Uma sala acanhada, com luz teatral, os focos dramaticamente apontados
para instalações de pouco mais de 1 metro de altura, esconde os
pequenos pecados da belíssima exposição O Pasquim — 50 Anos, em
cartaz no Sesc Ipiranga, em São Paulo, até abril de 2020. Veem-se as
tirinhas e charges dissimuladas por trás de peças que lembram aqueles
monóculos de plástico coloridos dos anos 1960 e 1970, de formato cônico —
com a foto de um lado e uma lente de aumento do outro. Em alguns casos,
cortinas cobrem os desenhos. O espaço tem um nome que pressupõe o que
se verá lá dentro, um tanto recôndito e evidentemente envergonhado:
“Pasquim Incorreto”. Estão disfarçadas, naquele canto, as piadas mais
chulas e preconceituosas do tabloide que, ao longo de 22 anos, mas
sobretudo em seus primeiros tempos, durante a ditadura militar, cutucou
todas as feridas ao se anunciar “livre como um táxi”, “equilibrado como
um pingente” e “incômodo como um folião num velório”.
A concentração recatada dos capítulos mais “folgazões” do semanário,
para usar uma expressão de um de seus criadores, o jornalista Sérgio
Augusto, impõe a retomada de uma questão: o movimento politicamente
correto matou o humor? Antes de responder à pergunta, convém anotar o
que diz o catálogo da exibição: “O Pasquim foi um jornal
moleque e sem limites. No espaço Pasquim Incorreto as obras estão dentro
de visores para que sejam apreciadas por meio das lentes do passado,
dentro daquele contexto e com o olhar crítico do presente”.
Mas, afinal de contas, a correção política fere de morte a graça?
“Não, apenas mata o humor fácil, ancorado no preconceito”, diz Nelito
Fernandes, do Sensacionalista, publicado por VEJA, e um dos redatores
finais, ao lado de Martha Mendonça e Gabriela Amaral, do programa Zorra,
da Globo. “A piada inteligente sempre viverá.” Para Nelito, fazer rir
exige uma permanente negociação com os humores do cotidiano, com o que
pode e o que não pode, ao ritmo do pêndulo das transformações da
sociedade. Se é o caso de comprovar a permanência do chiste que já não
fere nem machuca, gratuitamente, basta olhar para o próprio Zorra. De 1999 a 2015, quando ainda era chamado de Zorra Total,
seu edifício era construído em cima de anedotas estúpidas contra as
minorias, porque naquele período era assim que se fazia — hoje, o tom é
mais político, com riso que demora alguns segundos para brotar, mas
depois vem que vem, escancarado. No modo do passado, o programa
alcançava, em média, 16 pontos no Ibope, segundo fontes da Globo. Hoje,
vai a 22 pontos. Ou seja: há, sim, gente interessada na pilhéria que
foge da execração.
A adaptação aos novos tempos não foi fácil — e segue sendo exercitada
incansavelmente. Sérgio Augusto cria uma metáfora: “É como o eSocial, o
sistema digital que reúne os dados dos trabalhadores, evita fraudes,
força ao pagamento de impostos e significou um tremendo instrumento de
justiça, especialmente para as domésticas. É útil, é bom, é muito bem
sacado, precisamos nos acostumar e parece não ter recuo — mas é um
porre”. Trata-se, para usar uma expressão batida, de um mal necessário. O
politicamente correto — denominação criada pela direita americana ao
criticar as posturas igualitárias da esquerda, nos anos 1970 — ataca o
que precisa ser atacado: o racismo, a discriminação, o fundamentalismo
religioso. Ao dar as mãos à zombaria, inaugurou um debate que os
humoristas mais sérios sabem ser impossível negar. “A piada está
perdendo seu lugar de fala”, ri Helio de La Peña, do Casseta&Planeta,
fazendo troça de uma expressão típica de nosso tempo. Para ele, o
nascimento e o crescimento das redes sociais romperam um pacto.
Humoristas como Chico Anysio, Costinha e Jô Soares tinham um registro
recatado na televisão, para milhões de telespectadores. Nos teatros, em
espaços mais restritos, “soltavam os cabelos”. Hoje, entre stories e lives,
não há mais fronteiras — e essa ágora infinita, somada às boas
imposições contemporâneas, impôs limites. “Um cidadão pode fazer a piada
que quiser, mas precisa aceitar as críticas que surgirem”, diz Nelito,
do Sensacionalista. “Não pode se achar no direito de sair soltando
bobagens e depois reclamar da reclamação. O humor está sujeito às regras
de convívio social.”
O que não perde validade, e nunca perderá, são as piadas contra os
poderosos — quanto mais estultices disparar um presidente da República,
por exemplo, mais afiado será o tsunami contrário, e não cabe aí nenhum
tipo de autocensura. Nas palavras de Elias Thomé Saliba, doutor em
história pela USP e especializado na trajetória do humor brasileiro, “o
riso continua sendo a arma dos impotentes”. Haverá, sempre, alguma dose
de transgressão — mas não aquela que pede para ficar oculta, como na
sala da antologia do Pasquim (convém ressaltar que todo o resto
da exposição é um passeio iluminado pela genial sagacidade que driblou o
autoritarismo). Talvez seja o caso de seguir o conselho do escritor
israelense Amós Oz (1939-2018) e de sua filha, a historiadora Fania
Oz-Salzberger, no livro Os Judeus e as Palavras. Ao tratarem do
reconhecido manancial judaico para a autoironia que faz gargalhar, eles
escrevem: “Sim, o humor é muitas vezes rude e grosseiro. Se os judeus
são relativamente frouxos em relação à blasfêmia, por que haveriam de se
preocupar com um pouco de indelicadeza? Mas, dada a escolha entre humor
vulgar e fanatismo refinado, nós optamos pelo humor vulgar em qualquer
momento”. Se o alvo da caçoada não gostar, é do jogo — e que alguém
conte outra. No jardim que permeia a mostra do cinquentenário do Pasquim
há uma coleção de bonecos de papelão com figuras ilustres da trajetória
do jornal — Millôr Fernandes, Ziraldo, Jaguar, Paulo Francis, Sérgio
Cabral, Tarso de Castro etc. — e Sérgio Augusto. No Twitter, ele deu o
tom da prosa, ao postar a foto de seu avatar: “Nunca pensei que fosse
virar totem, só, no máximo, tabu”. Tabu como deve ser considerado, sim, o
humor sem freios, banal e desrespeitoso.
Parece não haver dúvida de que aponta para um projeto sombrio e perigoso, autoritário e medíocre do que deva ser a arte em suas diversas manifestações. Parece ainda querer negar aquilo que está assegurado na Constituição, em seu artigo V, que é explícito quanto à liberdade de expressão. Parece ainda ignorar que o Brasil é um país laico. E, por fim, parece querer traduzir nossa cultura como uma mera agente de um projeto marxista, o que talvez seja bastante intraduzível para a maioria dos intelectuais do planeta, a ponto de merecer críticas de representantes mundiais presentes na última reunião da Unesco. Tudo se aproxima do ápice da distopia quando o presidente da Fundação Palmares nega haver racismo no Brasil .
São declarações que constrangem o Brasil e nos geram indignação e vergonha, além de imensa preocupação. Mas, uma vez que a verborragia já soltou seus demônios, essa galera precisa pôr em curso seu plano prático de extermínio do que considera “imoral” ou “ideologicamente contrário” aos seus interesses. E aí reside nossa esperança. Porque, enquanto “palavras ao vento” também fazem parte da liberdade de expressão, cada medida que caminhe na direção de sufocar nossa liberdade de expressão terá enfrentamentos jurídico-constitucionais consistentes.
Afinal, como disse a ministra Cármen Lúcia: "censura não se debate, censura se combate" . E mais do que tudo: a produção cultural é mesmo uma boa “balbúrdia”. Ela foge do controle dos que a querem sufocar, uma vez que com um banquinho e um violão pode-se fazer uma multidão cantar. Da mesma forma que uma peça de teatro pode ser encenada nas ruas, um filme pode ser exibido nas redes sociais, uma obra literária pode ser lida online e a arte visual pode ser exposta na janela de casa. E aqui me lembro que nos anos Collor, quando a Embrafilme foi extinta deixando todo cinema brasileiro à deriva, Sergio Rezende e eu decidimos fazer um filme. Reunimos os amigos, técnicos e atores, e através da penhora de um apartamento de meus sogros conseguimos financiamento para realizar um filme. E realizamos. Nome do filme: "Lamarca, o coração em chamas".
Existe algo incontrolável e belo no curso da história da produção cultural brasileira: ela floresce mesmo nos momentos mais áridos. E isso está em nossas mãos. Soltar os bichos que povoam nossas mentes e corações sem medo de enfrentar a ignorância e a violência que permeiam o discurso fascista em curso.
Como tenho 67 anos e começo a olhar meu relógio com mais comedimento, consciente de que ele tem prazo de validade (desconhecido, porém tem prazo), comecei a fazer uma contagem regressiva do tempo que falta para que o Brasil se livre desse governo de verdades impostas por uma ideologia inqualificável. Um pouco mais de três anos... Terei chegado aos 70 e com certeza verei nossa gente bronzeada mostrar seu valor e desafiar com inteligência, alegria, talento e coragem essa seita que daqui a pouco desaparecerá, ou pelo menos deixará de ocupar postos de relevância nas estruturas governamentais do Brasil. Então mãos à obra, arregacemos as mangas e entrelacemos nossos dedos com afeto. Essa gente deve morrer de medo da nossa capacidade de amar e da nossa liberdade de criar.
