Leia aqui a versão deste artigo na íntegra (em ingles)
Johann Hari
O mundo não está apenas vendo o governo de Israel cometer um crime em Gaza; estamos assistindo a uma autoflagelação. Esta manhã, amanhã e a cada manhã até os bombardeios punitivos terminarem, os jovens da Faixa de Gaza estarão mais cheios de ódio e mais determinados a revidar, com pedras, vestes suicidas ou mesmo foguetes.
Os líderes israelenses se convenceram de que, quanto mais duro for o golpe contra os palestinos, mais mansos eles ficarão. Mas quando isso tudo acabar, a raiva contra os israelenses terá aumentado muito e os mesmos velhos compromissos estarão ainda esperando, à margem da História, sem encaminhamento.
Para entender o quão assustador é ser um cidadão de Gaza esta manhã, você precisaria estar nessa minúscula e claustrofóbica selva de pedra às margens do Mediterrâneo. Desempregados, famintos, eles vivem praticamente uns em cima dos outros. Quando as bombas começam a cair, não há para onde correr.
A guerra que se segue agora é sobre a história dessa guerra. O governo de Israel diz: “Nos retiramos de Gaza em 2005 e, em troca, temos o Hamas e os foguetes Qassam sendo lançados sobre nossas cidades. Dezesseis civis foram assassinados.
Quantos mais devemos sacrificar?” É uma narrativa plausível e há fragmentos de verdade nela. Mas está repleta de buracos.
O governo israelense realmente se retirou da Faixa de Gaza em 2005, mas para poder intensificar seu controle na Cisjordânia. O principal assessor de Ariel Sharon então, Dov Weisglass, não deixou dúvidas sobre este ponto.
Horrorizados com isso e com a corrupção de seus próprios líderes do Fatah, os palestinos votaram no Hamas. E o Hamas ofereceu a Israel um longo cessar-fogo e a aceitação da idéia dos dois estados, se Israel retornasse a suas fronteiras legais.
Em vez de aproveitar a oportunidade para testar a sinceridade do Hamas, o governo de Israel decidiu reagir punindo toda a população civil, ao bloquear completamente a região. Segundo a Oxfam, apenas 137 caminhões de comida entraram em Gaza no último mês para alimentar 1,5 milhão de pessoas. É hipócrita da parte de Israel falar agora em segurança de civis quando vem aterrorizando civis como política de estado.
Por que Israel age desta forma? O governo quer paz, mas apenas a imposta por seus próprios termos, baseada na aceitação da derrota pelos palestinos. Negociações são uma ameaça para essa visão: Israel teria que ceder mais do que quer. Mas uma paz imposta não é paz e não interromperá nem o ódio nem os foguetes. Será preciso conversar com as pessoas que sofrem o bloqueio, que estão sendo bombardeadas hoje e se comprometer com elas. Nas palavras do escritor israelense Larry Derfner, “a bola não está no campo do Hamas, mas sim no nosso”.