January 30, 2024

Cavaleiros do Apocalipse .

 

 

 

ALDO FORNAZIERI

Desde o início da década de 2020, a humanidade recebe sinalizações de que o planeta está piorando de forma acelerada e angustiante. A degradação é mais aguda em dois sentidos: a crise ambiental e o aumento das desigualdades e da pobreza. Poderíamos incluir, ainda, um terceiro fator, a retomada das guerras extremadas, como as que estão em curso na Ucrânia e em Gaza. No território palestino, por sinal, o conflito ganha tons genocidas, à medida que Israel vem matando crianças, mulheres e idosos indiscriminadamente. Trata-se, sobretudo, de uma guerra contra a infância.

Fixemo-nos, porém, aos dois primeiros. A crise ambiental não é mais uma coisa do futuro. Nós a vemos e a sentimos diariamente. Catástrofes ocorrem em toda parte, do Polo Norte ao Polo Sul, em todos os continentes, da Ásia às Américas. Tornados devastadores, enchentes diluvianas, mares em fúria, incêndios apocalípticos, desaparecimento de espécies, escassez de água, desertificação, safras perdidas, mortes e refugiados ambientais são algumas das terríveis conse­quências do que fazemos contra a natureza.

A percepção aguçada pelos sentidos
parece indicar o prenúncio do fim dos
tempos, gerando perturbações psicoló-
gicas em número crescente de pessoas.
Quando lemos os relatórios da ONU, pre-
parados por cientistas, somos informa-
dos de que estamos perto de um ponto de
não retorno. Ao perder a corrida para de-
ter o aquecimento global, a humanidade
perde para si mesma. Mesmo cientes de
que o modo como produzimos, consumi-
mos e vivemos é desastroso, não nos es-
forçamos para escapar da tragédia.

 
Nesta semana, a divulgação do rela-
tório da Oxfam sobre as desigualdades
trouxe dados assustadores e inaceitáveis.
Em três anos, os cinco homens mais ricos
do mundo duplicaram suas riquezas, al-
ta de 114% desde 2020. No mesmo perí-
odo, 5 bilhões de pessoas, 60% da huma-
nidade, ficaram mais pobres. Fenômeno
semelhante verifica-se por aqui: a fortu-
na dos cinco maiores magnatas do Bra-
sil cresceu 51%, enquanto 129 milhões de
brasileiros empobreceram ainda mais.

 
Os contrastes mostrados pela Oxfam
são cruéis. Os mais pobres levam uma vi-
da de restrições e vicissitudes. As mulhe-
res e as crianças são as que mais sofrem.
Aliás, dentre os 5 bilhões de habitantes
que vivem na pobreza, a maioria é consti-
tuída de mulheres. Discriminações e vio-
lências são comuns no cotidiano dessas
pessoas. Os preços aumentam mais que
os salários, os direitos diminuem e os ga-
nhos das empresas sobre a mão de obra
não param de crescer. Nos últimos três
anos, cresceu também a diferença entre o
Norte e o Sul globais. Quase 70% da rique-
za privada está concentrada no Hemisfé-
rio Norte, onde vive 21% da humanidade.

 
Há uma indisfarçável ligação entre o
aumento das desigualdades e a crise am-
biental. A Oxfam mostra que os 10% mais
ricos são responsáveis por 50% das emis-
sões de gases de efeito estufa, e o 1% mais
rico por 16% da poluição. Ou seja, os en-
dinheirados são os principais responsá-
veis pelo colapso climático e pelo agra-
vamento da pobreza. Já os 50% mais po-
bres respondem por apenas 8% das emis-
sões de carbono.

 
O relatório da Oxfam sugere uma re-
lação direta entre a concentração da ri-
queza nas mãos dos super-ricos e o au-
mento do poder empresarial. De um po-
der empresarial que estabelece uma no-
va era de um poder monopolista concen-
trado, de domínio global. Nesse jogo, as
grandes companhias aumentam as su-
as recompensas, enquanto o poder de
compra dos salários cai. É um jogo de
ganha/perde. Os três primeiros anos
desta década marcam um declínio his-
tórico dos salários, segundo a OIT.

 
O segundo fator da concentração do
poder empresarial diz respeito aos sis-
temas tributários: os super-ricos e suas
empresas evitam pagar impostos, en-
quanto o peso maior da carga tributá-
ria recai sobre os mais pobres. Em ter-
ceiro lugar, com a privatização de ser-
viços públicos essenciais, as tarifas su-
focam os consumidores e vêm causan-
do uma crescente restrição de acesso.
Lucros extraordinários das privatiza-
das são bancados pela população. Com-
panhias que muitas vezes recebem aju-
da dos governos por meio de subsídios,
isenções e outras benesses.

 
Por fim, as grandes empresas agravam
o colapso climático por conta de sua sa-
nha ilimitada por lucro e poder. Indu-
zem, inclusive, suas parceiras e forne-
cedoras a agir de forma predatória para
atender às suas demandas e seus objeti-
vos. A conclusão a que se pode chegar é só
uma: o mundo caminhará para o aumen-
to de conflitos internos e de guerras en-
tre os países. A ambição ilimitada e des-
trutiva dos poderosos se chocará com as
necessidades dos mais pobres e com a ur-
gência de salvar o planeta.

 
CARTA CAPITAL 

 

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