October 10, 2019

Pede o Boné, Guedes









“Enquanto o Ministério da Economia busca medidas para evitar uma paralisia da máquina pública por falta de recursos, propostas em debate no Congresso têm potencial para estrangular ainda mais o Orçamento. Embora seja considerado mais austero do que a formação do último mandato, o atual Congresso vem trabalhando em iniciativas que ampliam os gastos da União em um momento de forte aperto fiscal. Em discussão, estão medidas que beneficiam parlamentares e partidos políticos, perdoam dívidas de produtores ruais e ampliam o poder do Congresso na gestão do Orçamento. Há também proposta que multiplica os gastos da União com educação básica, mas sem o aval do governo.” [Folha]

Pauta-bomba pra acabar de foder com a Gilma? Tava lindo, todo mundo apoiou. Agora toma, seus trouxas do caralho!
“Para o ano que vem, a equipe econômica estima que, após pagar todas as despesas obrigatórias como salários e aposentadorias, restarão R$ 89,2 bilhões para as chamadas despesas discricionárias, que incluem investimentos em infraestrutura, custeio da máquina pública e pagamento de bolsas de estudos. O valor, que corresponde a 6% de todo o Orçamento, está no patamar mínimo histórico. Na avaliação de técnicos do governo, o montante não é suficiente para o ano e pode levar à paralisia de serviços. Em meio a esse cenário, parlamentares articulam multiplicar por quatro a participação da União no financiamento da educação básica.”

Ontem eu noticiei aqui que o governo teve que descobrir pelos jornais o aumento do FUNDEB. Ministério da Educação pra esse pessoal se resume ao Escola Sem Partido, e a principal discussão foi solenemente ignorada, pra delírio da oposição.

“Relatório final sobre a renovação do Fundeb prevê que a complementação federal ao fundo passe de 10% para 40%. O governo defende que o aumento vá apenas para 15%. Pelos cálculos do Ministério da Economia, a mudança deve gerar um impacto de R$ 855 bilhões aos cofres federais em dez anos. Deputados também negociam a criação de um programa de refinanciamento de dívidas de produtores com o Funrural (Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural) que somam R$ 11 bilhões.”
Veta, Bolsonaro, os ruralistas vão adorar!
“Em outra frente, o Congresso aprovou proposta que engessa ainda mais Orçamento. A medida tornou impositivo o pagamento de emendas de bancadas partidárias, algo que era previsto apenas para as emendas individuais assinadas pelos parlamentares.”

Ainda rola um vazio jurídico, tá todo mundo perdido:

“O consultor de Orçamento do Senado Vinícius Amaral diz que 19 anos após a implementação da LRF (Lei de Responsabilidade Fiscal), as regras ainda não estão maturadas, o que dificulta a aplicação. A legislação define, por exemplo, que toda medida que cria novas despesas deve trazer sua fonte de custeio, alguma compensação. Isso pode ser feito com corte de gastos ou com aumento de receitas, como criação de tributos e aumento de alíquotas.
O que acontece se a lei for aprovada sem o atendimento desses dispositivos? Durante muito tempo, se dizia que o presidente da República teria que vetar. Se não vetar, tem penalidade? E se vetar, mas o Congresso derrubar o veto, existe penalidade para o Congresso? Isso nunca foi pacificado”, disse. O consultor afirma que uma decisão do TCU (Tribunal de Contas da União) neste ano traz algum direcionamento. No entendimento recente da Corte, lei aprovadas sem cumprir exigências da LRF passam a não ter eficácia. Ainda assim, segundo ele, restam dúvidas sobre quem será responsável por fazer essa avaliação.”

Imagine o Guedes lendo o que vai abaixo:

“Cresce no empresariado, principalmente em São Paulo, a insatisfação com a falta de rumo do Ministério da Economia. Que ninguém me entenda mal: o titular da pasta, Paulo Guedes, continua sendo o fiador do governo junto aos investidores e seria um caos no mercado financeiro se ele resolvesse sair. É o setor produtivo que está incomodado com os frequentes balões de ensaio vazados pelos assessores do ministro –o mais recente foi o congelamento do salário mínimo, já desmentido– e com a indefinição sobre a proposta do governo para a reforma tributária.
O motivo é bem simples: falta de confiança. Sem uma definição do Poder Executivo sobre uma área tão vital quanto tributação, as empresas não investem, não contratam e a economia continua exatamente como está –ou seja, parada. A reforma tributária idealizada por Guedes tinha um tripé: criação do IVA, redução do imposto de renda da pessoa jurídica com taxação de dividendos, e desoneração da folha de pagamento. O problema é que esta última perna teria que seria financiada pela criação da CPMF, que não vingou.
O tripé, portanto, está quebrado, o que deixou o ministério da Economia perdido na reforma tributária. A despeito da ineficácia da desoneração da folha em tempos de crescimento baixo, discutida neste espaço na semana passada, Guedes cismou com a medida, porque acredita que poderia gerar empregos. Sua insistência em uma política econômica que foi testada e reprovada pelo governo Dilma gera estranhamento. O ministro não parece ser do tipo que padece (embora devesse) ao pensar nos cerca de 13 milhões de desempregados do Brasil. É um liberal convicto, que prefere crescimento sustentado a um voo de galinha.” [Folha]

