RUY CASTRO 
    RIO DE JANEIRO - No tempo em  que se exigia menos postura e mais  compostura dos nossos homens  públicos, a sociedade dispunha de  certos instrumentos de controle  das instituições: o teatro de revista,  as marchinhas de Carnaval e as  chanchadas. Eram de fulminante  agilidade, poder de crítica e penetração popular.
Os últimos arranca-rabos no Senado, por exemplo, caberiam à risca  nas chanchadas. Mas quem interpretaria quem? O problema dos  grandes comediantes, como Oscarito, Zé Trindade e Ankito, é que sua  natural bonomia, que os tornava  tão adoráveis, era incongruente  com a agrestia dos políticos. Nenhum deles poderia ter interpretado, digamos, o senador José Sarney.
O único ator capaz de viver Sarney com realismo seria Chico Anysio, o que ele já mostrou com o personagem do político Justo Veríssimo, que criou na TV há 25 anos. Para isso, bastaria trocar o bigode tipo escovão de Justo pelo de Mazzaropi, no qual, pensando bem, o próprio Sarney pode ter-se inspirado quando se lançou na política nos anos 50.
Outro senador, Renan Calheiros,  ficaria bem nas mãos de Wilson  Grey. Não por qualquer identidade  física, mas porque, assim como não  havia chanchada sem Wilson Grey  -não importava o estúdio ou o  enredo-, não se concebe um governo sem o apoio de Renan Calheiros.  E quem melhor que o rodriguiano  Fregolente como Tasso Jereissati?
Quanto ao senador Fernando  Collor, nenhum dos antigos vilões  das chanchadas, como José Lewgoy, Renato Restier ou Jece Valadão, seria capaz de reproduzir o  olhar açulado, quase hidrófobo, injetado de cólera, de Sua Excelência.  O jeito seria escalar um ator com  certa semelhança de traços, mas  que, pelo contraste entre suas personalidades, obrigasse a plateia a  construir o personagem. Ronald  Golias, quem sabe?
Folha, 7 de agosto de 2009
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