March 14, 2021

Madrugadas, desconfianças, reviravoltas: os bastidores da decisão de Fachin e do terromoto no STF

 ­ Foto: Arte com fotos de Aílton de Freitas e Jorge William / Agência O Globo

Guilherme Amado

 

Edson Fachin, ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), estava em sua casa, em Brasília, na tarde da quinta-feira 4 de março, quando recebeu uma informação estratégica de uma pessoa de sua confiança: seu colega Gilmar Mendes pautaria na semana seguinte o habeas corpus que pedia a suspeição do ex-juiz Sergio Moro para julgar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Sempre sereno, com um monocórdico tom de voz, Fachin decidiu então levar à frente um plano que vinha cultivando em segredo havia algumas semanas. Telefonou para seu gabinete e deu a ordem: queria pronto, quanto antes, o despacho em resposta a um outro habeas corpus que a defesa de Lula apresentara a ele em 4 de novembro. A decisão, orientou Fachin, deveria reconhecer que a Justiça Federal no Paraná não tinha competência para julgar o ex-presidente, por não haver vínculo das investigações contra ele com a Petrobras. Portanto, os casos deveriam ser redistribuídos para a Justiça Federal em Brasília. Assim, seriam anulados todos os atos processuais de Curitiba contra o petista, que a partir de então teria suas condenações anuladas e seus direitos políticos devolvidos, podendo até voltar a disputar eleições.

Os principais nomes do gabinete de Fachin foram acionados imediatamente e convocados a trabalhar até no fim de semana, se necessário. E assim foi feito. Numa maratona que varou os dias e as noites de sexta-feira, sábado e domingo, o entorno do relator da Lava Jato no Supremo trabalhou na peça. A decisão só foi finalizada na segunda-feira 8, um pouco antes do horário do almoço. O ministro recebeu o documento final, fez poucas mudanças e publicou a decisão assim que terminou de almoçar. Começava ali uma tempestade.

O ex-presidente Lula permaneceu preso por 580 dias após ser condenado por Sergio Moro a nove anos e seis meses em regime fechado. Foto: Miguel Schincariol / AFP
O ex-presidente Lula permaneceu preso por 580 dias após ser condenado por Sergio Moro a nove anos e seis meses em regime fechado. Foto: Miguel Schincariol / AFP

A informação que chegara para Fachin sobre os planos de Gilmar Mendes estava errada. O ministro, que fazia meses havia pedido vista do habeas corpus sobre a suspeição de Moro, não pretendia pautar imediatamente o tema na Segunda Turma do STF. No domingo 7, Mendes indicara numa conversa ao telefone que mantinha o plano de pautar neste semestre, mas não mais em março, como sinalizara antes. “Esse caso fica melhor a cada dia que passa”, analisou a um interlocutor. O ministro, crítico contumaz da “turma de Curitiba”, já decidira havia tempos que votaria contra Moro e a favor de Lula. À medida que as mensagens hackeadas dos procuradores da Lava Jato em Curitiba eram publicadas, só reforçava para ele a tese de que havia insumo suficiente para convencer os demais ministros da culpa do ex-juiz. “São crimes inequívocos”, respondeu ao saber que outros ministros do tribunal, Fachin e Luiz Fux, presidente do STF, entre eles, vinham criticando sua postura no caso. Os dois viam a posição de Mendes como revanchismo — a Lava Jato chegou a discutir um pedido de impeachment dele, e auditores fiscais ligados à operação o investigaram no âmbito da Receita.

Fachin tomou a decisão de sacrificar as condenações de Lula com o objetivo de defender a Lava Jato e por considerar que muitas das condenações obtidas pela força-tarefa de Curitiba haviam mudado o patamar do combate à corrupção no país. A mais importante das consequências de seu despacho, supunha ele, seria extinguir todas as outras medidas da defesa, como o habeas corpus que questionava a isenção de Moro. O relator da Lava Jato, a exemplo do presidente do STF, sabia que, uma vez que a Segunda Turma declarasse Moro parcial em relação a Lula, dezenas de outros réus — do PT, de outros partidos, do meio empresarial e até doleiros — pediriam revisões criminais de seus casos, sob a alegação de que também haviam sido vítimas da mesma perseguição jurídica. Um movimento que poderia levar à anulação total de mais de seis anos de investigação.

