A ‘América em primeiro lugar’ populista e nacionalista silenciou as demais correntes
Dorrit Harazim
Stephen
Bannon é vulcânico, além de parrudo e espaçoso em todos os sentidos.
Infiltrado com assento cativo no Conselho de Segurança Nacional da Casa
Branca, ele também participa das decisões-chave nas áreas jurídica e
econômica, elabora o roteiro cru dos discursos do chefe e deixa
impressões digitais explícitas na avalanche de decretos assinados por
Donald Trump.
Bannon não arreda pé do ouvido do presidente. É mais do que seu estrategista-chefe. Apelidado de “Enciclopédia” por admiradores e retratado como “O Grande Manipulador” numa sombria capa da revista “Time”, ele é o comissário de um movimento nacional que Trump acredita encarnar e pretende exportar para o mundo. Formulador teórico desse movimento, ele também é o visionário decidido a manter pura a doutrina. “Estamos presenciando o nascimento de uma nova ordem mundial”, escreveu recentemente.
Bennon leva a sério uma teoria cíclica de crises proposta nos anos 90 pelos americanos Neil Howe e William Strauss, mais conhecidos por terem criado o termo “geração Y”, ou millenials. Segundo o conceito desenvolvido pela dupla, a história dos Estados Unidos segue um inexorável padrão de ciclos, divididos em saeculae. Cada saeculum brota de uma profunda crise nacional, passa por quatro estágios e dura quatro gerações, ou seja, perto de um século. A primeira geração procura manter as instituições estáveis. A segunda começa a priorizar a liberdade individual sobre a ordem social. A terceira não se reconhece mais nem na sociedade nem nas instituições, tomadas de assalto por uma elite do poder.
Bannon não arreda pé do ouvido do presidente. É mais do que seu estrategista-chefe. Apelidado de “Enciclopédia” por admiradores e retratado como “O Grande Manipulador” numa sombria capa da revista “Time”, ele é o comissário de um movimento nacional que Trump acredita encarnar e pretende exportar para o mundo. Formulador teórico desse movimento, ele também é o visionário decidido a manter pura a doutrina. “Estamos presenciando o nascimento de uma nova ordem mundial”, escreveu recentemente.
Bennon leva a sério uma teoria cíclica de crises proposta nos anos 90 pelos americanos Neil Howe e William Strauss, mais conhecidos por terem criado o termo “geração Y”, ou millenials. Segundo o conceito desenvolvido pela dupla, a história dos Estados Unidos segue um inexorável padrão de ciclos, divididos em saeculae. Cada saeculum brota de uma profunda crise nacional, passa por quatro estágios e dura quatro gerações, ou seja, perto de um século. A primeira geração procura manter as instituições estáveis. A segunda começa a priorizar a liberdade individual sobre a ordem social. A terceira não se reconhece mais nem na sociedade nem nas instituições, tomadas de assalto por uma elite do poder.
Por fim, na “quarta virada” — ou “The Fourth Turning”, título da obra de Howe e Strauss — ocorre a mudança histórica que abre o caminho a um novo saeculum: a sociedade afunda no caos, as instituições entram em colapso total, e da velha ordem surge a renovação civilizatória do país. A Guerra de Independência, a Guerra Civil, a Grande Depressão seguida da Segunda Guerra Mundial seriam exemplos desses cataclismos cíclicos que abriram caminho para uma purificação da sociedade americana.
Essa teoria de ciclos apocalípticos, tratada com indiferença ou como ficção por historiadores em geral, nunca causou dano a ninguém, exceto ao pedigree dos próprios autores.
Problema há quando Stephen Bannon, o conselheiro mais influente e onipresente da presidência Trump, opera na Casa Branca como se os Estados Unidos estivessem diante da encruzilhada histórica de uma nova “quarta virada”.
Segundo o postulado teórico, um líder inesperado assumiria o poder nesta fase e instalaria um regime para comandar a travessia da convulsão. Um parágrafo do cenário hipotético pinçado pelo “Huffington Post” merece atenção:
“Os vitoriosos terão então o poder para perseguir a agenda mais vigorosa com a qual sonhavam há tempos e contra a qual os adversários haviam lançado alertas sombrios. Esse novo regime vai se entrincheirar pelo tempo que durar a crise. Independente de sua ideologia, a nova liderança vai impor autoridade pública e exigir sacrifícios privados. Enquanto lideres anteriores tendiam a ceder a pressões sociais, ela deverá acirrá-las”.
Esta semana, Stephen Bannon saiu da toca pela primeira vez desde que se entrincheirou com Trump na Casa Branca, onde tem acesso livre ao Salão Oval e é o único a poder circular de jaqueta e calça amarfanhada, fora do figurino de rigor exigido pelo presidente. Subiu ao palco num dos quatro dias de sessão da Conferencia de Ação Política Conservadora (CPAC), realizada anualmente para debater os rumos do movimento conservador no país. O evento reúne militantes que vão da extrema direita a grupúsculos moderados como os Reagan Republicans.
Na edição de 2011, o palestrante e então apenas bilionário Trump não foi levado a sério. Recebeu vaias inesquecíveis. Dois dias atrás, ao apresentar-se no mesmo foro do Gaylord National Resort & Convention Center, o hoje presidente constatou ter domesticado a fórceps o eclético movimento conservador. A “América em primeiro lugar” populista e nacionalista silenciou as demais correntes.
Para o eleitor, quem encarna essa América que se redescobre é Trump, sozinho. Mas quem lhe deu embasamento, formulou a linha de ataque e dela continua sendo o inflexível guardião é Bannon.
Na “quarta virada”, as prioridades do ideário trumpiano se dividem em três linhas de frente: “segurança nacional e soberania”, “nacionalismo econômico”, “desconstrução do Estado administrativo”. Sem trégua para o inimigo interno que precisa ser desmoralizado — a grande mídia. E sem baixar a guarda ao cenário de guerras múltiplas que, segundo o estrategista, ocorrerão nas próximas décadas.
Coincidência ou não, entre os vários painéis da Convenção, dois deles tinham por titulo “Quando começou a Terceira Guerra Mundial?”. Um tratou das ameaças internas, outro dos perigos que rondam mundo afora. Segundo Bannon alertou em palestra três anos atrás, “o Ocidente judaico-cristão está em colapso, implodindo sob nossos olhos”. Ele previa um confronto apocalíptico com o mundo islâmico no qual será preciso “lutar por nossas crenças contra esta nova barbárie [o extremismo radical], “que vai erradicar por completo nossa herança dos últimos 2.000, 2.500 anos”. Ele também prenuncia uma guerra no Mar do Sul da China para os próximos anos.
Bannon já foi definido como uma espécie de Michael Moore de extrema-direita. Nascido em família de classe média democrata e católica, viu o pai trabalhador afundar na crise financeira de 2008 enquanto Wall Street ficou de pé. Serviu na Marinha, formou-se em segurança nacional, tirou MBA em Harvard, e ganhou bastante dinheiro no setor de entretenimento antes de mergulhar na cruzada que deu voz, vida e voto à America de Donald Trump.
“Estamos em guerra”, era seu princípio geral à época em que comandava o site de extrema-direita Breitbach. “Estamos em guerra” parece ser sua convicção também na Casa Branca. Pode não ser a Quarta Virada, mas coisa boa não é. O primeiro inimigo a abater já foi escolhido: a grande imprensa independente.
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