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May 7, 2018
No Edifício Prestes Maia, burocracia impede reformas na 2ª maior ocupação da América Latina
por Silvia Amorim
Símbolo do movimento por moradia no Centro de São Paulo, a ocupação
Prestes Maia, segunda maior da América Latina, é exemplo do descaso,
omissão e burocracia que colocam em situação de vulnerabilidade milhares
de famílias sem-teto. Localizado a apenas sete minutos de caminhada do prédio que desabou na terça-feira no Largo do Paissandu,
o imóvel foi desapropriado por R$ 23 milhões pela prefeitura de São
Paulo em 2015 para virar habitação popular. Até agora, no entanto, não
há sinal da reforma que transformaria o espigão condenado em 283
moradias seguras.
A mais recente chance de conseguir um financiamento do governo
federal para a tão esperada obra, estimada em R$ 38,5 milhões, foi
perdida no início deste ano. O projeto de revitalização não foi
selecionado em fevereiro pela Caixa Econômica Federal para ser incluído
no Minha Casa Minha Vida Entidades. Não se sabe quando haverá nova
seleção.
Enquanto isso, o que serve de abrigo para cerca de 400 famílias hoje
são as ruínas de um prédio de 21 andares. O edifício já foi uma grande
fábrica de tecido nos anos 1960 mas, após duas décadas de invasões, não
esconde seu esgotamento nas paredes rachadas, nos emaranhados de fios da
rede elétrica improvisada, nas janelas sem vidro e nos “apartamentos”
montados com tapumes de madeira. Até 15 famílias vivem em cada andar e
são responsáveis pela limpeza e a ordem.
Em vistoria de 2015, os bombeiros concluíram o óbvio: aquela era uma
edificação de risco. Algumas providências foram adotadas para mitigar a
ameaça, como a instalação de extintores e de uma mangueira que desce
pelas escadarias do edifício, do teto ao térreo, para caso de incêndio.
Mas a tragédia no Largo do Paissandu reacendeu o medo de uma
desocupação. A prefeitura anunciou um mutirão de vistoria de prédios
invadidos e prometeu interditar os que não tiverem condições mínimas de
segurança.
A ocupação do Prestes Maia, segundo o Centro Gaspar Garcia de
Direitos Humanos, só perde em tamanho na América Latina para a Torre de
David, uma ocupação vertical de 45 andares em Caracas, na Venezuela.
RISCO DE DESPEJO
Outra má notícia que está por
bater à porta da ocupação vem da Justiça. É esperado que o juiz
responsável pela desapropriação determine em até um mês a desocupação do
prédio. A exigência é para entregar à prefeitura o termo de posse. Sem o
imóvel vazio, o documento não pode ser emitido. E sem o papel, não é
possível obter financiamento para a reforma.
— Estamos numa sinuca. Se nosso projeto de reforma tivesse sido
selecionado pelo governo federal, a Caixa só iria aceitar dar o
empréstimo com o prédio vazio — explica o arquiteto responsável pela
revitalização do Prestes Maia, Waldir Ribeiro.
APÓS DESASTRE, REPAROS URGENTES
As famílias
dizem não ter para onde ir e reivindicam aluguel social da prefeitura
até receberem as chaves dos apartamentos no Prestes Maia. O governo
municipal alega que não pode dar o auxílio porque elas estão cadastradas
em outro programa, o Minha Casa Minha Vida.
— Ninguém mais do que as famílias quer que as coisas avancem e a
reforma seja feita, mas elas vão para onde? Qual a alternativa que o
poder público tem a oferecer? — cobra Ivanete de Araújo, coordenadora do
Movimento de Moradia da Luta por Justiça.
Entre as famílias apinhadas em cubículos de madeira ao custo de R$ 105 por mês, e com direito a um único banheiro por andar, o assunto nos corredores do Prestes Maia nos últimos dias era a tragédia no Largo do Paissandu. Moradores correram para a porta do prédio na madrugada do incêndio para ajudar conhecidos. Outros, como Luís Santos Costa, de 51 anos, convenceram seus vizinhos do 21º andar a trocar todas as divisórias de madeirite dos “apês” por placas de drywall, mais resistentes a incêndio. Ele lembra como conseguiu o cômodo
.
— Eu implorei chorando por um canto e me deram o último andar, que estava vazio porque era uma goteira só.— diz Costa.
Já a equipe de manutenção da ocupação, formada por moradores, estava às voltas com alguns reparos na sexta-feira, se preparando para a inspeção da prefeitura. Extintores vencidos foram retirados do prédio e a fiação elétrica descascada e velha era substituída por cabos novos em alguns andares.
Alguns andares abaixo, Vera Lúcia Maria dos Santos, de 64 anos,
começava a fazer o almoço no cômodo iluminado apenas por uma abertura de
60 centímetros na parede e cheio de fios pendurados. Há oito anos, a
idosa vive ali à espera da casa própria.
— Estou vendendo coisas na rua para ganhar um dinheirinho. Aqui está
tudo que eu tenho. Vocês querem um cafezinho? — ofereceu Vera à
reportagem, após resumir sua luta.
O arquiteto do Prestes Maia explica que a não seleção do projeto
ocorreu por questões burocráticas. A ONG que representa o projeto já
havia obtido o financiamento para a reforma de outro prédio ocupado e o
Prestes Maia extrapolaria a cota de moradias a que tem direito de
contratar pela Caixa. Waldir acredita que o desabamento no Paissandu
pressionará o governo federal a liberar recursos para reformas:
— Me parece que todas as partes serão obrigadas a chegar num entendimento. Precisou uma tragédia para as pessoas se mexerem.
O Ministério das Cidades e a Caixa foram procurados mas não se
manifestaram. A prefeitura informou que a única pendência é o
licenciamento do projeto de reforma, em análise.
O Prestes Maia é uma das oito desapropriações para moradia social
feitas pelo ex-prefeito Fernando Haddad (2013-2016). Sete aconteceram no
último ano de mandato. Até agora, nenhum imóvel conseguiu se
desembaraçar da burocracia nem viabilizar suas reformas.
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