­ Foto: Ueslei Marcelino / Reuters
­ Foto: Ueslei Marcelino / Reuters

A vitória da tese da parcialidade de Moro já se avizinhava fazia tempo na Segunda Turma. Mendes já indicara que votaria nela, a exemplo do ministro Ricardo Lewandowski. Do recém-chegado ministro Kassio Nunes Marques, indicado no ano passado pelo presidente Jair Bolsonaro, Fachin também esperava um voto a favor da suspeição do ex-juiz. Até mesmo a ministra Cármen Lúcia, que em 2020 antecipara seu voto para acompanhar Fachin, vinha expressando reprovação ao conteúdo das mensagens trocadas entre Moro e procuradores da Lava Jato, indicando que possivelmente estivesse disposta a mudar sua posição. Fachin poderia perder de goleada e ver ser aberta a porta para o massacre da operação relatada por ele na Corte desde fevereiro de 2017, após a morte do ministro Teori Zavascki.

O ministro procurou no sábado alguns dos colegas de quem é mais próximo no Tribunal, integrantes do grupo que se formou para garantir as principais vitórias da Lava Jato no plenário do STF — Cármen Lúcia, Fux, Luís Roberto Barroso e Rosa Weber. A nenhum dos que procurou, entretanto, adiantou o que faria. Disse apenas que seria necessário mais do que nunca defender a operação. Na segunda-feira, quando canais de TV, portais de notícia e grupos de WhatsApp já discutiam as consequências da decisão tomada depois do almoço, alguns desses ministros se ressentiram por não terem sido comunicados. E consideraram arriscado o movimento de Fachin sem calcular um eventual revide. Ainda na noite do mesmo dia, Mendes decidiu que ignoraria a medida do relator da Lava Jato e pautou sumariamente o tema na Turma.

Mendes ficou irritado com Fachin, mas decidiu que não confrontaria o ministro, com que nunca teve um atrito público — coisa rara, tratando-se de Mendes. Na manhã seguinte, terça-feira, cumpriu a promessa e anunciou que a suspeição seria discutida na sessão da tarde.

“No Supremo Tribunal Federal, o clima tem sido amistoso entre os ministros, mas a disputa entre ‘punitivistas’ e ‘garantistas’ pode voltar a pegar fogo. Não está descartada a hipótese de que a decisão que beneficiou Lula seja revertida”

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De casa, Fachin tentou travar o movimento. Durante o almoço, telefonou para Fux. Pediu ajuda do presidente do Supremo para avocar o caso ao plenário devido ao impasse entre ele e Mendes: uma vez decidido que Curitiba não tinha competência para julgar Lula, estava ou não extinto o recurso que questionava a falta de isenção de Moro?

Fux foi lacônico. Disse a Fachin que a única medida seria suspender a sessão da tarde da Segunda Turma, o que ele não poderia fazer porque não havia previsão para isso no regimento da Corte. Orientou que o próprio procurasse o presidente da Segunda Turma. E Fux concluiu dizendo que, inevitavelmente, o caso deveria ser levado para a análise dos demais ministros para solucionar o impasse sobre quem estava com a razão.

Aquela eletrizante terça-feira, em que mais uma vez o STF concentrou as atenções do país, terminou com um inesperado pedido de vista de Nunes Marques, que alegou precisar de tempo para conhecer o caso, já que tinha podido dar pouca atenção à questão por estar envolvido com cuidados médicos com os pais, internados com Covid-19 no Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo. Lewandowski e Mendes destroçaram Moro. Mendes usou imagens fortes, como lhe é de costume, e apontou um “método soviético” na Lava Jato em Curitiba, no “maior escândalo judicial da história do Brasil”.

­ Foto: Ueslei Marcelino / Reuters
­ Foto: Ueslei Marcelino / Reuters

No dia seguinte, Fux passou a manhã conversando com outros ministros. Ouviu Barroso e Alexandre de Moraes. E a Fachin prometeu que o tema será levado ao plenário, mas considera mais prudente talvez deixar a Turma concluir o julgamento da suspeição de Moro. Depois, se os outros ministros derem razão a Fachin e decidirem que não caberia esse julgamento, o veredicto da Segunda Turma perderia validade e a Lava Jato estaria a salvo. “Penso que os problemas que estamos enfrentando refletem as tensões e polarizações do país. Não são, especificamente, problemas do Supremo. Porém, creio que minimizaríamos as dificuldades se toda decisão institucionalmente importante fosse imediatamente para o plenário, físico ou virtual. E a maioria decide se ela vale”, sugeriu Barroso, que tem procurado manter bom diálogo mesmo com antigos desafetos, como Mendes. Os dois voltaram a se falar recentemente e têm evitado polemizar.