E tome pressão de um desesperado Bolsonaro pra cima do Guedes:

“A questão é que Guedes está sob intensa pressão da ala política do governo por causa do crescimento que não vem. As eleições presidenciais de 2022 já são publicamente discutidas, inclusive por Jair Bolsonaro (PSL) que admitiu ser candidato à reeleição. Só que a popularidade do presidente está em queda, em parte, porque –bingo– a economia não reage. Interlocutores do setor privado ouvidos pela coluna acreditam que Guedes está metendo os pés pelas mãos. Ansioso para o PIB decolar, ele bate cabeça na reforma tributária e dissemina desconfiança, o que prejudica o crescimento. Para esses empresários, seria melhor que o ministro abraçasse a proposta de reforma tributária que está na Câmara. Se passar, a criação de um IVA seria um enorme avanço na legislação brasileira. O restante ficaria para uma segunda etapa. Mas será que Guedes abrirá mão, novamente, do protagonismo na área econômica em prol do Congresso?”

O governo tá completamente perdido com o teto de gastos, sem saber pra onde correr:

“Com as contas públicas no vermelho há cinco anos e um rombo de 139 bilhões estimado para 2019, a equipe econômica do Governo Jair Bolsonaro apontou, no início desta semana, a possibilidade de propor um remédio amargo à população: retirar da Constituição a obrigatoriedade de que o salário mínimo seja reajustado pela inflação. Em outras palavras, a polêmica ideia —da qual o Governo acabou recuando nesta quinta—era congelar o valor do piso nacional durante os períodos de aperto fiscal para diminuir as despesas obrigatórias e, assim, não furar o teto de gastos, que, desde 2016, limita o aumento de custos e não permite que eles subam acima da inflação. A intenção inicial era de que a medida fosse incorporada à Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 438, que altera regras das despesas públicas e já tramita no Congresso. A mudança, segundo especialistas ouvidos pelo EL PAÍS, poderia diminuir o poder de consumo das classes mais baixas e ampliar a desigualdade no Brasil.
Entre 1997 e 2017, o salário mínimo teve um avanço real de 166,7%. E esta variação é apontada por pesquisadores como um dos fatores responsáveis pela queda da pobreza no país nas últimas décadas e visto como de extrema importância para a melhoria da qualidade de vida dos brasileiros. “Vários estudiosos mostram que a política de valorização do salário foi um importante mecanismo para reduzir a desigualdade. Se a remuneração tivesse seguido nesses anos todos apenas pela inflação, o salário seria hoje de 573 reais e não de 998 reais”, explica o economista Thales Nogueira, pesquisador da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas). Os 425 reais a mais trouxeram consequências altas nas contas públicas, mas, ao mesmo tempo, proporcionaram uma transferência de renda grande aos mais pobres e um poder de compra que, segundo Nogueira, são efeitos que não podem ser desprezados em momentos de crise econômica, como o que atravessamos nestes últimos anos.” [El País]