* Mariza Leão é produtora de "Guerra de Canudos", "Meu passado me condena" e "O paciente — O caso Tancredo Neves", entre outros
Anya, Lucas e Antônio brincavam no sítio do Tio Frederico quando
perceberam que o Galt, o cãozinho, havia sumido. O desaparecimento levou
os três amigos a uma aventura pela floresta, em que descobriram que o
bichinho havia encontrado uma caverna fora dos domínios do Rei Malvado,
um tirano que roubava todos os meses uma parte da colheita das pessoas. Anya e o mistério do sumiço do cãozinho Galt
é um livro infantil de uma nova lavra de autores interessados em
difundir conceitos considerados por eles “liberais”, como a defesa do
Estado mínimo e a meritocracia, para leitores abaixo de 10 anos.
A obra é uma adaptação da ficção A revolta de Atlas ,
lançada em 1957 pela escritora russa Ayn Rand e considerada um dos
clássicos do liberalismo. Na versão para adultos, a autora descreve um
futuro distópico em que os Estados Unidos se transformam em um Estado
totalitário que oprime a iniciativa privada. Diante desse cenário,
empresários e representantes das classes mais abastadas se refugiam fora
do país. Na adaptação infantil, o Rei Malvado representa o “Estado
opressor”, que abocanha o dinheiro da população por meio de altos
impostos. O nome do cãozinho faz referência a John Galt, personagem
principal da obra original.
O livro infantil foi lançado no ano passado, com a ajuda de uma
vaquinha virtual, e faz parte de um nicho que começa a surgir oriundo da
tese propagada por alguns setores da direita que acusam a literatura
para crianças de ser norteada por conceitos “marxistas”. Tais ideias “de
esquerda”, segundo os autores, são personificadas no mundo infantil com
a concepção, por exemplo, de que chefes sempre são vilões.
“Determinados valores, semeados na sociedade ao longo do tempo, entraram
em colapso. Estes 56 milhões de pessoas que votaram no Bolsonaro não
votaram necessariamente nele. Votaram por uma mudança, por uma nova
forma de ver o Brasil. É um momento muito especial, nunca tinha visto
uma iniciativa como essa no meio liberal, que pudesse levar esses tipos
de valores para as crianças”, disse o advogado Giuliano Miotto, autor de
Anya.
A obra de Miotto integra uma coleção chamada Turminha da liberdade
. A ideia do advogado é firmar parcerias com escolas para distribuir
seu trabalho. Em Goiânia, onde vive, um projeto-piloto de adoção dos
livros está em marcha em duas instituições: uma escola estadual e uma
ONG. Seu plano é ambicioso: visitar 90 cidades para atender ao menos 50
mil alunos ainda em 2019. Os valores a serem defendidos pelos livrinhos,
segundo Miotto, são responsabilidade individual, autoestima e
produtividade. Produtividade infantil, para o autor, é quando Anya,
Lucas e Antônio usam um tronco para conseguir afastar uma pedra que
obstruía a entrada da caverna.
Miotto apresentou sua empreitada no 30º Fórum da Liberdade, em Porto
Alegre, em abril. O evento anual, patrocinado pelo Instituto de Estudos
Empresariais, ligado à família Ling, teve em 2019 sua edição mais
popular: mais de 5 mil participantes. Winston Ling, um dos herdeiros do
clã, faz parte da tropa de choque em defesa do presidente Jair Bolsonaro
desde o início de sua campanha eleitoral. Ling também foi um dos
primeiros interlocutores entre Bolsonaro e seu hoje ministro da
Economia, Paulo Guedes.
O Instituto Liberdade, também criado pela família Ling, integra a
nova leva de patrocinadores da cultura liberal para crianças — liberal
na economia, não nos costumes. Em parceria com a produtora de conteúdo
Brasil Paralelo, a entidade lançou dois títulos. O carro-chefe é Os gêmeos Silva e o lápis milagroso
. O livrinho conta a visita dos irmãos Marcos e Sofia a uma fábrica de
lápis. É uma tradução da obra do autor americano Connor Boyack,
inspirada em um clássico liberal, o ensaio Eu, o lápis ,
escrito por Leonard Read em 1958. O texto mostra as diferentes fases da
produção do objeto, no intento de mostrar à criança conceitos como
“divisão do trabalho, concorrência, comércio e livre mercado”.
“Os valores defendidos pelos livrinhos são responsabilidade
individual, meritocracia e produtividade — como quando Anya, Lucas e
Antônio usam um tronco para afastar a pedra que obstruía a entrada da
caverna”
A Brasil Paralelo ganhou notoriedade nos últimos meses, depois de
lançar um documentário em que mostrava uma versão revisionista do golpe
militar de 1964. Com base em entrevistas com nomes como Olavo de
Carvalho, o filme trata o golpe como uma espécie de necessidade
imperativa para livrar o Brasil da iminência de uma “revolução
comunista”. Em parceria com o Instituto Liberal, a ideia da produtora é
publicar, nos próximos meses, dez títulos com a mesma temática de o Lápis milagroso — dois a cada três meses —, chegando a uma tiragem de 500 mil cópias.
Matheus Bonetto Pazini, que assina a tradução, explicou que o
objetivo da empreitada é criar um contraponto ao que ele considera
“literatura de esquerda”. “Ela é muito forte, focada na questão da
teoria de massa e na ideia de que o chefe é sempre ruim. Leva a uma
interpretação marxista. Não há problema nenhum nisso, desde que haja um
contraponto”, disse.
A pedagoga Anna Rennhack alertou que a disputa por ideologias na
literatura infantil tem se traduzido, em alguns casos, em censura. Ela
recordou que secretarias de educação municipais e escolas, recorrendo a
crenças religiosas, passaram a banir de seus currículos livros que
tratem de temas lúdicos, como bruxas e duendes. “As crianças se tornarão
adultos sem magia, sem imaginação e sem saber como lidar com o medo e
dificuldades”, disse.
Em outros casos, os pedidos de inclusão ou
retirada de livros paradidáticos têm vindo dos próprios pais,
influenciados pelo debate ideológico. No tradicional Colégio Santo
Agostinho, no Rio de Janeiro, um grupo de pais requereu à direção da
escola que tirasse do currículo o livro Meninos sem pátria , do autor Luiz Puntel, por considerar “comunista” a abordagem da obra sobre a ditadura militar.
A editora gaúcha Elaine da Silveira contou que recebeu recentemente
um pedido de um pai para produzir uma obra com temática liberal. “É um
pai que sentiu necessidade de conversar com os filhos sobre finanças.
Ele me procurou com essa ideia. Ele é ultraliberal e não encontrou no
mercado nenhum livro que pudesse dar conta disso. A ideia é aproveitar
os momentos de leitura antes de dormir, aquela leitura noturna com o
filho, para tratar desse tema”, contou.
Já a economista Mariana Peringer, de 40 anos, resolveu tocar o próprio projeto: uma série de quadrinhos chamada Austrinho
, voltada para a disseminação de conceitos da Escola Austríaca de
Economia, que tem em Ludwig von Mises (1881-1973) seu principal
expoente. Peringer frequenta o Fórum da Liberdade desde os 12 anos de
idade. “A mentalidade está mudando. Foi difícil para nos formarmos, e
hoje precisamos de instrumentos para passar adiante esses conceitos”,
disse.
Reprodução de livro paradidático infantil. Foto: Reprodução
Procurado, o Ministério da Educação disse que,
em 2019, ainda não há edital aberto para a compra de novas obras
paradidáticas. Dirigentes de escolas particulares, no entanto, veem na
adoção de livros que tratem de temas “liberais” uma realidade factível.
Na avaliação de Ademar Batista Pereira, presidente da Federação Nacional
das Escolas Particulares (Fenep), que representa 40 mil instituições em
todo o país, há uma demanda reprimida, mas é preciso ter cautela, para
evitar um confronto ideológico direto. “Muitas escolas particulares
trabalham essa questão de economia, de saber administrar seu dinheiro,
capacidade de planejamento. Do ponto de vista do livro paradidático, o
que temos hoje são livros com viés socialista, mais de coitadinho, que é
mais de nossa cultura”, disse. “Tem de preparar o cara para viver no
mundo. Mas que mundo? Um mundo liberal, onde você tem suas
responsabilidades e, se toma uma decisão errada, vai pagar o preço. Não é
culpa do governo nem culpa do chefe.”
O cientista político Renato Galeno, da instituição de ensino superior
Ibmec, faz apenas uma ressalva sobre a nova lavra de autores. Segundo
ele, não se pode confundir liberalismo com conservadorismo. “É
impossível ser liberal e conservador ao mesmo tempo. São conceitos
antagônicos.”
Sérgio Matsuura
O Globo
Com a aproximação da eleição presidencial americana, em novembro de
2020, plataformas digitais mudam regras para a veiculação de anúncios
políticos. O objetivo é minimizar as interferências da internet em
votações, como aconteceu em 2016 na eleição de
Donald Trump
e no Brexit, referendo que decidiu pela saída do Reino Unido da União Europeia. O
Twitter
foi o mais radical, proibindo qualquer anúncio pago de conteúdo político. Na semana passada, o
Google
engrossou o movimento ao restringir a segmentação das propagandas, aumentando a pressão sobre o
Facebook
.
A rede liderada por
Mark Zuckerberg
tem sido criticada por relaxar ainda mais as regras para anúncios
políticos segmentados, permitindo até conteúdos mentirosos. Com a
pressão da concorrência, o Facebook estuda aumentar o número mínimo de
pessoas a serem alcançadas pela publicidade, de cem para milhares, para
reduzir a segmentação.