O clima de suspense vai dominar as próximas semanas no STF. Até agora, os ministros têm sido fiéis ao acordo feito desde o começo do governo Bolsonaro, de interromper as brigas públicas em nome de preservar a unidade e fortalecer o tribunal ante os ataques do presidente. Mas a disputa entre punitivistas e garantistas pode fazer o caldo entornar. Especialmente se concretizar-se a previsão feita por Marco Aurélio Mello.

“Para Luiz Henrique Mandetta, ex-ministro da Saúde, a hora de lançar um candidato para 2022 é agora. ‘Os nomes terão de se definir. Não dá para esperar o fim do ano para decidir quem é capaz de unir o centro’”

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O decano, que se aposenta em julho e é conhecido por ser voz dissonante no STF, afirma que vê a possibilidade de ser revista a decisão de Fachin de anular os atos processuais de Curitiba. “A minha veia é inquebrantável de que o plenário vira essa decisão”, sentenciou, logo em seguida fazendo a ressalva: “Mas posso queimar a língua. É igual à máxima popular de antigamente, quando não havia ultrassonografia, de barriga de mulher, de pata de cavalo e de cabeça de juiz, pode-se esperar qualquer coisa”, disse Mello.

Lula estava em casa quando recebeu a ligação do ex-prefeito de Blumenau, o advogado e petista Décio Lima, um antigo amigo. Lima havia se cadastrado para receber notificações por e-mail a cada movimento em todos os processos de Lula e acabara de receber o aviso do STF sobre a nova decisão de Fachin. Lima leu o conteúdo da decisão a um atônito Lula, que chegou a pensar que era brincadeira. O ex-presidente desligou e telefonou imediatamente para Cristiano Zanin, seu advogado. Zanin, com voz que combinava felicidade com cautela, também estava surpreso e ainda lia as 46 páginas da decisão de Fachin, mas tudo indicava que o cerne da coisa era claro: Lula, além de livre, agora não era nem mesmo mais acusado de nenhum crime. O STF ainda não divulgara nada à imprensa. A primeira pessoa para quem Lula telefonou foi a deputada federal Gleisi Hoffmann (PT-PR), presidente do partido. “Parece que o Fachin anulou tudo! O Zanin está lendo o despacho”, contou.

Depois de Sergio Moro entrar na política como ministro de Bolsonaro, seus atos como juiz foram questionados. Foto: Andre Coelho / Getty Images
Depois de Sergio Moro entrar na política como ministro de Bolsonaro, seus atos como juiz foram questionados. Foto: Andre Coelho / Getty Images

Morando desde que saiu da prisão em São Bernardo do Campo com a namorada, a socióloga Rosângela da Silva, conhecida como Janja, Lula mantém o mesmo interesse de sempre pela política. Substituiu as conversas presenciais por reuniões no Zoom — o que é um desafio para ele, que, de tão pouco familiarizado com tecnologia, não tem celular nem nunca mexeu no WhatsApp. Nas últimas semanas, alguns desses interlocutores lhe repetiam o que ouviam de ministros do STF: sua condenação pelo tríplex do Guarujá seria anulada, porque Moro seria mesmo declarado suspeito. E, futuramente, a condenação pelo sítio de Atibaia também seria. Os dois casos de corrupção eram as duas condenações que impediam Lula de participar das eleições.

Mas, em meio à saraivada de telefonemas que passou a receber quando saiu a notícia da decisão de Fachin, manteve-se cabreiro. A expectativa pela anulação de suas condenações ou por vitórias judiciais já havia sido frustrada em diversos momentos nos últimos anos. “Ele aprendeu a não esperar nada. Estava muito cético, achava que não era aquilo mesmo”, contou uma amiga do ex-presidente, uma das primeiras a conversar com ele na segunda-feira. O primeiro a telefonar, depois que Lula desligou de Hoffmann, foi o presidente da Argentina, Alberto Fernández. Depois, Lula ainda passaria um bom tempo ao telefone com a deputada federal Benedita da Silva (PT-RJ) e o senador Jaques Wagner (PT-BA). Emocionou-se ao falar com os três, bem como com a carta que recebeu do ex-presidente uruguaio Pepe Mujica e com a ligação do cantor Chico Buarque, na quarta-feira.

