A escolha do filósofo Ricardo Vélez Rodríguez para chefiar o Ministério da Educação assusta mais que a do diplomata trumpista Ernesto Araújo para o Itamaraty. Ambos foram indicador pelo guru intelectual da direita, o também filósofo Olavo de Carvalho. Ambos foram escolhidos por suas convicções ideológicas e não pela experiência ou pela capacidade técnica ou operacional em suas áreas, acentuando o aparelhamento ideológico do Estado de que o PT era acusado.
Velez também é um direitista fundamentalista, antiglobalista, antipetista ardoroso, defensor da ditadura e dos valores morais tradicionais. Mas, diferentemente de Araújo, vai dirigir a política interna mais crucial para o desenvolvimento nacional e com a mais poderosa influência sobre a formação da mentalidade brasileira.
Seus escritos sugerem que ele está muito mais preocupado com a moralidade e a doutrinação, em nome de uma suposta desideologização do ensino, do que com a qualidade da educação. E que, à frente do MEC, ele será uma espécie de bedel nacional, encarregado de fazer valer os compromissos de Bolsonaro com os setores mais reacionários e conservadores que apoiaram sua eleição.
Uma das propostas mais assustadoras que ele defende em seu blog “Rocinante” é a da criação de Conselhos de Ética. “Todas as escolas deveriam ter os Conselhos de Ética, que zelassem pela reta educação moral dos alunos. Não se trata de comitês de moralismo, nem de juntas de censura. Trata-se de institucionalizar a reflexão sobre matérias éticas e acerca da forma com que cada escola está correspondendo a essa exigência.” Mas quem definirá o que seja a “reta educação moral” dos alunos? O MEC, que sob seu comando pode tornar-se perigoso aparelho do Estado bolsonarista. Depois reclamam dos que apontam as afinidades do novo regime com o fascismo.
A bênção da bancada evangélica a Vélez, depois do veto à escolha do respeitado educador Mozart Ramos para o MEC, informa que o ensino público laico, pautado pela atitude crítica diante do conhecimento, está ameaçado.
No blog do futuro ministro sobram ataques ideológicos – a Lula, ao PT, ao Mais Médicos, à esquerda em geral – e faltam menções ao problema central da educação no Brasil, que é a melhora da qualidade. Apesar da polarização política entre PSDB e PT, desde os anos 90 há um consenso entre os dois partidos e as demais forças políticas sobre a centralidade da educação para o desenvolvimento nacional.
Sob FHC, na gestão do ministro Paulo Renato, foi criado o Fundeb, que garantiu mais recursos e a melhor distribuição deles entre os entes da federação. Nos governos petistas, na gestão de Fernando Haddad, principalmente, foram criadas dezenas de novas universidades públicas e centenas de escolas técnicas, o Enem e os programas de democratização ao ensino superior, como o Prouni e o novo Fies. O ensino infantil começou a ser implantado. Em 2014, sob Dilma, o Congresso aprovou o Plano Nacional de Educação, com 20 metas para os dez anos seguintes. Não foi tirado do bolso do colete petista. Sua elaboração foi objeto de amplo debate público, envolveu os estados, os municípios, as empresas e os profissionais do setor na produção do diagnóstico e das propostas para os diferentes níveis de ensino. Em 2017, sob Temer, na gestão de Mendonça Filho, foi concluída a aprovação da Base Nacional Comum Curricular e aprovada a reforma do ensino médio. Há uma linha de continuidade neste esforço, que agora corre o risco de ser interrompida, com a mudança de foco e de prioridades.
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