Em discurso na Universidade Georgetown, em Washington, no mês passado,
Zuckerberg, defendeu a liberdade de expressão para justificar a
permissão de anúncios políticos. Argumentou que uma empresa não deve
julgar o que políticos podem ou não dizer.
— Não checamos anúncios políticos — disse Zuckerberg. — Não fazemos isso
para ajudá-los, mas porque as pessoas devem poder ver o que os
políticos estão dizendo. Sei que muita gente discorda, mas não acho
certo uma empresa privada censurar políticos ou notícias numa
democracia.
Para especialistas, o debate não é sobre censura, mas sobre
microssegmentação e desinformação. Na mídia tradicional, é possível
escolher horários de exibição de anúncios na TV ou no rádio para
alcançar determinados grupos.
O mesmo acontece com revistas e jornais, direcionados a diferentes
públicos. Em outdoors, pode-se selecionar a audiência pela localização.
Mas, na internet, dá para mirar num eleitor do Partido Republicano,
casado, que mora num vilarejo do Texas, gosta de beisebol e é filiado à
Associação Nacional de Rifles, por exemplo.
— É importante distinguir publicidade paga de discurso político em geral
— diz Evelyn Douek, pesquisadora do Berkman Klein Center For Internet
& Society da Universidade Harvard, nos EUA. — Embora a decisão de
não derrubar o discurso de políticos seja defensável, afinal, é a única
forma de responsabilizá-los pelo que dizem, isso se desfaz quando o
Facebook permite anúncios para fatias incrivelmente pequenas da
comunidade que podem ser mais suscetíveis.
Dessa forma, os anúncios microssegmentados ficam fora do debate público,
alcançam apenas o segmento selecionado por quem paga e ainda são de
difícil detecção se difundirem mentiras. Um político alvo de anúncio
calunioso na TV pode se defender. Nas redes sociais, ele nem saberia da
propaganda, que circula em grupo restrito, mais propenso a crer na
mensagem.
O tema virou preocupação mundial com o escândalo da Cambridge Analytica
(consultoria política britânica que teve acesso a dados de usuários do
Facebook sem que fossem informados), que revelou como anúncios
direcionados a pequenas parcelas do eleitorado americano podem ter
influenciado na vitória de Trump em 2016.
— Existe um incentivo para se criarem campanhas coordenadas de
desinformação — afirma Dipayan Ghosh, pesquisador do Shorenstein Center
on Media, Politics and Public Policy, da Escola de Políticas Públicas de
Harvard. — Isso é o que qualquer ator político racional tende a fazer
quando há capacidade de disseminar mentiras que o favoreçam.
A pressão sobre o Facebook só cresce. No fim de outubro, o
diretor-executivo do Twitter, Jack Dorsey, aproveitou as críticas à rede
rival para anunciar a proibição de qualquer anúncio com conteúdo
político, impedindo que candidatos e partidos políticos comprem
publicidade na rede social. E mandou uma indireta para o rival
Zuckerberg.
“Não é sobre liberdade de expressão. É sobre pagar por alcance. E pagar
para aumentar o alcance do discurso político tem ramificações
significativas que a infraestrutura democrática de hoje talvez não
esteja preparada para lidar”, escreveu Dorsey, em seu perfil no Twitter.
Na última quarta-feira, foi a vez do Google anunciar novas regras para a
propaganda política. A partir de janeiro, os anúncios terão restrições
na segmentação, com filtros apenas por idade, gênero e localização. No
Reino Unido, que tem eleições no mês que vem, as regras já estão
valendo.
— Acho que essa pressão vai fazer o Facebook adotar alguma medida —
prevê Ghosh. — A decisão do Twitter pôs enorme pressão sobre Zuckerberg,
que deve fazer a coisa certa, suspendendo temporariamente a propaganda
política até que possamos compreender o fenômeno da desinformação e
garantir que não seja um problema na plataforma.
Decisão envolve negócios
Na semana passada, segundo o Wall Street Journal, o Facebook procurou
potenciais compradores de anúncios ligados aos partidos Democrata e
Republicano, para discutir mudanças nas regras, num esforço para limitar
a disseminação da desinformação.
—Estamos buscando formas para refinar nossa abordagem sobre anúncios
políticos — afirmou um porta-voz da companhia na quinta-feira.
Mas essa decisão não é tão simples. Nos últimos anos, o Facebook começou
a ser visto por apoiadores do Partido Republicano como anticonservador,
por ter excluído contas consideradas disseminadoras de
fake news
. A rede social também tem sido alvo dos democratas. A senadora
Elizabeth Warren, uma das principais concorrentes à candidatura
democrata à Casa Branca, defende dividir gigantes da tecnologia como o
Facebook.
E existe a questão financeira. Nas eleições legislativas de 2018 nos
EUA, anúncios políticos renderam menos de US$ 3 milhões ao Twitter. O
relatório do Google informa que, desde abril de 2018, a propaganda
política rendeu US$ 129 milhões. No Facebook, estima-se que esse tipo de
propaganda responderá por até 0,5% do faturamento da empresa em 2020.
Algo em torno de US$ 420 milhões.
— É fácil para o Twitter dizer que não vai mais exibir anúncios políticos, porque não é um grande
player
nesse mercado — pondera Jessica Alter, cofundadora da organização Tech for Campaigns.
Ela também avalia que banir anúncios políticos vai atingir candidatos menos populares:
—Meios analógicos são mais caros, só candidatos com muito dinheiro ou
tempo para cultivar seguidores nas redes continuarão dominando.
Candidatos estabelecidos, ricos e celebridades terão vantagem enorme.
Como são anúncios políticos em cada plataforma
Google: A partir de 6 de janeiro de 2020, políticos
poderão segmentar anúncios só por idade, gênero e localização. Não será
possível focar em eleitores inclinados para a esquerda ou para a
direita, ou filiados a determinado partido político. Também não serão
permitidos argumentos falsos nem vídeos manipulados.
Twitter: Baniu qualquer anúncio pago de conteúdo
político. Isso inclui qualquer conteúdo pago com referência a
“candidato, partido, políticos com mandato, eleições, referendos,
apuração, legislação, regulação, diretiva ou resultado judicial”.
Facebook: Decidiu se abster de qualquer ação que
restrinja anúncios políticos, cujo conteúdo não passa por checadores.
Mas já estuda fazer alguma restrição à segmentação, como aumentar o
alcance do anúncio.
A indicação de Eduardo Bolsonaro para a Embaixada do Brasil em
Washington, enterrada nesta semana, sempre fez parte de um plano mais
amplo do presidente Jair Bolsonaro. Sem consultar os limites da
Constituição, o presidente via no filho uma chance de continuidade para
2022, se resolvesse cumprir a promessa feita em campanha de não tentar a
reeleição. Ex-ministros e pelo menos dois diplomatas confirmam que a
hipótese chegou a ser aventada no primeiro semestre deste ano. A ideia
não foi adiante por um conjunto de razões. Há uma trava constitucional
que veda a familiares de um presidente se candidatarem imediatamente
após o fim do mandato. Além disso, houve a própria mudança de planos do
pai, cada vez mais candidato a tentar continuar na cadeira ele mesmo por
mais quatro anos. O plano era claro: Eduardo iria para Washington, se
beneficiaria do prestígio de estar próximo da família Trump e de Steve
Bannon — um ex-assessor do presidente americano com ambições de liderar a
extrema-direita global — e voltaria ao país alçado a outro patamar
político. A trajetória internacional o transportaria ao posto de
sucessor natural do pai. Nesse aspecto, havia uma dificuldade extra:
eles não contavam com o alto custo político do apoio de senadores à
empreitada diplomática, que terminou por sepultar o plano.
Na tribuna
da Câmara dos Deputados, na terça-feira 22, Eduardo protagonizou seu
“Dia do Fico”. “Este que vos fala (…) diz que fica no Brasil para
defender os princípios conservadores, para fazer do tsunami que foi a
eleição de 2018 uma onda permanente”, afirmou, ao reforçar que sua curta
trajetória de quase embaixador terminara por decisão própria, e não em
razão da falta de apoio político. Derrotado na seara diplomática, foi
alçado ao posto de líder do PSL na Câmara à revelia da direção de seu
partido, numa sequência enfadonha de disputa de listas contra e a favor
de sua nova função. Aos 35 anos, completados em julho, o filho do
presidente da República tenta ocupar os espaços disponíveis dentro e
fora da esfera pública com um objetivo ambicioso: firmar-se como a
principal liderança de direita do Brasil e como sucessor político do
pai. “Se fizer um bom trabalho como deputado, talvez, quem sabe um dia,
eu seja alçado a voos maiores na política”, admitiu ao jornal O Estado de S. Paulo
. Questionado sobre se podia vir a suceder ao pai, colocou-se dentro do
jogo. “É uma possibilidade que eu aceitaria se fosse uma missão, como
foi para Jair Bolsonaro. Não tendo outro nome ou havendo algum clamor
popular, na falta de sucessores, enfim, em qualquer cenário desses.”
Com Onyx Lorenzoni e Steve Bannon
A autoconfiança necessária para postular os
cargos de embaixador, líder partidário, mentor ideológico e até
presidente é uma construção recente na vida de Eduardo. Quando ainda
atuava à sombra do pai nos corredores da Câmara dos Deputados, em sua
primeira legislatura, o zero três tinha um papel bem definido. Apesar do
mandato de deputado, fazia as vezes de assessor e gravava as
intervenções do pai em plenário, suas entrevistas e suas declarações
polêmicas. Também o acompanhava em todas as votações e seguia seus
passos nas várias vezes em que o patriarca do clã caminhava os 400
metros que separavam seu gabinete do Salão Verde. Foi apenas durante a
campanha de 2018 que Eduardo teve sua primeira chance de protagonismo.
