Kirsten Grind
Megan Twohey
The New York Times
Enquanto Elon Musk se tornava um dos aliados mais próximos de Donald Trump
no ano passado, liderando comícios agitados e doando cerca de US$ 275
milhões (mais de R$ 1,5 bilhão) para ajudá-lo a ganhar a Presidência dos
Estados Unidos, ele também passava a usar drogas de forma muito mais intensa do que se sabia anteriormente, segundo pessoas familiarizadas com sua vida pessoal.
O consumo de drogas do bilionário foi muito além do uso ocasional.
Ele disse a pessoas que estava tomando tanta cetamina, um anestésico
potente, que estava afetando sua bexiga, um efeito conhecido do uso
crônico. Ele também tomava Ecstasy e cogumelos psicodélicos, além de
viajar com uma caixa de medicação diária que continha cerca de 20
pílulas, incluindo algumas com as marcações do estimulante Adderall, de
acordo com uma foto da caixa e pessoas que a viram.
Não está claro se Musk, 53, estava usando drogas quando se
tornou presença constante na Casa Branca este ano e recebeu o poder de
reduzir a burocracia federal. Mas ele tem exibido um comportamento
errático, insultando membros do Gabinete, fazendo gestos nazistas e
confundindo suas respostas em uma entrevista.
Ao mesmo tempo, a vida familiar de Musk se tornou cada vez mais
tumultuada enquanto ele organizava relacionamentos românticos
sobrepostos e lidava com batalhas legais privadas envolvendo seu
crescente número de filhos, segundo documentos e entrevistas.
Na última quarta-feira (28), o empresário anunciou que estava
encerrando sua passagem pelo governo após lamentar quanto tempo havia
dedicado à política no lugar de seus negócios.
Musk e seu advogado não responderam aos pedidos de comentários desta
semana sobre seu uso de drogas e vida pessoal. Anteriormente, porém, ele
disse ter recebido a prescrição de tomar cetamina a cada duas semanas,
aproximadamente, para sua depressão. E disse ao seu biógrafo: "Eu
realmente não gosto de usar drogas ilegais".
A Casa Branca não respondeu se havia pedido a Musk para fazer testes
de drogas. Como grande contratante do governo, a empresa aeroespacial do
bilionário, a SpaceX,
deve garantir que sua força de trabalho não use drogas, e por isso
administra testes aleatórios em seus funcionários. Musk, no entanto,
recebeu avisos antecipados dos testes, segundo pessoas próximas ao
processo. A companhia não respondeu a perguntas sobre esses avisos.
Após a publicação da reportagem, porém, o vice-chefe de
gabinete da Casa Branca, Stephen Miller, foi questionado sobre o
assunto, mas se esquivou da pergunta. Ele disse a jornalistas que as
drogas com as quais estão preocupados são "as que atravessam a fronteira
sul", ou seja, com o México.
O bilionário, que se juntou ao círculo íntimo do presidente depois de
fazer uma vasta fortuna com carros, satélites e foguetes, há muito é
conhecido por declarações grandiosas e uma personalidade instável.
Apoiadores o veem como um gênio excêntrico cujo estilo de gestão
agressivo é fundamental para seu sucesso.
Mas, no ano passado, quando ele entrou na arena política, algumas
pessoas que o conheciam se preocuparam com o uso frequente de drogas, as
oscilações de humor e a fixação em ter mais filhos. Este relato de seu
comportamento é baseado em mensagens privadas obtidas pelo jornal
americano The New York Times, bem como em entrevistas com mais de uma
dúzia de pessoas que o conheceram ou trabalharam com ele.
Este ano, alguns amigos de longa data do bilionário o criticaram,
apontando para sua conduta pública. "Elon tem ultrapassado cada vez mais
os limites de seu mau comportamento", disse Philip Low, um
neurocientista que o criticou por seu gesto nazista em um comício.