O ex-ministro Luiz Henrique Madetta é apontado como uma alternativa à polarização entre a esquerda e a direita. Foto: Pablo Jacob / Agência O Globo
O ex-ministro Luiz Henrique Madetta é apontado como uma alternativa à polarização entre a esquerda e a direita. Foto: Pablo Jacob / Agência O Globo

Para Lula, ficou claro no dia da decisão de Fachin que era fundamental, para o sucesso de sua estratégia política, que Moro seja declarado suspeito, de maneira que depois ele possa buscar a responsabilização do ex-juiz, civil e ou criminalmente. Mas já na segunda-feira, quando os assessores e ele começaram a trabalhar no discurso que acabaria fazendo só na quarta-feira 10, Lula decidiu que sua primeira fala deveria passar esperança ao povo que sofre com a pandemia e, num gesto para transmitir a imagem de humildade, colocar sua dor como algo menor diante dos milhares de mortes. Deveria ainda fazer o contraponto a Bolsonaro na questão sanitária e também na forma como se apresentaria, sem raiva ou ressentimento, em parte numa reedição do Lulinha Paz e Amor de 2002.

O discurso feito na sede do Sindicato dos Metalúrgicos em São Bernardo do Campo, São Paulo, teria um pouco de 2002, mas também um outro pouco dos ressentimentos que ele diz não ter mais. Chegou a levar o discurso impresso, mas, fiel a seu estilo, não leu nada e improvisou, só preservando o sentido geral da coisa. Elogiou a imprensa e depois voltou a atacá-la. Disse querer dialogar com empresários, num aceno ao mercado, mas logo depois enfatizou sua visão nacionalista da Petrobras. Apontou o que considera crimes da Lava Jato, mas ignorou os cometidos por alguns de seus correligionários e em seus governos.

No saldo geral, entretanto, mostrou-se equilibrado e muito distante de Jair Bolsonaro, seja na moderação, seja na questão sanitária. Defendeu a máscara, o isolamento, a vacina, mas também a escuta, o diálogo e o pragmatismo para fazer acordos, o que o ex-ministro e ex-prefeito Fernando Haddad afirma que será uma toada daqui até 2022.

Bolsonaro reagiu à decisão insinuando que ela foi tomada por uma suposta ligação de Fachin com o PT. Foto: Ueslei Marcelino / Reuters
Bolsonaro reagiu à decisão insinuando que ela foi tomada por uma suposta ligação de Fachin com o PT. Foto: Ueslei Marcelino / Reuters

“Lula está mais preocupado agora com sua absolvição do que com a candidatura”, analisou Jaques Wagner, referindo-se aos futuros julgamentos dos casos do ex-presidente agora pela Justiça Federal no Distrito Federal. Embora nem Lula fale abertamente que é candidato, petistas consideram que não há mais espaço para outro nome. Haddad e o governador da Bahia, Rui Costa, que vinham se colocando como opções do partido para o Planalto, têm convicção de que Lula quer e que não teme arriscar ser derrotado por Bolsonaro.

A sigla tem desafios para chegar lá. “O PT está com as estruturas internas totalmente desarticuladas, como o resultado da eleição de 2020 mostrou. Estamos fora dos territórios pobres, que hoje são dominados pelas igrejas evangélicas. O voluntarismo e o eleitoralismo não vão resolver”, criticou um integrante da Executiva Nacional do partido, sob a condição da reserva.

Bolsonaro viveu dois momentos ao longo da semana, com a notícia de que Lula está de volta ao jogo político e deve ser seu principal adversário em 2022. O presidente, eleito pelo antipetismo em 2018, comemorou na segunda-feira 8 a decisão de Fachin e, sem refletir muito, era sucinto ao responder a aliados que lhe perguntaram ao longo da tarde o que achara da decisão: “Ótimo para a gente”. Ainda assim, em público, num gesto para a militância, criticou Fachin, a quem acusou de ter tomado a decisão por seus vínculos com o PT no passado — o ministro chegou a pedir voto para Dilma Rousseff antes de chegar ao STF.