Enquanto o pai convalescia no hospital, vítima de uma facada que quase o
matou, o zero três viajava pelo país em seu lugar. Terminou como
deputado mais votado da história, com 1,8 milhão de votos.
Foto: Reprodução
Em agosto de 2018, encontrou-se pela primeira
vez com Steve Bannon em Nova York, numa visita organizada pelo hoje
assessor especial da Presidência da República Filipe Martins.
Considerado um dos mais aplicados alunos do curso de filosofia do
ideólogo Olavo de Carvalho, Martins conseguira contato com o
ex-estrategista da campanha de Trump por meio de uma das filhas de
Bannon. Outro interlocutor foi o investidor de origem brasileira Gerald
Brant, que conhecia Eduardo dos tempos de juventude e vivia nos Estados
Unidos. A aproximação com Bannon tinha o aval de Olavo de Carvalho, de
quem Eduardo já era entusiasta. Idealizador do The Movement, uma aliança
internacional da direita contra o chamado “globalismo”, Bannon acusa as
grandes empresas multinacionais de serem organizações que visam
derrubar a soberania nacional dos países. O mesmo pecado também é
imputado por Bannon, hoje rejeitado até por Trump, a organismos
internacionais, como a ONU. Eduardo faz coro à ideia. Ao ser anunciado
pelo consultor americano, em fevereiro, como o líder do The Movement na
América Latina, Eduardo se disse “muito orgulhoso”. “Trabalharemos com
Bannon para resgatar a soberania de forças progressistas, globalistas e
elitistas e para expandir o nacionalismo de bom senso para todos os
cidadãos latino-americanos”, escreveu, à época, em comunicado.
Alçado a presidente da Comissão de Relações Exteriores e Defesa da
Câmara, Eduardo virou “chanceler informal” do governo do pai. No
primeiro semestre, viajou para Estados Unidos, Israel, Argentina,
Hungria e Itália representando Bolsonaro. Chamou a atenção com sua visão
de política externa, ao dizer, por exemplo, que “são bombas nucleares
que garantem a paz” e que havia a chance de guerra com a Venezuela se o
governo de Nicolás Maduro, “um maluco associado a terroristas e ao
narcotráfico”, evoluísse “para um quadro pior”.
“Sem consultar os limites da Constituição, o presidente via no filho
uma chance de continuidade para 2022, se resolvesse cumprir a promessa
feita em campanha de não tentar a reeleição. O plano B acabou sendo a
embaixada”
Com Donald Trump e o assessor Filipe Martins, em
tentativa de aproximação com a Casa Branca. Foto: Joyce N. Boghosian /
Official White House Photo
O protagonismo recém-conquistado contrasta com o
início da carreira política de Eduardo. Escrivão na Polícia Federal,
foi o último dos três filhos adultos a ingressar na carreira política.
Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ),
concorreu a sua primeira eleição apenas em 2014, aos 30 anos, diante dos
apelos do pai de que havia espaço para um candidato com o discurso
similar ao de Bolsonaro em São Paulo, sobretudo em corporações como as
polícias Militar e Civil. O hoje presidente havia construído sua
carreira política no Rio de Janeiro, assim como os filhos Flávio e
Carlos. Até ser eleito, a única incursão feita por Eduardo no ambiente
político foram os 16 meses em que apareceu como servidor comissionado do
gabinete da liderança do PTB na Câmara dos Deputados, partido então
comandado por Roberto Jefferson, segundo reportagem publicada pela BBC.
Era 2003, e Eduardo tinha 18 anos recém-completados. Havia acabado de
ser aprovado no curso de Direito no Rio de Janeiro, apesar de receber
rendimentos por um emprego em Brasília.
Eduardo se transformou em pária dentro do PSL, articulando a saída de Delegado Waldir
O ex-deputado Alberto Fraga (DEM), amigo de
Bolsonaro desde os tempos do Exército, disse que Eduardo era o mais
comedido e “calado” dos três filhos que entraram na política. Sua sede
de protagonismo, hoje, surpreende os que o conhecem de outros tempos.
Durante a campanha de 2018, já em vias da transformação, Eduardo dizia
que, ao ser reeleito, gostaria de ser líder do PSL na Câmara ou mesmo
líder de governo, dando como certa a vitória do pai. Um aliado chegou a
questionar Jair Bolsonaro, na época, sobre se Eduardo teria mesmo a
capacidade de separar a defesa do próprio pai da defesa do presidente da
República. Ouviu do presidente que o filho já estava maduro o
suficiente para separar essas coisas. Após a eleição, conseguiu
segurar-se no cargo de líder por cerca de um mês, mas uma discussão com
outros deputados da mesma sigla no grupo de WhatsApp da bancada acabou
levando colegas a convencê-lo de que o posto não era para ele. Calado na
vida real, Eduardo demonstrava personalidade ferina no meio virtual.
“Um aliado chegou a questionar Bolsonaro sobre se Eduardo teria mesmo
a capacidade de separar a defesa do próprio pai da defesa do
presidente. Ouviu do patriarca que o filho já estava maduro o suficiente
para separar as coisas”
Os dez meses de mandato do pai, contudo, acabaram selando a
metamorfose política do filho, que passou a sentir-se seguro para
empreender brigas fora da internet. Um episódio de julho retrata a
transformação. Eduardo convocara uma reunião partidária em seu gabinete
em Brasília. Estavam presentes os colegas Luciano Bivar (PE), presidente
nacional do PSL, e os deputados paulistas Alexandre Frota (hoje do
PSDB) e Joice Hasselmann. A deputada — atualmente desafeto de Eduardo —
aproveitou o encontro para externar seu plano de concorrer à prefeitura
de São Paulo, com o apoio de Bivar, mas recebeu imediatamente uma
invertida do filho do presidente: “Não, você não vai ser nossa
candidata”, afirmou. Hasselmann, que não é conhecida pelo caráter
plácido, se exaltou. Com a face avermelhada, levantou-se da cadeira e
disse que, se aquele era o caso, não teria mais por que ficar ali.
Eduardo argumentou que seria preciso escolher um candidato que
preenchesse requisitos “técnicos”. Frota saiu em defesa da colega,
enaltecendo seu desempenho político no governo, mas a situação só
piorou. Eduardo se referiu a Frota como “caroneiro” e ameaçou: “Cara, eu
tenho pena de você. Com uma tuitada minha, vão arrebentar você na
internet”. De perfil conciliador, Bivar colocou panos quentes na
discussão antes que ela pudesse escalar.
Eduardo agia como auxiliar do pai enquanto ele era ainda deputado. Foto: Ailton de Freitas / Agência O Globo
A advogada do PSL Karina Kufa, aliada de
Eduardo, contou que a ideia era fazer um “processo seletivo”. Um dos
nomes mais levantados era o do apresentador de TV José Luiz Datena. “A
gente recebeu o Datena, ele se mostrou interessado em participar desse
processo”, contou. Outro nome na jogada seria o deputado estadual Gil
Diniz (PSL-SP), conhecido na internet como “Carteiro Reaça”. Aluno de
Olavo de Carvalho, o “carteiro” ganhou notoriedade ao propor que alunos
de universidades públicas passassem por exames toxicológicos, depois de
Carvalho ter afirmado que “estudante está na universidade só para fumar
maconha e fazer suruba”. Hoje, Diniz é acusado de operar um esquema de
“rachadinha” em seu gabinete na Assembleia Legislativa de São Paulo
(Alesp). Já Eduardo, apesar de ter crescido em ambição, continua sendo
criticado como articulador político. “Eduardo não senta para conversar
com ninguém. Político, jornalista. Se alguém pede para tirar uma foto,
ele trata a pessoa mal. Dá para ser político assim?”, provocou o hoje
desafeto Delegado Waldir (PSL-GO), que perdeu o cargo de líder para o
zero três. Na Câmara, Eduardo tem poucos amigos. Os parlamentares mais
próximos a ele são Bia Kicis (PSL-DF) e Luiz Philippe de Orleans e
Bragança (PSL-SP). Os três se encontram para jantar de vez em quando.
Entusiasta do torturador Brilhante Ustra, Eduardo o
entrevistou para seu canal na internet. Foto: Gustavo Basso / NurPhoto /
Getty Images
Os atritos não se restringem ao PSL. Em sua
primeira reunião de líderes depois da disputa dentro do partido, na
terça-feira, causou estranheza o tom agressivo das intervenções de
Eduardo. O evento, que reúne os comandantes dos partidos na Câmara e o
presidente da Casa, Rodrigo Maia, ocorre a portas fechadas, e a
cordialidade é praxe mesmo entre opositores. Naquela manhã, era
discutido um acordo com a oposição para atrasar a votação do projeto de
lei que autoriza o porte e a posse de armas, mas com a garantia de que
ele seria votado ainda naquela semana. Eduardo debochou da negociação,
dizendo que “o PT é assim mesmo”. Como diversos partidos de centro
participaram do acordo, e não apenas o PT, o momento causou
constrangimento e a sensação de que o parlamentar não entendia como
funcionava a pauta.