Além disso, algumas mulheres estão desafiando Musk pelo controle de
seus filhos. Uma de suas ex-parceiras, Claire Boucher, a musicista
conhecida como Grimes, tem lutado com Musk por causa de seu filho de 5
anos, conhecido como X. Musk é extremamente apegado ao menino e até já o levou ao Salão Oval, na Casa Branca, e a reuniões de alto perfil que são transmitidas ao redor do mundo.
Claire reclama em particular que as aparições violam um acordo
de custódia no qual ela e o bilionário concordaram em tentar manter seus
filhos longe dos olhos do público, segundo pessoas familiarizadas com a
questão. Ela costuma dizer que se preocupa com a segurança do menino, e
que viagens frequentes e privação de sono estão prejudicando sua saúde.
Outra mulher, a escritora de tendência conservadora Ashley St. Clair,
revelou em fevereiro que teve um relacionamento secreto com Musk e deu à
luz seu 14º filho conhecido. Musk ofereceu a ela um grande acordo para
manter sua paternidade oculta, mas ela recusou. Ele ainda buscou uma
ordem de silêncio em Nova York para forçar Ashley a parar de falar
publicamente, disse a escritora em uma entrevista.
Um hábito de cetamina
Musk já descreveu alguns de seus problemas de saúde mental em
entrevistas e redes sociais, dizendo em uma publicação que sentiu
"grandes altos, baixos terríveis e estresse implacável". Ele também
criticou a terapia tradicional e os antidepressivos.
O empresário joga videogames por horas a fio, luta contra a compulsão
alimentar, segundo pessoas familiarizadas com seus hábitos, toma
medicamentos para perda de peso e posta dia e noite em sua rede social, o
X. No ano passado, o The Wall Street Journal relatou que Musk tem um histórico de uso recreativo de drogas.
Alguns membros do conselho da Tesla, sua empresa de veículos elétricos, se preocuparam com seu uso de drogas, incluindo Ambien, um medicamento para dormir.
Em uma entrevista em março de 2024, o jornalista Don Lemon o
pressionou sobre o assunto. Musk disse que tomava apenas "uma pequena
quantidade" de cetamina, cerca de uma vez a cada duas semanas, como
tratamento prescrito para humores negativos.
"Se você usa cetamina demais, não consegue realmente trabalhar, e eu
tenho muito trabalho", disse ele. Na verdade, ele havia desenvolvido um
hábito muito mais sério, conforme descobriu o The New York Times.
Musk estava usando cetamina com frequência, às vezes diariamente, e
misturando-a com outras drogas, segundo pessoas familiarizadas com seu
consumo. A linha entre uso médico e recreativo era tênue, preocupando
algumas pessoas próximas a ele. O bilionário também tomou Ecstasy e
cogumelos psicodélicos em reuniões privadas nos EUA e em pelo menos
outro país, segundo pessoas que participaram desses eventos.
A FDA, agência que regulamenta e fiscaliza alimentos e remédios nos
EUA, aprovou formalmente o uso de cetamina apenas como anestésico em
procedimentos médicos. Médicos com licença especial podem prescrevê-la
para transtornos psiquiátricos como depressão, mas o órgão alertou sobre
seus riscos, que ficaram em evidência após a morte do ator americano Matthew Perry.
A droga tem propriedades psicodélicas e pode causar dissociação da
realidade, e seu uso crônico pode levar ao vício e a problemas de dor e
controle da bexiga.
No ano passado, Musk intensificou as críticas ao então presidente
americano, o democrata Joe Biden, particularmente suas políticas sobre
imigração ilegal e iniciativas de diversidade. Mas o bilionário também
enfrentava investigações federais sobre seus negócios —reguladores
estavam apurando acidentes com carros autônomos da Tesla e alegações de
racismo em suas fábricas, entre outras queixas.