Mas como esse governo não é lá muito fã de estudos e do rigor científico…

“”O Governo precisa se perguntar o quanto valeria essa economia fiscal comparada as perdas distributivas de geração de renda. Mudando essa regra, haverá distorções econômicas, diminuindo ainda mais a renda que já está em queda nas classes mais pobres desde 2014. Vínhamos apresentando uma queda nos números de desigualdade e, após a crise, ela começa a aumentar. É preciso fazer escolhas”, explica Nogueira. Um estudo do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas revela que depois da recessão (2015-2016), os brasileiros mais pobres amargam uma queda de mais de 20% da renda de trabalho acumulada, enquanto o estrato mais rico somou um aumento de 3,3% de renda. Na avaliação de Clemente Ganz Lúcio, diretor técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), retirar a garantia de reajustar o salário mínimo com a inflação significa remover uma proteção aos mais pobres. “Por um problema fiscal, estão querendo um arrocho salarial que afeta o lado mais fraco. Claro que o problema fiscal existe, mas, em grande medida, porque a economia está travada. É necessário destravá-la e não retirar, ainda mais, o poder de consumo da população”, afirma.
Para Nogueira, preservar ou não o aumento nominal do salário não deveria estar na pauta. “Deveria ser regra de ouro. Em um momento de crise, pelo menos a inflação tem que ser mantida para garantir o poder de compra. A posteriori talvez seja necessário pensar em uma nova fórmula, como vincular o crescimento [do salário mínimo] ao PIB per capita que está mais vinculado à produtividade”, diz. De acordo com o pesquisador, a medida afeta tanto trabalhadores registrados como os informais, que hoje já representam cerca de 40% do mercado, já que o mínimo serve de base também para as ofertas dos trabalhadores que não possuem carteira assinada. Ao reduzir o salário, o Governo também pode colher efeitos na arrecadação. “Hoje, a cada real a menos do mínimo o Governo deixa de receber 54 centavos em tributo. Então você pode até economizar de um lado, mas há perdas do outro também”, diz. O pesquisador da PUC ressalta ainda que é emblemático que, na mesma semana em que se debateu uma possível mudança na regra de reajuste do salário, também haja uma discussão sobre um novo Refis para os ruralistas. “Essa renegociação das dívidas [dos produtores rurais] geraria um custo de 11,7 bilhões de reais”, explica.
Vilma Pinto, pesquisadora da área de Economia Aplicada do FGV IBRE, concorda que a proposta aventada pelo Governo visa puramente  resolver a delicada situação fiscal do país e exclui as consequências que podem ser geradas no mercado de trabalho. “Primeiro, o Governo tentou desvincular o salário da reforma da Previdência e não conseguiu, por isso agora tenta novamente. É uma medida emergencial, que não acredito que seja viável sem levar os impactos no mercado de trabalho com essa perda real dos rendimentos”, diz.”

E 2020 há de ser MUITO pior – o texto é do Vinícius Torres Freire:

“Depois da reforma da Previdência, o governo não apresentou nenhum projeto ou plano econômico substantivo com começo, meio, fim e calendário de implementação. Há “estudos” e promessas para “breve”. Em breve, acaba o ano político e virão as eleições de 2020. Discutir e aprovar projetos durante campanhas é difícil mesmo para governos normais, que não se desmoralizam e explodem pontes a cada semana. Por ora, há apenas planos de vento ideológico, “grandes ideias”, que enchem balões de ensaio. O bexigão da reforma tributária do governo acaba de explodir, por causa da mais recente morte (sic) da CPMF. Quando Jair Bolsonaro balançou o teto, seus economistas fizeram juras de fidelidade ao limite de gastos e prometeram pilares novos para sustentar essa obra em progresso e em ruínas.
Em vez disso, mais balões. Ficou no ar a ideia vaga do fim do reajuste do salário mínimo, das aposentadorias e doutros benefícios. Ainda resiste, sabe-se lá até quando, o plano de conter despesas com funcionários públicos. O congelamento do salário mínimo, politicamente inviável, morreu em dias. Outro devaneio, o fim do gasto mínimo obrigatório em saúde e educação, pode pegar o mesmo caminho da cova. Além de impopular, não faz parte de um conjunto organizado de medidas que possam ser negociadas em um “toma lá, dá cá” legítimo de compensações sociais e acordos políticos. No vai ou racha, método bolsonarista de governo, não passa mesmo.
Na Câmara, há um projeto de emenda constitucional que pretende facilitar medidas emergenciais de cortes de despesas com servidores, principalmente. Está meio atolado em parte porque o governo não mandou ninguém lá para ajudar a empurrar essa carroça, que irá para o brejo se não andar até 2020, ano de eleição. Há queixas sobre o programa mirrado e lento de privatizações. Nem de longe é o maior problema. Mais importante, não há planos para facilitar o investimento privado em obras, para as quais não há dinheiro público. É uma desgraça para o crescimento de curto, médio e longo prazo. A reforma da Previdência passou como quis o Congresso, que largou na estrada uma ideia cara e fixa de Paulo Guedes, a capitalização. A reforma tributária, muitíssimo mais complicada e que envolve o interesse de gente muito mais poderosa, não conta nem com uma força-tarefa e um plano de voo do governo, como havia na previdenciária, mal e mal.
Não é possível aprovar assim uma mudança tributária, dados os problemas técnicos, políticos e fiscais envolvidos. Não é possível mexer no cadeado e no cofre do governo sem auxílio do próprio governo —a não ser que deixem explodir ou levar o cofre. Agora mesmo, os estados estão com um projeto de reforma que quebra as contas federais. Faltam menos de três meses para o fim do ano político. Em nove meses, o país estará tomado pelas eleições municipais. A aprovação de projetos controversos é encrenca ainda maior durante campanhas. Não será mais fácil para um governo que até agora não tem organização política ou administrativa para elaborar e aprovar projetos. Quando muito, se vale de um arranjo de interesse de lideranças parlamentares, que toca o barco praticamente como quer. Em suma, há sinais de desgoverno em assuntos vitais: como o governo vai pagar as contas no médio prazo (no mais tardar, 2021) e financiar investimentos a fim de evitar ruína crescente na infraestrutura e lerdeza ainda maior no crescimento.” [Folha]

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