“Na primeira reunião de líderes após a disputa do PSL, causou
estranheza o tom agressivo das intervenções de Eduardo. No evento, que
reúne os chefes dos partidos na Câmara e o presidente da Casa, Rodrigo
Maia, a cordialidade é praxe até entre opositores”
Eduardo também aproveitou a reunião para dizer que o óleo derramado
nas praias do Nordeste era fruto de uma conspiração da esquerda com a
participação da Venezuela — outro episódio incomum. Apesar das
divergências ideológicas patentes no Congresso, nesse tipo de reunião,
de caráter burocrático, o habitual é que líderes encontrem pontos de
negociação entre partidos. Expoentes do centrão interpretaram a
“estreia” de Eduardo como sinal de que ele será um parlamentar isolado, o
que poderá abrir margem para derrotas maiores do que as que o governo
já sofre. “É um cara extremamente mimado, que não aceita opinião
contrária. Começou a usar o fato de ser filho do presidente para crescer
aqui. Levou metade dos cargos do PSL”, acusou Alexandre Frota. “Eduardo
não tem personalidade de líder. Quero ver ele sentar a bunda na cadeira
aqui, como fazia o ( Delegado ) Waldir, e atender deputados,
falar com o presidente, ir e voltar do Palácio do Planalto.” Kufa, a
advogada, discorda. Disse que ele é um rapaz dedicado. “Quando tem uma
reunião mais técnica, ele gosta de anotar coisas. Tem um caderninho em
que ele gosta de anotar até decisões judiciais. É uma pessoa que gosta
de se qualificar”, afirmou.
Da esquerda para a direita, Eduardo e os irmãos Flávio e Carlos com a mãe, Rogéria. Foto: Reprodução
Em seu primeiro discurso como líder, na tribuna
da Câmara dos Deputados, Eduardo repetiu o que dissera em privado e
insinuou que o óleo nas praias do Nordeste tem relação com as
manifestações no Chile e que tudo seria parte de uma “conspiração da
esquerda” para deslegitimar os governos “de direita” na América Latina.
“O Brasil, durante muito tempo, engordou o Foro de São Paulo. Agora,
eles estão colocando as garras deles de fora. Não fiquem surpresos se
mais instabilidade vier por aí. Eles vão usar qualquer tipo de argumento
para tentar fazer essa instabilidade acontecer, porque o que eles menos
são é democratas”, disparou.
“Jair Bolsonaro disse que os filhos deram uma ‘mergulhada’. Mas há
dúvidas sobre o real ímpeto de Eduardo, que hoje se diz líder de
direita, em submergir”
Jair Bolsonaro tem demonstrado apoio ao ímpeto do filho. Defendeu sua
postulação a Washington afirmando que, se quisesse, poderia nomeá-lo
até mesmo chanceler, para que Eduardo tivesse sob seu comando “mais de
uma centena de embaixadas”. Também disse, em outra ocasião, que não via
problemas em colocar o filho em um cargo de maior prestígio. “Pretendo
beneficiar um filho meu, sim”, disse Bolsonaro, em uma de suas
transmissões ao vivo nas redes sociais. “Se eu puder dar um filé-mignon
para meu filho, eu dou, sim”, acrescentou. Na disputa partidária no PSL,
áudios de Bolsonaro pedindo que deputados assinassem a lista com o nome
de seu filho foram revelados por ÉPOCA. Em uma reunião interna,
deputados se queixaram de terem sido pressionados pelo presidente da
República para endossar o nome do filho.
Eduardo nos Estados Unidos. Ele tem posse e porte de arma e defende a derrubada do Estatuto do Desarmamento. Foto: Reprodução
Poucos dias depois, ao falar com jornalistas
durante a viagem a Tóquio, no Japão, Bolsonaro tentou baixar o tom.
Disse que seus filhos deram uma “mergulhada”, referindo-se ao fato de
eles terem adotado uma postura mais discreta, mas sem mencionar os
problemas que os afligem, como o caso Fabrício Queiroz. “O Flávio está
mergulhado há muito tempo. O Eduardo está na dele, de vez em quando dá
uma alfinetada, é do DNA dele, e o Carlos, pelo que estou vendo,
resolveu comprar uma briga com a Joice ali. Eu falei para ele dar uma
mergulhada também. Todo mundo perde em qualquer alfinetada”, afirmou. A
serenidade da fala do presidente, contudo, tem encontrado pouco eco na
realidade. Pelo menos em relação ao zero três — que não dá qualquer
sinal de que deseja submergir.
Ela saiu de casa determinada a prestar um serviço ao país. Estava
cansada das pessoas que torciam contra o seu presidente. Das
instituições que iam contra os valores da família brasileira. Da
imprensa que atacava o governo.
Foi até um supermercado e procurou por produtos com qualquer relação com empresas antipatriotas.
Ligou a câmera do celular e apontou para um sabonete. Aquela marca, disse a seus seguidores, anunciava na Foice de S.Paulo, que vivia de difamar seu presidente. Deveria ser boicotada.
Aquela marca de enxaguante bucal? Patrocinadora da Globo Lixo.
Boi-co-te! Iria comprar o produto concorrente, para aprenderem a não
torcer contra o presidente.
O mesmo deveria ser feito com a marca francesa de canetas. Aquele tal
do Macron só criticava seu presidente. No lugar, ela compraria a caneta
alemã.
Mal postou o vídeo e comentários pipocaram. A Alemanha, produtora da
caneta escolhida, também criticou Bolsonaro. A fabricante do outro
sabonete anunciava na Foice de S.Paulo. E todas a empresas de higiene
pessoal patrocinavam a Globo Lixo.
Ela voltou para casa decidida a eliminar todos os produtos que iam
contra seu presidente. Xampus, sabonetes, alimentos processados. Se
livrou até da bandeira do Brasil, que descobriu ser fabricada na China
comunista.
Pegou a bicicleta —lembrou que a marca do seu carro também
patrocinava a mídia mentirosa— e pedalou até seu sítio em Jundiaí.
Capinou a terra, comprou sementes e umas galinhas. Iria produzir seu
próprio alimento, livre de inimigos do seu presidente.
Logo descobriu que a vida do pequeno produtor era muito difícil. O
custo de sementes e de matéria-prima era alto. As pragas e as chuvas
intensas arruinaram sua horta.
Seus vizinhos de terra contaram que, com a liberação de mais
agrotóxicos e o desmatamento, eles seriam asfixiados pelos grandes
produtores. Tudo culpa daquele maldito governo.
Sentada na cooperativa de orgânicos, que ela ajudou a fundar, pegou
uma dose da cachaça, que ela mesma produziu, acendeu seu cigarro de
palha, com o tabaco que ela mesma plantou, e praguejou: “Vocês estão
torcendo contra”.
Caminhadas, trilhas, mirantes, rodas de samba, restaurantes e feira literária estão entre as opções de diversão
Paula Lacerda
Não desanime se o tempo fechar. Lá em Paquetá, no meio da Baía de
Guanabara, a previsão do Climatempo é de sol no fim de semana. Por que
estamos atentos a isso? Porque o feriado prolongado da Proclamação da
República é uma boa oportunidade para curtir a bucólica ilha, seja em
passeios de um dia, seja aproveitando o clima de “viajar” sem gastar
muito, hospedando-se em um dos charmosos “cama e cafés” locais e
esticando a visita. Afinal, Paquetá é logo ali. Apesar de parecer uma
cidade do interior, com suas tranquilas ruas de saibro onde carros não
entram, é um bairro do Rio de Janeiro, a apenas uma hora de barca do
Centro.
—Amanhece nublado no Rio, ninguém vem. O pessoal gosta de vir no sol e
no calor, mas a ilha pode ser curtida mesmo em dias amenos — observa
Elizabeth Viana, dona do Orquidário Bistrô, uma simpática casa na Praia
das Gaivotas que desde o ano passado abriga no amplo quintal arborizado
rodas de choro e de samba acompanhadas de uma feijoada que ela mesma
prepara.
Hoje tem Samba do Domênico a partir das 11h. O programa é “família”:
além de casa na árvore para as crianças, tem, com uma taxa de R$ 10, o
chuveirão e a piscina. E é bom aproveitar: depois de edições que lotaram
o Orquidário, como as em que se apresentaram o Choro da Glória e o
grupo Moça Prosa, as rodas ficaram mais raras.
— A gente estava com uma agenda frenética, todo sábado e domingo, muito
cansativo. Vamos diminuir o número de shows e investir em festas de
aniversário e casamento. Aqui é para quem gosta de pé no chão, de
crianças correndo... Cada um vai ao bar e pega a sua cerveja, não somos
casa de espetáculo — diz Beth, que se mudou do Flamengo para a ilha com o
marido e a filha de 11 anos há cinco anos e avisa: “Paquetá não é para
amadores".
Carros proibidos: o
deslocamento pela ilha é feito a pé, de bicicletas ou charretes
elétricas Foto: Custódio Coimbra / Agência O Globo
Não é para “amadores”, mas é para os amantes. Se o lugar é programa
perfeito para famílias, com direito a praias (no último fim de semana,
todas estavam próprias para banho), passeios contemplativos a pé, de
bicicleta, de carrinhos elétricos (alugados na saída das barcas), ou
mesmo em pedalinhos coloridos, embarcar na atmosfera e nos silêncios da
ilha é inspirador para casais apaixonados. Não por acaso, a ilha que já
foi conhecida como Pérola da Guanabara é também a “Ilha dos Amores” ou o
“Jardim dos Namorados”.
O cenário para o beijo pode ser um coreto (o Coreto Renato Antunes, onde
acontece em agosto a Festa de São Roque, padroeiro local, e, em torno
do qual, rolam animadas festas juninas e blocos de carnaval). Ou os
banquinhos de frente para as águas calmas que cercam os quase oito
quilômetros de perímetro da ilha, o pôr do sol visto da Pedra da
Moreninha, ou um mirante com visual espetacular para a Baía de
Guanabara, como o Mirante Boa Vista, no Parque Natural Municipal Darke
de Mattos. Uma visita ao parque, aliás, é imperdível, com seus jardins e
árvores centenárias e ponto de partida de uma pequena trilha que leva a
outro mirante.