"Existem pelo menos meia dúzia de iniciativas significativas para me
derrubar", escreveu ele em uma mensagem de texto para uma pessoa próxima
em maio passado. "O governo Biden me vê como a ameaça nº 2 depois de
Trump", afirmou. "Eu não posso ser presidente, mas posso ajudar Trump a
derrotar Biden, e vou ajudar", acrescentou.
Ele endossou publicamente Trump em julho.
Por volta dessa época, Musk disse a pessoas próximas que seu uso de
cetamina estava causando problemas na bexiga, segundo pessoas
familiarizadas com as conversas.
Em 5 de outubro, ele apareceu com o republicano em um comício pela
primeira vez, pulando ao redor do candidato. Naquela noite, Musk
compartilhou seu entusiasmo com uma pessoa próxima a ele. "Estou me
sentindo mais otimista depois de hoje à noite", escreveu em uma mensagem
de texto. "Amanhã vamos liberar uma anomalia na matrix."
"Isso não é algo no tabuleiro de xadrez, então eles ficarão bastante
surpresos", acrescentou cerca de uma hora depois. "'Lasers' do espaço."
Depois que Trump venceu, Musk alugou uma casa em Mar-a-Lago, o
resort do presidente eleito na Flórida, para ajudar na transição. O
empresário participou de reuniões e telefonemas com líderes estrangeiros
e elaborou planos para reformular o governo federal sob o novo
Departamento de Eficiência Governamental, o Doge.
Segredos familiares
Musk também tem administrado as consequências confusas de seus esforços para ter mais filhos.
Até 2022, o empresário, que se casou e divorciou três vezes, havia
gerado seis filhos em seu primeiro casamento (incluindo um que morreu na
infância), além de dois com Boucher, que disse a pessoas próximas que
acreditava estar em um relacionamento monogâmico e construindo uma
família.
Mas enquanto uma barriga de aluguel estava grávida de seu terceiro
filho, Boucher ficou furiosa ao descobrir que Musk havia recentemente
tido gêmeos com Shivon Zilis, uma executiva de sua empresa de implantes
cerebrais, a Neuralink, segundo pessoas familiarizadas com a situação.
A essa altura, temeroso de que as taxas de natalidade em declínio no
mundo levassem ao fim da civilização, o bilionário encorajava
publicamente as pessoas a terem filhos e doava US$ 10 milhões para uma
iniciativa de pesquisa sobre crescimento populacional.
Ele também estava passando tempo com Simone e Malcolm Collins,
figuras proeminentes no emergente movimento pronatalista, e incentivava
seus amigos ricos a terem o maior número possível de filhos. Musk
acreditava que o mundo precisava de mais pessoas inteligentes, segundo
pessoas cientes das conversas.
Collins recusou-se a comentar sobre seu relacionamento com Musk, mas
disse que o empresário "é uma das pessoas que leva essa causa a sério".
Mesmo enquanto gerava mais filhos, o blionário favorecia seu filho X.
No final de 2022, durante um período em que Musk e Boucher estavam
separados, ele começou a viajar com o menino por dias seguidos, muitas
vezes sem aviso prévio, segundo pessoas familiarizadas com suas ações.
Boucher se reconciliou com Musk apenas para ter outra surpresa
desagradável. Em agosto de 2023, ela soube que Zilis estava esperando um
terceiro filho com Musk via barriga de aluguel e estava grávida do
quarto.
Boucher e Musk iniciaram uma contenciosa batalha pela custódia,
durante a qual Musk manteve X por meses. Por fim, eles assinaram um
acordo de custódia conjunta que especificava manter seus filhos longe
dos holofotes.
Em meados de 2023, sem o conhecimento de Boucher ou Zilis, Musk havia
iniciado um relacionamento romântico com Ashley, a escritora, que vive
na cidade de Nova York.
Ashley disse em uma entrevista que, no início, Musk lhe disse que não
estava namorando mais ninguém. Mas quando ela estava com cerca de seis
meses de gravidez, ele assumiu que estava romanticamente envolvido com
Zilis, que se tornou uma figura mais visível na vida de Musk.
