November 22, 2020

A candidatura de Boulos tem devolvido a tesão

 

 


ESTHER SOLANO

Na verdade, não estou apta a vo-
tar, pois não sou brasileira e
fico sujeita à vontade do legis-
lador que decidiu que estrangeiros são
subcidadãos políticos. De qualquer ma-
neira, anuncio aqui: vou de Guilherme
Boulos, de coração e cérebro. Escolha
pensada, refletida e decidida. Na urna
eletrônica da minha consciência, aper-
tarei o número 50.


Faço, pesquiso, estudo, vivo políti-
ca e não houve um dia em que não escu-
tei frases de desesperança, de decepção,
de raiva ou ressentimento contra a classe
política. Para a maioria dos brasileiros,
parece, a política só move paixões tris-
tes, escuras, sujas. Tem o rosto de elite
e fica tão distante que não tem cheiro
de rua nem de povo. Confesso que tam-
bém me dá vontade, com fre­quência, de
mandar muitos políticos à merda, a uma
merda gigantesca. Quando pergunto o
que os cidadãos sentem ao falar de políti-
ca, muitos respondem asco, outros, tris-
teza, outros ainda, mentira. São tantos
conceitos desoladores que dá vontade de
chorar. Por isso, o maior desafio do cam-
po progressista é trazer a política de vol-
ta para o povo, reencantar, reaproximar,
transformá-la novamente em sedução,
sorriso. Fascinar na política, enfeitiçar,
não com o feitiço do marketing, mas com
o feitiço das ideias. Política tem de ter te-
são, paixão, tem de dar calafrio, nem que
for uma pequena dor de barriga, pois, se
não for assim, se torna burocracia, ma-
quinário natimorto que não representa
nada nem ninguém, pura lógica carto-
rial envelhecida.


Sabe o que muitos eleitores de Bolso-
naro me confessavam no período das elei-
ções de 2018? Que ele representava espe-
rança. É isso. Tão simples, tão estarrece-
dor. Os brasileiros precisam de esperan-
ça. Nada mais humano, nada menos tri-
vial. Se a esquerda não for a esperança,
algum monstro poderá sê-lo. Se a gente
não representar a vida, o entusiasmo, al-
gum monstro o representará. Sem espe-
rança, sem entusiasmo, não há vida.


Por isso vou de Boulos. A candidatu-
ra dele tem me devolvido esse tesão que
para mim define a política. Há quem di-
ga que ele não tem chance. Eu e as pesqui-
sas eleitorais discordamos. Tem chance,
sim. Mais: sua candidatura tem me per-
mitido sonhar um pouco. Depois de tanta
tragédia, de tanto bolsonarismo, de tan-
to lixo, de tanta imundície, sonhar é se
manter vivo. Quero recuperar o meu di-
reito de sonhar. Não vou mitificar Bou-
los, nem o transformar em herói ou sal-
vador. Os deuses que nos livrem dos sal-
vadores. Democracia não combina com
Messias ou com super-homens, mas ele e
Luiza Erundina representam, para mim,
a melhor política que circula por São Pau-
lo. Pelo Conselho Cidadão de sua campa-
nha tenho visto uma circulação de ideias,
um respeito pelo pensamento e pela in-
teligência coletivos que não estavam pre-
sentes no meu cotidiano há muito tempo.


Por essa razão, venho aqui pedir o
apoio de vocês. Viremos o voto, amigos,
amigas. Em 2018 fizemos assim e foi um
movimento lindo, cidadão, inspirador. Foi
talvez a única coisa não tóxica da vitória
de Bolsonaro. Só de lembrar, me emocio-
no. Façamos de novo. Conversemos, dia-
loguemos, marquemos encontros virtu-
ais ou presenciais, seguros e com más-
caras. Sentemos para debater com aque-
le amigo que ainda não tem certeza de sua
escolha, aquele familiar que talvez vá vo-
tar em outro, mas com muitas dúvidas,
aquele vizinho boa gente, mas cansado
de tudo ou que tem medo da mudança.
Aquele conhecido que ainda tem um pe-
queno temor em relação ao Boulos “inva-
sor”. Lembram do cafezinho que a gente
oferecia para um desconhecido na tenta-
tiva de conquistar votos para Fernando
Haddad? É isso, vamos fazer de novo por
Boulos, por Erundina, por São Paulo, por
nós. Sei que estamos em plena pandemia,
mas com restrições e cuidados ainda te-
mos muito campo de ação.


A política é a construção conjunta do
nosso presente e do nosso futuro. Nin-
guém deveria se furtar à obrigação de lu-
tar por esse bem comum. Ninguém deve-
ria fugir da responsabilidade de edificar
o futuro, pois o futuro de ninguém deve-
ria ser roubado. O presente de ninguém
deveria ser ignorado. Todos somos polí-
tica. Você e eu somos política. Não recla-
mamos o tempo todo do custo exagera-
do das campanhas, da injustiça da propa-
ganda eleitoral, da miséria midiática de
não ter debates, da monetarização das
eleições? Então, mãos à obra. Peguemos
a política pelo braço e façamos parte da
nossa história. Não aguento mais proje-
tos bolsonaristas ou peessedebistas que
desperdiçam o potencial enorme de nos-
sa cidade, que despedaçam as nossas es-
peranças. Estou cansada de sentir tris-
teza quando penso em política. Eu que-
ro tesão. Vamos virar votos. • 

CARTA CAPITAL


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