O Parque Darke de Mattos tem mirantes voltados para a Baía Foto: Custódio Coimbra / Agência O Globo
— Há lendas que dizem respeito a esta vocação romântica da ilha. Em
frente à Pedra dos Namorados , na Praia José Bonifácio, os enamorados
têm que ficar de costas e jogar três pedrinhas em direção à pedra. Se
pelo menos uma delas ficar lá em cima, é porque o amor é correspondido —
conta José Lavrador, que administra um dos principais centros culturais
locais, a Casa de Artes Paquetá. — Acreditamos na revitalização da ilha
com um turismo de base comunitária, respeitando suas particularidades.
Paquetá é uma Apac (Área de Preservação do Ambiente Cultural) com
concentração enorme de bens tombados e arrolados em projetos de
preservação.
A Casa de Artes, uma chácara (em Paquetá, são muitas) de frente para a
Praia de São Roque que há alguns anos foi a residência de Zé Lavrador —
e, há muitos, da escritora e musicista Ormy Toledo, que reunia ali
músicos como Lamartine Babo, Radamés Gnatalli, Silvio Caldas e Orestes
Barbosa —, hoje abriga acervo documental e exposições sobre a história
da ilha e uma série de eventos, de formação musical para crianças a
rodas de choro (todo primeiro domingo de cada mês é dia).
Este domingo, é lá que acontece O Samba de Paquetá, uma roda com
Cristina Buarque, Pedro Amorim, Magno Julio e Oscar Bolão que vai
homenagear João Nogueira e Paulinho da Viola. A roda acontece no jardim,
com mesinhas espalhadas para sentar e saborear, junto com o som, o
famoso pastel de “jiló etc.” (R$ 24, quatro unidades), que, além do
vegetal, leva bacon e gorgonzola.
De hoje a domingo, a Casa de Artes será um dos pontos de encontro da 3ª
Festa Literária de Paquetá — Flipa 2019, que reúne lançamentos de
livros, palestras, oficinas e rodas de conversa com mais de 50 autores
em espaços culturais, clubes, restaurantes e até casas de moradores. A
abertura será às 10h, na Casa José Bonifácio, uma espécie de QG da
festa.
— É um evento comunitário. Cada espaço tem autonomia de decidir sua programação — diz Marcelo Ficher, um dos organizadores.
Este ano, a Flipa privilegiou a literatura infantojuvenil. Uma das
autoras é Duda Macieira, de 8 anos, que contará histórias baseadas em
seu segundo livro. Outros que estarão presentes são Anielle Franco, irmã
de Marielle, que lança o livro “Cartas para Marielle”, e Raphael Vidal,
com “Algum lugar para cair e poder fechar os olhos de vez”.
O fim de semana tem outra boa atração: hoje, no Paquetá Iate Clube, o
grupo Jequitibá do Samba celebra seus dez anos com uma roda com Anderson
Balbueno (percurssão), Bidu Campeche (percussão), Iuri Bitar (violão),
Julião Pinheiro (violão de 7 cordas), Ronaldo Gonçalves (cavaquinho) e
Pedro Amorim (cavaquinho).
No Solar dos Limoeiros,
Eveli Ficher oferece um café da manhã orgânico para hóspedes e não
hóspedes Foto: Custódio Coimbra / Agência O Globo
Se o fim de semana é recheado de eventos, uma pedida é se demorar na
ilha... e até ficar por lá. Para comer, do café da manhã ao jantar,
passando pelo docinho pós-almoço e o lanche da tarde, há boas opções: o
café da manhã pode ser orgânico, como o que a dona do
bed & breakfast
Solar dos Limoeiros, Eveli Ficher, prepara aos sábados para não hóspedes
(com agendamento) com sucos, geleias, pães e bolos artesanais.
— Só os laticínios não são orgânicos — informa Eveli.
Para almoçar, a charmosa Casinha Amarela, do lado da Casa de Artes,
oferece ao visitante uma sensação de se estar “em casa”. A inspiração
das irmãs Andréa e Márcia Kevorkian, donas e cozinheiras do espaço, são
as receitas que aprenderam em casa com a mãe e as avós, uma espanhola,
outra italiana...
— Crescemos vendo a mesa sempre cheia e trazemos estas memórias para cá.
É uma comida com sabor da nossa infância — diz Márcia, que com Andréa
fez da casa que foi da família o bistrô, há quatro anos. Há dois anos, o
espaço também virou um “cama e café”. — Mas o que a gente curte é fazer
comida.
Marcia e Andréa Kevorkian
comandam a cozinha da casa Amarela, com pratos que lembram a sua
infância Foto: Custódio Coimbra / Agência O Globo
O cardápio muda toda semana, e são três opções de pratos por dia. Entre
as opções do fim de semana, costela de boi assada com molho de alho e
ervas (R$ 38, amanhã) e camarão com molho de tamarindo e coco (R$ 39,
domingo).
Para a sobremesa, vale visitar a confeitaria Bodega Paquetá, uma lojinha
discreta na Rua Pinheiro Freire, com chocolates e tortas produzidos
pelo casal Elias Júnior e Marcela Matos. Prove o éclair de chocolate (R$
7,50), uma receita que Elias guarda a sete chaves. No lanche da tarde,
enquanto você está circulando pela ilha, dê uma paradinha para comer um
pastel enorme numa mesinha em frente à praia. A boa é fazer o pit-stop
no balcão externo ao Hotel do Lido, na Praia José Bonifácio (também
chamada Praia da Guarda ou dos Pedalinhos) e experimentar o de lagostim
ao queijo ou o de camarão ao curry (R$ 10).
À noite, se horário da barca da volta for mais tarde, a opção pode ser
curtir o som da Casa de Noca, um “cama e café” que, há poucas semanas,
abriu seu jardim para happy hours às sextas, a partir das 17h. Logo
mais, tem o baile Bossa Nova é pra Dançar, com o grupo de Nana Kovak e
Edson Barbosa.
Bem perto dali, uma dica de jantar às sextas —incluso na diária de quem é
hóspede — é a charmosa Hospedaria Santa Bárbara, em parceria com o
projeto Gastrolar, do casal Vander e Valéria Borges, que oferecem uma
sucessão de comidas típicas de um Izakaya, bar japonês (o jantar custa
R$ 35). Tudo servido de forma informal.
A Hospedaria Santa Bárbara é uma boa opção para quem quer prolongar a estada em Paquetá Foto: Custódio Coimbra / Agência O Globo
A hospedaria já inspira, por si só, o alongamento da estada, com os
donos, o casal Ricardo Cintra e Leandro Ribas, garantindo a boa conversa
e o clima caseiro.
—Fizemos do cama e café um negócio intimista, um lugar afetuoso como o bairro. Aqui
[ele é de São Paulo]
, conheci o oi, o tchau, o boa tarde, o boa noite. Isso apaixona.
Paquetá foi o lugar em que mais me senti abraçado na vida. Aqui, tem a
vida — conclui Ricardo Cintra.
Um rolê por Paquetá
1. Estação das Barcas.
As barcas e os catamarãs fazem a travessia entre a Praça Quinze e
Paquetá em cerca de uma hora. Dias úteis: primeira partida do Rio: 5h30;
última partida de Paquetá: 23h10. Fins de semana e feriados: primeira
partida do Rio: 4h30, última partida de Paquetá: 23h30. R$ 6,30.
Transporte
2.
Bicicletas podem ser levadas na barca. E, junto à estação, há aluguel de
bicicleta e quadriciclo e pontos de ecotáxi e charrete elétrica .
- No pedal.
Bicicletas: R$ 5 (hora) e R$ 25 (diária). Quadriciclos: R$ 20 (hora) e R$ 75 (diária).
- Ecotáxi (triciclo).
R$ 5 (por pessoa, ponto a ponto), R$ 50 (passeio de 40 minutos).
-Carrinho elétrico.
Substitutos das charretes, funcionam das 8 às 17h. R$ 5 (mínimo de 3
pessoas, ponto a ponto) , R$ 50 (passeio de 40 minutos), R$ 100 (passeio
de 1 hora).
3. Pedalinhos, canoas e caiaques.
Praia José Bonifácio (Praia da Guarda). R$ 20 (40 minutos, duas pessoas).
Atrações
4. Praça de São Roque.
Onde ficam o Coreto Renato Antunes e a Capela de São Roque.
5. Casa de Artes Paquetá.
Praça de São Roque 31 — 3397-0517. Samba de Paquetá: roda com Cristina
Buarque, Pedro Amorim, Magno Julio e Oscar Bolão, homenageando João
Nogueira e Paulinho da Viola. Dom, às 13h. R$ 15. Livre.
6. Pedra da Moreninha 7. Casa José Bonifácio.
Praia José Bonifácio. Sede da aberturada 3ª Festa Literária de Paquetá .
Evento: Sex a dom, horários e locais diversos (programação completa na
página do evento no Facebook, flipa01).
8. Paquetá Iate Clube.
Praia das Gaivotas— 3397-0113. Jequitibá do Samba: Sex, às 14h. R$ 10 (só dinheiro). Livre.
9. Cais e Relógio da Mesbla.
Praia dos Tamoios. A réplica do relógio da Mesbla no farol da Marinha é bom ponto para selfies.
10. Parque Darke de Mattos .
Praia José Bonifácio 255. Diariamente, das 8h às 17h. Grátis.Livre. Proibidos bicicleta, bola, cachorro e churrasco.
