasts two forms of social organization: a messy but vibrant capitalist society, which oppresses its underclass, and a classless “utopia” (partly based on the ideas of the Russian anarchist Peter Kropotkin), which turns out to be oppressive in its own conformist way. Ms. Le Guin leaves it up to the reader to find a comfortable balance between the two.

    “The Lathe of Heaven” (1971) offers a very different take on utopian ambitions. A man whose dreams can alter reality falls under the sway of a psychiatrist, who usurps this power to conjure his own vision of a perfect world, with unfortunate results.

    “The Lathe of Heaven” was among the few books by Ms. Le Guin that have been adapted for film or television. There were two made-for-television versions, one on PBS in 1980 and the other on the A&E cable channel in 2002.

    Among the other adaptations of her work were the 2006 Japanese animated feature “Tales From Earthsea” and a 2004 mini-series on the Sci Fi channel, “Legend of Earthsea.”
    With the exception of the 1980 “Lathe of Heaven,” she had little good to say about any of them.

    Ms. Le Guin always considered herself a feminist, even when genre conventions led her to center her books on male heroes. Her later works, like the additions to the Earthsea series and such Ekumen tales as “Four Ways to Forgiveness” (1995) and “The Telling” (2000), are mostly told from a female point of view.

    In some of her later books, she gave in to a tendency toward didacticism, as if she were losing patience with humanity for not learning the hard lessons — about the need for balance and compassion — that her best work so astutely embodies.

    At the 2014 National Book Awards, Ms. Le Guin was given the Medal for Distinguished Contribution to American Letters. She accepted the medal on behalf of her fellow writers of fantasy and science fiction, who, she said, had been “excluded from literature for so long” while literary honors went to the “so-called realists.”

    She also urged publishers and writers not to put too much emphasis on profits.
    “I have had a long career and a good one,” she said, adding, “Here at the end of it, I really don’t want to watch American literature get sold down the river.”

Brazil’s Democracy Pushed Into the Abyss


  • By Mark Weisbrot, www.nytimes.com
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    The rule of law and the independence of the judiciary are fragile achievements in many countries — and susceptible to sharp reversals.
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  • Brazil, the last country in the Western world to abolish slavery, is a fairly young democracy, having emerged from dictatorship just three decades ago. In the past two years, what could have been a historic advancement — the Workers’ Party government granted autonomy to the judiciary to investigate and prosecute official corruption — has turned into its opposite. As a result, Brazil’s democracy is now weaker than it has been since military rule ended.

    This week, that democracy may be further eroded as a three-judge appellate court decides whether the most popular political figure in the country, former President Luiz Inácio Lula da Silva of the Workers’ Party, will be barred from competing in the 2018 presidential election, or even jailed.

    There is not much pretense that the court will be impartial. The presiding judge of the appellate panel has already praised the trial judge’s decision to convict Mr. da Silva for corruption as “technically irreproachable,” and the judge’s chief of staff posted on her Facebook page a petition calling for Mr. da Silva’s imprisonment.

    The trial judge, Sérgio Moro, has demonstrated his own partisanship on numerous occasions. He had to apologize to the Supreme Court in 2016 for releasing wiretapped conversations between Mr. da Silva and President Dilma Rousseff, his lawyer, and his wife and children. Judge Moro arranged a spectacle for the press in which the police showed up at Mr. da Silva’s home and took him away for questioning — even though Mr. da Silva had said he would report voluntarily for questioning.

    The evidence against Mr. da Silva is far below the standards that would be taken seriously in, for example, the United States’ judicial system.

    He is accused of having accepted a bribe from a big construction company, called OAS, which was prosecuted in Brazil’s “Carwash” corruption scheme. That multibillion-dollar scandal involved companies paying large bribes to officials of the state-owned oil company, Petrobras, to obtain contracts at grossly inflated prices.

    The bribe alleged to have been received by Mr. da Silva is an apartment owned by OAS. But there is no documentary evidence that either Mr. da Silva or his wife ever received title to, rented or even stayed in the apartment, nor that they tried to accept this gift.

    The evidence against Mr. da Silva is based on the testimony of one convicted OAS executive, José Aldemário Pinheiro Filho, who had his prison sentence reduced in exchange for turning state’s evidence. According to reporting by the prominent Brazilian newspaper Folha de São Paulo, Mr. Pinheiro was blocked from plea bargaining when he originally told the same story as Mr. da Silva about the apartment. He also spent about six months in pretrial detention. (This evidence is discussed in the 238-page sentencing document.)

    But this scanty evidence was enough for Judge Moro. In something that Americans might consider to be a kangaroo court proceeding, he sentenced Mr. da Silva to nine and a half years in prison.

    The rule of law in Brazil had already been dealt a devastating blow in 2016 when Mr. da Silva’s successor, Ms. Rousseff, who was elected in 2010 and re-elected in 2014, was impeached and removed from office. Most of the world (and possibly most of Brazil) may believe that she was impeached for corruption. In fact, she was accused of an accounting maneuver that temporarily made the federal budget deficit look smaller than it otherwise would appear. It was something that other presidents and governors had done without consequences. And the government’s own federal prosecutor concluded that it was not a crime.

    While there were officials involved in corruption from parties across the political spectrum, including the Workers’ Party, there were no charges of corruption against Ms. Rousseff in the impeachment proceedings.

    Mr. da Silva remains the front-runner in the October election because of his and the party’s success in reversing a long economic decline. From 1980 to 2003, the Brazilian economy barely grew at all, about 0.2 percent annually per capita. Mr. da Silva took office in 2003, and Ms. Rousseff in 2011. By 2014, poverty had been reduced by 55 percent and extreme poverty by 65 percent. The real minimum wage increased by 76 percent, real wages overall had risen 35 percent, unemployment hit record lows, and Brazil’s infamous inequality had finally fallen.
    But in 2014, a deep recession began, and the Brazilian right was able to take advantage of the downturn to stage what many Brazilians consider a parliamentary coup.

    If Mr. da Silva is barred from the presidential election, the result could have very little legitimacy, as in the Honduran election in November that was widely seen as stolen. A poll last year found that 42.7 percent of Brazilians believed that Mr. da Silva was being persecuted by the news media and the judiciary. A noncredible election could be politically destabilizing.
    Perhaps most important, Brazil will have reconstituted itself as a much more limited form of electoral democracy, in which a politicized judiciary can exclude a popular political leader from running for office. That would be a calamity for Brazilians, the region and the world.