Ashley disse que o empresário lhe contou que havia gerado filhos ao
redor do mundo, incluindo um com uma estrela pop japonesa, e disse que
estaria disposto a doar seu esperma para qualquer pessoa que quisesse
ter um filho. "Ele fez parecer que era apenas sobre seu altruísmo e que
realmente acreditava que essas pessoas deveriam simplesmente ter
filhos", disse ela.
Segundo Ashley, em setembro, quando ela estava na sala de parto dando
à luz, Musk lhe disse por mensagens que desapareciam no Signal que ele
queria manter a paternidade e o relacionamento deles em segredo.
Na noite da eleição, por exemplo, ambos foram a Mar-a-Lago para celebrar a vitória de Trump, mas ela teve que fingir que mal o conhecia, diz a escritora.
Em troca do silêncio de Ashley, Musk ofereceu a ela US$ 15 milhões de
uma vez e US$ 100 mil por mês até que o filho deles completasse 21
anos, de acordo com documentos analisados pelo The New York Times e
reportados primeiramente pelo The Wall Street Journal. Mas ela não
queria que a paternidade de seu filho fosse escondida.
Depois de tornar o caso público em fevereiro, ela processou Musk para
que ele reconhecesse a paternidade e, posteriormente, para obter pensão
alimentícia emergencial. O bilionário então buscou uma ordem de
silêncio, alegando que qualquer publicidade envolvendo a criança ou
comentários de Ashley sobre sua experiência seria um risco de segurança
para o menino.
'Nenhuma simpatia por este comportamento'
Alguns dos antigos amigos de Musk expressaram preocupações sobre o que consideravam um comportamento público tóxico.
Em um boletim informativo de janeiro explicando por que a amizade
deles havia terminado, Sam Harris, um intelectual público, escreveu que
Musk havia usado sua rede social para difamar pessoas e promover
mentiras. "Há algo seriamente errado com sua bússola moral, se não com
sua percepção da realidade", escreveu Harris.
Mais tarde naquele mês, na posse de Trump, Musk bateu no peito e estendeu a mão diagonalmente para cima,
um gesto semelhante a uma saudação fascista. "Meu coração está com
vocês", disse ele à multidão. "É graças a vocês que o futuro da
civilização está assegurado."
Musk descartou a indignação pública que veio na sequência, dizendo que havia feito um "gesto positivo".
Low, que é diretor executivo da NeuroVigil, uma empresa de
neurotecnologia, ficou indignado com a atitude. Ele escreveu um email
contundente a Musk, compartilhado com o The New York Times, criticando-o
por "fazer a saudação nazista".
Quando Musk não respondeu à mensagem, Low publicou suas preocupações
nas redes sociais. "Não tenho simpatia por esse comportamento", escreveu
no Facebook,
referindo-se ao gesto e a outras atitudes. "Em algum momento, depois de
tê-lo confrontado repetidamente em privado, acredito que a coisa ética a
fazer é falar abertamente, com força e sem desculpas."
No mês seguinte, Musk mais uma vez se viu sob escrutínio, desta vez
por uma aparição na CPAC (Conferência de Ação Política Conservadora, na
sigla em inglês), nos arredores de Washington.
Ao subir ao palco, ele recebeu uma motosserra de um de seus aliados
políticos, o presidente da Argentina, Javier Milei. "Esta é a motosserra
para a burocracia!", gritou Musk para a multidão que o aplaudia.
Alguns organizadores da conferência disseram ao The New York Times
que não notaram nada fora do comum sobre seu comportamento nos
bastidores. Mas, durante uma entrevista no palco, ele falou em surtos
desconexos de gagueira e risos, usando óculos escuros. Clipes disso se
tornaram virais enquanto muitos espectadores especulavam sobre possível
uso de drogas.
FOLHA