11. Orquidário Bistrô.
Praia Das Gaivotas 670. Samba do Domênico: Sex, às 11h. R$ 15 (entrada) e R$ 30 (feijoada).
Onde comer
12. Casinha Amarela.
Praça de São Roque 25 — 2570-1455. Sáb e dom, das 12h30 às 18h.
13. Zeca's Restaurante.
Praça Bom Jesus 12 — 3397-0322. Seg a qui, das 11h às 17h. Sex e sáb,
das 11h às 23h. Dom, das 11h às 21h30. Petiscos , pizzas (sex a dom, a
partir das 18h) e bufê a quilo: seg a sex, R$ 4,49 ( 100g); sáb, dom e
feriados, R$ 5,49 (100g). No fim de semana, há música ao vivo (voz e
violão) à noite.
14. Confeitaria Bodega Paquetá.
Rua Pinheiro Freire 59, loja C — 99792-1590. Ter a dom, das 13h às 18h. Doces e chocolates.
15. Pastel do Hotel e Restaurante Lido.
Praia José Bonifácio 59— 3397-0280. Sáb e dom, das 9h às 21h. O balcão é
externo, de frente para a praia. Os pastéis variam entre R$ 5 a R$ 10 .
Entre estes últimos, estão o de lagostim ao queijo e o de camarão ao
curry.
Onde se hospedar
16. Casa de Noca.
Rua Pinheiro Freire, 20 — 99996-6410. Bistrô: sex a dom, das 11h às 19h;
sáb, das 11 às 21h. Às sextas, happy hour das 17h às 23h (R$ 15). Cama e
café: diária para casal de R$ 230 (com banheiro compartilhado) a R$ 280
(suíte). Com café da manhã e piscina.
17. Hospedaria Santa Bárbara.
Rua Coelho Rodrigues 82 — 3397-2305. Diária para casal (com café): R$
240. Às sextas, jantar incluso no valor da diária. Para não hóspedes, o
jantar é R$ 35. No domingo, o horário de check-out é liberado.
18. Solar dos Limoeiros.
Rua Coelho Rodrigues, 108. Diária de casal: R$ 280 (suíte com café da
manhã orgânico e piscina). Aos sábados, café da manhã para não hóspedes
por R$ 40 (reservas até a véspera).
Aos 23 anos, Wendel Rodrigues Oliveira é um homem de fé. Em 27 de junho, postou no Instagram uma foto da Bíblia
em seu colo, com a legenda: “Indo à casa do pai agradecer por cada dia
de vida e pela paz que ele vem concedendo à comunidade do Parque ( Paulista
) e pelo seu povo”. No mês passado, publicou por seis dias, bem cedo
pela manhã, a frase “Bom dia com Jesus, povão”, com duas mãos espalmadas
em oração. Mas ele é também um homem do crime, e o relógio de ouro na
foto com o livro sagrado é só um indicativo de seu poder. Na comunidade
que cita em suas preces, o Parque Paulista, um bairro em que moram mais
de 30 mil pessoas de Duque de Caxias, no Rio de Janeiro, o jovem é
conhecido como Noventinha e comanda o tráfico de drogas. Foragido da
polícia, tem mandados de prisão em seu nome por isso e por assassinato.
Em meio às postagens de louvor a Deus, há ameaças aos
rivais. “Nunca duvide do poder de Deus. Se Ele transformou água em
vinho, pode transformar sua vida em bênçãos e vitórias”, publicou o
evangélico em 4 de setembro. Em duas oportunidades, compartilhou vídeos
de clipes de cantoras gospel. No dia seguinte, o tom era outro: “Alemão
nunca mais coloca o pé aqui e se tentar colocar é bala neles firme.
Depois, eles que se preparem que já sabem bem a resposta. Tamo junto até
a última bala do pente”, escreveu o traficante, em resposta a uma
homenagem feita por um comparsa no dia de seu aniversário, 5 de
setembro. Duas semanas depois, postou outro recado aos inimigos: “Se
tentar contra a tropa do Parque Paulista, vai entrar no metal”.
Noventinha também faz, eventualmente, propaganda de sua mercadoria, com
fotos de drogas prontas para a venda — “maconha hidropônica, qualquer
violação, reclamar na boca”, diz a embalagem —, roupas camufladas e
armas.
A bandeira de Israel foi içada em Vigário Geral,
Rio de Janeiro por causa da fixação do líder da facção com o Estado
judeu, comum em algumas vertentes neopentecostais. Foto: Reprodução
Apesar de procurado pela polícia,
o criminoso frequenta religiosamente igrejas evangélicas da comunidade
ao menos uma vez por semana e não deixa de contribuir com o dízimo. Esse
fenômeno paradoxal dos traficantes evangélicos não é novo no Rio, mas
vem se alastrando rapidamente nos últimos dois anos, em razão da
ascendência de uma das principais facções criminosas do estado. Desde
2017, dobrou o número de favelas que o grupo de Noventinha domina no
Rio, na esteira da derrocada de uma das facções rivais. Antes
concentrada na Zona Norte do Rio, a facção se espraiou por outras
regiões e chegou à Baixada Fluminense. Um estudo da Secretaria de
Segurança, do ano passado, estima que mais de 300 mil pessoas vivam em
áreas sob o jugo do grupo, quase o dobro de uma década atrás.
A trajetória de Noventinha ilustra bem essa expansão.
Ele saiu de Parada de Lucas, uma favela a cerca de 40 quilômetros de
Parque Paulista, onde era mais um “soldado na hierarquia do tráfico”.
Escolhido para invadir a comunidade em Duque de Caxias, até hoje envia
ao quartel-general da facção, em Vigário Geral, na Zona Norte do Rio, o
lucro da venda de drogas. “Sigo em silêncio e concluindo os objetivos
que os BTB ( sigla para Bonde dos Taca Bala, nome usado para se referir à facção ) têm na Baixada”, afirma em uma postagem nas redes sociais.
A bandeira também foi pintada num muro. Foto: Reprodução
O crescimento desses
“narcopentecostais” acrescentou uma chaga a mais nas favelas que essa
facção domina. Além do tráfico de drogas e da violência cotidiana, a
devoção torta aos Evangelhos se reflete na intolerância em relação às
religiões de matriz africana — o que, vale sempre ressaltar, não
encontra respaldo entre os verdadeiros evangélicos, que pregam a
convivência pacífica e a tolerância.
Embora sempre tenha havido episódios pontuais não só
nas comunidades, mas também no asfalto, de agressões a seguidores de
religiões de matriz africana, elas se tornaram a regra nessas áreas.
Impulsionados por uma visão deturpada dos Evangelhos, esses criminosos
perseguem e oprimem umbandistas e candomblecistas, entre outros — muito
presentes na Baixada, aonde a facção chegou com força nos últimos
tempos.
O baile funk na favela tomada por ele agora se chama Baile de Israel. Foto: Reprodução
Um episódio do dia 11 de julho,
no Parque Paulista, ilustra bem o terror que se instalou. Passava das 11
horas quando batidas no portão assustaram a mãe de santo de um terreiro
de candomblé que funcionava ali havia mais de 50 anos — o mais antigo
da região. Assim que a senhora de 86 anos abriu a porta, um homem
apontou uma pistola para seu rosto e ordenou que destruísse todas as
imagens e objetos do terreiro: “Não pode mais macumba aqui. Ordem do
patrão”, disse.
Foto: Reprodução
Os homens nem sequer encostaram
nos objetos. Sem conseguir mover as esculturas mais pesadas, a mulher
precisou da ajuda de dois filhos de santo que estavam no local para
levantar e arremessar no chão cerca de 20 imagens de orixás e esculturas
de barro e ferro. Em seguida, os bandidos entraram nos vestiários, onde
os seguidores se trocavam antes das cerimônias, e mandaram que todas as
roupas brancas fossem jogadas no meio da rua, em frente ao terreiro. A
pilha foi incendiada. “E agora? Seu orixá vai te proteger?”, zombou um
dos invasores.
Assustados com a fogueira, vizinhos ligaram para a
Polícia Militar. Um carro da polícia chegou uma hora depois, quando os
homens já tinham partido. O que sobrou do terreiro foi levado em um
caminhão. Antes do final da tarde, a mãe de santo partiu de lá, para não
mais voltar. “Ela morou naquela casa por 50 anos. Está traumatizada até
hoje, não consegue falar sobre o que aconteceu. Agora, estamos
arrumando um outro espaço para retomar a rotina do terreiro”, contou uma
filha de santo.
“Apenas neste ano, 176 terreiros foram fechados no Rio após ataques ou ameaças de traficantes”
A invasão é um dos episódios mais recentes de uma
escalada de casos de ataques de traficantes a templos de religiões de
matriz africana no Rio. Só em 2019, até setembro, a Comissão de Combate à
Intolerância Religiosa, organização que reúne membros de várias
religiões e representantes do Tribunal de Justiça e do Ministério
Público, contabilizou 176 terreiros fechados após ataques ou ameaças de
traficantes — mais da metade dos casos na Baixada Fluminense. No ano
passado, a comissão não recebeu nem 100 denúncias.
As investigações da Polícia Civil revelam que o
aumento dos casos está diretamente ligado a um plano expansionista da
facção. Quem está por trás das ordens para os ataques são os traficantes
que se dizem evangélicos e se apresentam nas redes sociais como o
“Exército do Deus Vivo”, como os pastores evangélicos costumam se
referir aos fiéis. Ao longo das últimas semanas, ÉPOCA entrevistou pais,
mães e filhos de santo, policiais civis e militares, promotores,
defensores públicos, pastores e pesquisadores e analisou processos
judiciais e inquéritos em andamento para mostrar como a intolerância
religiosa e o crime organizado andam cada vez mais de mãos dadas no Rio.
