Pedro Doria
Se no tempo analógico censurar era proibir a publicação, no digital é impossível proibir. Gera-se, pois, confusão
Ao
longo do último sábado, algumas das administradoras do grupo de
Facebook Mulheres Contra Bolsonaro começaram a receber ameaças anônimas
pelas redes. Coisas intimidatórias mesmo. Quando a noite chegou,
perderam o controle do ambiente. Um ou mais simpatizantes do ex-capitão
assumiram a administração do grupo, mudaram seu nome, passaram a
publicar material de campanha. Ao fim, o Facebook bloqueou acesso para
todo mundo. Parece só mais uma história, um detalhe dentre muitos os que
marcaram a campanha presidencial de 2018. Só que é mais do que isso. É
incrivelmente revelador.
Há coisa de um mês, Tim
Wu publicou um ensaio no site da Universidade de Columbia, em Nova York,
sugerindo que é preciso repensar a ideia de liberdade de expressão. Wu,
que dá aulas na Escola de Direito, é um dos maiores especialistas
americanos no encontro entre o digital e a sociedade. E, no estudo de
governos totalitários, ele vem percebendo uma mudança de comportamento.
A
China, por exemplo, não tira mais do ar aqueles comentários publicados
online dos quais o governo não gosta. Tirar do ar faria com que a
informação se multiplicasse, republicada por toda parte. A Rússia também
não. Ou a Turquia. As táticas de cada país para lidar com censura
variam um pouco mas têm o mesmo objetivo. Publica-se, por exemplo,
informações falsas sobre o mesmo tema, em postagens sequenciais ou
comentários, que geram confusão. Quem está certo?
Daí,
gente paga ou voluntários ameaçam dissidentes. Editam fotos dos filhos e
os põem em situações cruéis, tornam públicos endereços. Intimidam ao
ponto de a pessoa ter medo de seguir escrevendo. Achar que não vale o
esforço. Quebram a segurança de contas pessoais nas redes. E, claro,
lançam armadas de trolls, em geral jovens rapazes violentos no ambiente
digital, que maciçamente atacam por toda parte.
Se
no tempo analógico censurar era proibir a publicação, no digital é
impossível proibir. Gera-se, pois, confusão. As pessoas se distraem
fácil e logo mudam de assunto. Ou, então, se intimida quem publica algo
que não interessa com agressividade. A maioria logo pensa: vale a pena
escrever sobre isso se o mundo vai me atacar na sequência?
Se
não dá mais para entrar no grupo das mulheres contra o fulano, a
indignação dura meia hora e logo uma foto no Instagram merece um
coração, alguém chama no WhatsApp, está na hora do dentista. Um grupo se
reuniu politicamente por uma causa, a armada de trolls atacou. A
reunião se desfez.
Se a gente não tinha nome para isso, agora tem: é censura.
Nada que espante partindo de uma chapa em que tortura, golpes e ditadura fazem parte do vocabulário corriqueiro.
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