“Pressionado, Bolsonaro negocia uma possível volta ao PSL, mas teria de se submeter às decisões da cúpula partidária e vencer a resistência de ex-aliados como a deputada federal Joice Hasselmann (PSL-SP)”

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Mas, já naquele dia, à noite, Bolsonaro começou a rever sua decisão. A polarização poderia favorecê-lo — Bolsonaro acredita que o antipetismo ainda é maior que o antibolsonarismo —, mas sua reeleição pode agora não ser um passeio, como ele imaginava. Em fevereiro, o ministro da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos, chegou a dizer, após as vitórias de Rodrigo Pacheco (DEM-MG) na presidência do Senado e de Arthur Lira (PP-AL) no comando da Câmara, que não havia ninguém capaz de bater Bolsonaro no ano que vem. Agora, a um ministro de quem é bastante próximo, Bolsonaro avaliou que Lula é um adversário a sua altura. “Ele é um candidato que diminui minha chance de errar”, analisou. E já na terça-feira o ex-capitão arregaçou as mangas.

Telefonou para Antonio Rueda, vice-presidente nacional do PSL, partido pelo qual se elegeu e do qual saiu brigado em 2019, e disse abertamente estar interessado em retornar. Precisa do tempo de rádio e TV e dos recursos eleitorais a que a legenda tem direito, por ter eleito em 2018 a segunda maior bancada da Câmara. Rueda vem conversando com Bolsonaro e com o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) há tempos e, desde o ano passado, tenta levar o presidente de volta à legenda. A negociação tem o aval de Luciano Bivar, presidente do PSL, que foi duramente atacado por Bolsonaro, mas há uma condição que é considerada inegociável pelo partido: Bolsonaro teria de topar voltar sem nenhuma ingerência na Executiva Nacional da sigla. Ou seja: teria de se submeter a todas as decisões da cúpula partidária, sem intervir.

A negociação, que vem sendo acompanhada ainda pelo deputado Major Vitor Hugo (PSL-GO), ex-líder do governo na Câmara, tem ainda dois entraves. Nomes como a deputada federal Joice Hasselmann (PSL-SP) e o senador Major Olimpio (PSL-SP) se opõem firmemente ao retorno de Bolsonaro. E mais: o presidente está com muita pressa para definir sua legenda para 2022. Sem tempo para negociar os pontos de sua volta ao PSL, a tendência é que ele tenha de optar logo por uma das siglas nanicas com quem conversa, como os inexpressivos Partido da Mulher Brasileira (PMB), Avante e Democracia Cristã (DC). Tudo indica que seu projeto de partido, o Aliança, não vai decolar. E para além da sopa de letrinhas partidária, há para Bolsonaro o maior desafio de todos, resumido com pertinência e realismo por um de seus ministros: “O maior adversário do presidente é ele mesmo”.

Eduardo Leite
Eduardo Leite

Luiz Henrique Mandetta segue confiante de que ainda há espaço para o centro em 2022. Respaldado pelo DEM, o ex-ministro da Saúde vem se preparando para ser o protagonista do partido na construção dos caminhos para o ano que vem. Prefere não ser chamado de pré-candidato, até porque está disposto a dialogar com outros partidos, mas já está estruturando uma equipe para assessorá-lo e vem intensificando as conversas rumo à eleição. “Bolsonaro e Lula são a mesma coisa. Querem a violência, a ruptura, a polarização. Agora, a unidade do centro se torna imperativa. Os nomes terão de se definir. Não dá para esperar o fim do ano para decidir quem é o nome capaz de unir o centro”, analisou.

Uns mais à esquerda, outros mais à direita, os nomes dispostos a construir candidatura de centro são, além de Mandetta e do apresentador de TV Luciano Huck, o ex-ministro e ex-governador Ciro Gomes, do PDT, Moro e os governadores de São Paulo, João Doria, e do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite. Na visão de Mandetta, esses seis nomes deveriam se unificar em torno de apenas um, o que impediria a fragmentação de votos no primeiro turno e fortaleceria a possibilidade de tirar Bolsonaro ou Lula do segundo turno. Mas a construção da terceira via, inédita na redemocratização, esbarra em alguns obstáculos.

“Não adianta quem diz que quer discutir apoio sentar à mesa para conversar sem a real disposição de, caso não seja o nome escolhido, apoiar quem for”, provocou Leite, num recado que pode servir a várias das opções em jogo, inclusive dentro de seu PSDB. E há ainda outro fator, que deverá ser levado em conta por Lula, Mandetta, Ciro, Doria, Leite, Moro, Huck e todos mais que tentarão impedir a reeleição de Bolsonaro. Serão eles capazes de, preteridos já no primeiro turno, apoiar explicitamente outro nome para derrotar o capitão? Está aí uma pergunta de resposta tão imprevisível quanto o lance de Fachin que detonou tudo isso.

Com Naomi Matsui

ÉPOCA

 


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