Antes de continuar, uma explicação se faz necessária.
Embora professem a fé evangélica, esses bandidos não têm respaldo das
igrejas para suas atividades criminosas e tampouco para a perseguição a
outras religiões. O bispo Robson Rodovalho, líder da igreja Sara Nossa
Terra e presidente da Confederação dos Conselhos de Pastores do Brasil,
afirmou: “Pessoas com esse comportamento são bandidos. Eles combatem
terreiros com vandalismo e ameaças. Essas são as armas que eles têm
contra locais que consideram demoníacos. Mas isso está errado, porque o
Brasil é um país laico e de liberdade religiosa para todas as fés. É
possível dizer que não concordo com religiões diferentes da minha, mas
jamais terei o direito de destruir símbolos de outras denominações”.
Para ele, que considera inaceitáveis os ataques aos centros, os
traficantes evangélicos podem estar tentando se “legitimar com suas
consciências”.
“Pastores e líderes evangélicos afirmam que esses criminosos não podem ser considerados seguidores da religião”
Em Vigário Geral, onde fica o comando do grupo
criminoso, quem manda é Álvaro Malaquias Santa Rosa, o Peixão, outro
devoto traficante. O discurso religioso se confunde com práticas
bárbaras. Seu bando cria porcos dentro da favela de Vigário Geral para
desaparecer com cadáveres de vítimas da quadrilha. Nos últimos dois
anos, pelo menos nove vítimas — moradores de favelas dominadas por
grupos rivais ou pessoas que desobedeceram a alguma regra interna da
comunidade — foram jogadas aos animais pelos criminosos. Sua quadrilha
também é acusada de pagar R$ 300 mil por mês à polícia para ter
informações antecipadas sobre operações.
Lá, tremula uma bandeira de Israel, possível de
avistar da Avenida Brasil, a principal via do Rio. Uma teoria prevalente
em algumas correntes evangélicas, particularmente as neopentecostais,
prega que a criação do Estado de Israel foi o prenúncio da volta de
Jesus Cristo, que se daria após um período de grande turbulência e da
conversão dos judeus ao cristianismo.
Uma mãe de santo teve de deixar às pressas seu
terreiro, para não mais voltar, após ameaças dos criminosos. Na foto, um
local de culto destruído a mando dos bandidos. Foto: Reprodução
O símbolo do Estado judeu é
onipresente. Dentro da favela, a bandeira aparece num muro. Uma foto,
ostentada nas redes sociais, mostra 14 fuzis enfileirados pelos
criminosos com a imagem ao fundo. A estrela de Davi também enfeita a
camisa de um time de futebol de Vigário Geral, financiado pelo
traficante. No Parque Paulista, o baile funk realizado todo sábado
passou a ser chamado de Baile de Israel. A festa — anunciada na internet
com bandeirinhas da nação judaica — começa com músicas gospel, tocadas
ainda no início da noite. Depois, a vodca é liberada por toda a
madrugada.
A obsessão de Peixão pela fé judaica já foi
testemunhada durante uma operação da Polícia Civil em um de seus
domínios, Parada de Lucas. Num esconderijo subterrâneo usado pelo
traficante para se esconder durante incursões policiais, agentes da
Delegacia de Roubos e Furtos de Cargas (DRFC) encontraram — além de
munição para uma metralhadora antiaérea e coletes balísticos — um
exemplar de luxo da Torá , o livro sagrado do judaísmo. A obra estava acondicionada em um receptáculo de metal, parecido com um baú.
Um dos desenhos mais recentes feitos nos muros de
Vigário Geral, grafitados com salmos e frases religiosas, traz a
inscrição “12 anos, até aqui nos ajudou o Senhor”, em referência ao
tempo que o grupo domina a comunidade. Sempre que uma nova favela é
controlada pela facção, a primeira providência é escrever a frase “Jesus
é o dono do lugar”. Na vizinha Cidade Alta, tomada há três anos, logo
circulou um aviso, colocado nas portas dos moradores da comunidade: “Não
sujar, esculachar nem ficar fazendo essas macumbadas, servindo a deuses
estranhos, pois vocês nunca poderão esquecer que a gente só colhe do
fruto que planta”. Junto, veio uma explicação “divina”: “Só estamos na
luta porque foi ordenação do senhor Jesus que a comunidade da Cidade
Alta se liberte desse mal e viva dias melhores”, diz a carta. De lá para
cá, barracões foram depredados e mães de santo foram expulsas da
favela. Atualmente, não há mais terreiros de candomblé na região.
Foto: Leo Martins / Agência O Globo
Até meados dos anos 2000, o
Parque Paulista era um bairro predominantemente rural. O acesso ao local
se dava somente por uma estrada de terra que saía da Rodovia Rio-Magé.
Devido ao isolamento, à tranquilidade e ao contato com a natureza, a
região era um ponto muito procurado por candomblecistas para cultuar os
orixás. Segundo moradores, desde a década de 1970, seis terreiros foram
abertos ali numa área de poucos quarteirões. Em finais de semana de
festas importantes, milhares de filhos de santo iam ao local. Era comum
ver pessoas com roupas brancas dos pés à cabeça circulando por ali.
A partir de 2010, a paisagem começou a se modificar.
Dois condomínios do programa Minha Casa Minha Vida foram inaugurados no
bairro para abrigar moradores de áreas de Duque de Caxias ameaçadas de
deslizamento. Junto, chegaram também comércios, serviços e até o
asfalto: em 2014, as obras da principal via do bairro foram concluídas.
A favela de Vigário Geral, quartel-general da facção que persegue religiões africanas. Foto: Pablo Jacob / Agência O Globo
O progresso atraiu também o
tráfico de drogas. Moradores mais antigos contam que homens armados com
pistolas passaram a circular pelas ruas vendendo pequenas quantidades de
droga. A opressão do crime chegou, mas a vida dos religiosos de matriz
africana seguiu imperturbada. “Nós conhecíamos as famílias dos
traficantes, muitas deles cresceram ali, nunca havia tido caso nenhum,
nem sequer de xingamento”, contou um religioso que mora na região.
A situação mudou em 2016, quando o local, até então
sob a influência da maior facção do estado, foi tomada pelo outro grupo
criminoso. A tomada das bocas de fumo foi seguida pela expansão do
domínio do território e pela imposição das novas leis. Mas foi neste ano
que a intolerância se acentuou. O primeiro aviso do tráfico aos pais e
filhos de santo chegou de bicicleta, logo no início de 2019. Um
traficante, desarmado, passou pelos barracões comunicando as
determinações da “nova gestão”. A partir daquele momento, o uso de
roupas brancas — vestimenta dos candomblecistas para cultuar os orixás —
pelas ruas da favela estava proibido. Se quisessem continuar a usar a
indumentária, os frequentadores teriam de se trocar após a entrada nos
barracões. O toque dos atabaques só seria tolerado até as 20 horas,
mesmo nos finais de semana. Os avisos foram somente o prelúdio do que
estava por vir.
“A relação bizarra entre o tráfico e a religião evangélica começou com a conversão de um traficante no início dos anos 2000”
Em maio, três adolescentes armados com pistolas
bateram num dos terreiros na região em meio a uma festa. A casa estava
cheia. “Ninguém quer mais macumba aqui. Tem uma semana para acabar com
isso tudo!”, disse um dos jovens, segundo uma testemunha. Os três saíram
dali dando tiros para o alto. No mesmo dia, o barracão fechou as
portas. O pai de santo, que morava numa casa anexa, seguiu vivendo no
local, mas não há mais nenhuma atividade religiosa no lugar. “Orientei
os membros a deixarem de vir para consultas ou jogo de búzios, não havia
mais condição. Tirei todos os objetos sagrados e roupas de lá. Passei a
frequentar outro terreiro, num lugar seguro, como um refugiado”, contou
o sacerdote.
Atualmente, todos os seis terreiros do Parque
Paulista estão fechados por determinação do tráfico. Quinze igrejas
evangélicas funcionam no bairro — 11 delas são da Assembleia de Deus.
Fernandinho Guarabu
A relação bizarra entre o
tráfico e a religião evangélica no Rio começou no início dos anos 2000,
com a conversão de Fernando Gomes Freitas, o Fernandinho Guarabu,
influenciado por um pastor local. Então chefe do tráfico em uma favela
na Ilha do Governador, na Zona Norte do Rio, tornou-se evangélico
fervoroso, tatuou “Jesus Cristo” no braço e passou a dedicar um dia por
semana ao jejum e à oração. Durante quase 20 anos, foi o maior chefe da
facção fora da cadeia, até ser morto em uma operação policial, em junho
deste ano. Tanto Peixão quanto Noventinha, e centenas de outros, são
discípulos diretos de Guarabu.
Pastores e líderes evangélicos ouvidos por ÉPOCA são
unânimes em apontar a incompatibilidade entre a fé evangélica e o
tráfico de drogas. Neil Barreto, da Igreja Batista Betânia, afirmou que
esses criminosos não podem ser considerados religiosos: “Eles ouvem a
palavra de Jesus, simpatizam com ela, mas não a praticam. Ela é só um
discurso, não uma prática. Esse uso da religião, como símbolo de
destruição, é perverso”.
A dinâmica de crescimento desse exército da fé e do
pó está condicionada a causas muito terrenas, como a luta com outras
facções pelo território das favelas do Rio e um combate eficiente das
forças de segurança ao narcoterrorismo, seja ele laico ou com notas
religiosas. Enquanto isso, às vítimas, resta rezar, seja para que Deus
for.