skip to main | skip to sidebar

Depósito de Textos do Blog0news

local onde publico os textos & artigos maiores citados no BLOG0NEWS de modo que os posts de lá não fiquem enormes.

December 5, 2025

Como Níquel Náusea, primo punk do Mickey, cutuca a humanidade há 40 anos

 

Henrique Artuni

Não faça como a barata Fliti, que confundiu o nome —e a espécie— do seu amigo de esgoto com a de um primo distante e rico chamado Mickey. "Meu nome é Níquel Náusea! E sou um rato, não um camundongo. Minha mãe teve 814 filhotes. E justo eu ganhei esse nome!"

Em três quadros, um rato apresenta-se como Níquel Náusea para outro rato chamado Mickey. No segundo quadro, Níquel afirma ser um rato, não um camundongo. No terceiro quadro, ele explica que sua mãe teve 814 filhotes e que ele ganhou o nome Níquel Náusea, enquanto Mickey pede desculpas.
Primeira tirinha do 'Níquel Náusea' na Folha, com a qual Fernando Gonsales venceu o primeiro concurso de ilustradores do jornal - Divulgação

Assim se apresentava uma das personagens mais longevas da Ilustrada, na Folha, numa tirinha com a qual Fernando Gonsales ganhou, em 1985, o primeiro concurso para ilustradores do jornal. Desde dezembro daquele ano, o artista integra o time de cartunistas fixos do caderno com uma obra que se sagrou como uma "revolução dos bichos".

Quem usa o termo é Benett, outro cartunista da casa, na introdução de "Níquel Náusea: A Origem do Espécime", primeiro volume da Z Edições a recapitular os primeiros passos do rato e sua turma, ainda antes de Gonsales alugar seu pincel para toda sorte de animais. O livro tem lançamento durante a CCXP, evento de cultura pop que acontece até domingo (7), em São Paulo.

"Meu interesse pelos animais sempre foi meio científico. Lia muito sobre o assunto, inclusive livros técnicos de zoologia, entomologia e tudo mais", diz Gonsales, que fez as faculdades de veterinária e biologia, chegou a trabalhar por um ano na hidrelétrica de Tucuruí, no Pará, antes de enveredar pelo desenho profissional.

"Mas também tinha a coisa de criança. Tive uma pulga que eu alimentava com meu próprio sangue apesar de nunca ter dado um nome a ela. Então a escolha de um animal para protagonista da tira foi natural —entre tantas opções, achei que o rato era a melhor, porque é um animal que desafia a hegemonia humana."


Autorretrato de Fernando Gonsales, autor da tira 'Niquel Náusea' - Divulgação

Esse elemento de revolta talvez não seja tão evidente na, digamos, maturidade de "Níquel Náusea", hoje centrada em trocadilhos visuais, com piadas mais leves, que satirizam os hábitos do mundo animal e humano. "No início as tiras tinham alguma coisa do movimento punk, mesmo que eu não soubesse disso na época. O próprio traço era mais pesado e sujo, com bastante uso de preto e hachurado."

Daí serem recorrentes tiras em que Fliti, a baratinha, curte o barato de um inseticida ou de uma naftalina como se fosse maconha ou LSD; ou em que Gatinha, a ratinha parceira de Níquel, se diverte fazendo filhotes.

As pequenas safadezas dividem os quadros ainda com sacadinhas mais pueris —quando Níquel rói um fio achando que era macarrão— ou até críticas ambientais —sobretudo ao aprisionamento de animais em zoológicos, gaiolas, além da caça a ratos e insetos com chineladas e vassouradas.

 


Tirinha que está em 'Níquel Náusea: A Origem do Espécime', de Fernando Gonsales - Divulgação

"Gosto bastante de fazer tiras idiotas, sem compromisso com nada, mas nem sempre estou nesse estado de espírito abençoado", diz Gonsales. "Então intercalo com assuntos mais engajados. Desde sempre quis abordar o tema ambiental, mas de forma mais indireta para não ficar panfletário."

A chegada das cores no jornal, nos anos 1990, também amenizou as tintas mais obscuras do seu estilo, conforme ele conta. "Antes as minhas piadas eram mais com a personalidade dos protagonistas, o que deixava a coisa mais previsível. Agora as piadas são mais livres e isso permite que eu escreva sobre mais temas e de formas diferentes em cada tira."

Aos poucos, foi aperfeiçoando seu traço —mais anguloso e estilizado. "Sempre busquei a simplificação do traço e do texto, até porque o espaço das tiras é bem limitado. Essa busca continua até hoje."

O espírito inquieto também se vê, não raro, nas sacanagens com o próprio camundongo da Disney —figura que, na capa de "A Origem do Espécime" aparece no início da cadeira evolutiva que desemboca no Níquel.

Capa preta com título 'Níquel Náusea Vol 1' e subtítulo 'A Origem do Espécime'. Ilustrações de personagens estilo desenho animado, incluindo ratos e insetos em diferentes poses e expressões. Nome do autor Fernando Gonsales na parte inferior.


Capa de 'Níquel Náusea: A Origem do Espécime', de Fernando Gonsales


"Ele não era exatamente uma antítese ao Mickey, a piada era mais com o nome. De vez em quando brincava com a relação entre os dois roedores, mas não era o assunto principal", diz Gonsales, que nos agradecimentos do livro cita Renato Canini, ilustrador gaúcho que deu tamanha brasilidade às tiras do Zé Carioca no país que chegou a ser vetado pela matriz americana. "Mas na época que curtia o trabalho do Canini não tinha a ideia da ruptura que ele estava fazendo, apenas adorava seu traço genial."

Hoje, Níquel é apenas um pontinho na fauna da tira batizada em sua homenagem, mas se firmou como um sinônimo da própria obra de Gonsales, hoje também adaptada para o Instagram, onde o autor publica histórias ainda mais sintéticas, de apenas dois quadros.


O rato Níquel Náusea e sua companheira a rata Gatinha estão conversando. Eles estão de costas, sob o céu estrelado. Quadrinho 1- Ele: Estou triste. Ela: Por quê? Quadrinho 2- Ele: É um motivo meio besta. Ela: Pode falar. Quadrinho 3- Ele: Não sei se devo. Ela: Vou entender. Quadrinho 4- Ele: É que eu não posso ficar invisível nem viajar no tempo. Ela olha pra ele com o olho arregalado. Quadrinho 5- Ela: Era melhor não ter falado.
Tirinha 'Níquel Náusea' de 28 de novembro de 2025 - Fernando Gonsales/Folhapress

"As tiras estão mudando de personagens fixos para universos abertos e isso já faz muito tempo. Essa é uma tendência bem brasileira, a maioria das tiras estrangeiras não funciona desse jeito. É tipo um suicídio em termos de marketing. Mas é realmente uma coisa bem libertadora poder trabalhar sem as limitações de personagens fixos, apesar deles darem mais consistência à tira." 

FOLHA  




Posted by Ricky at 2:45 PM No comments:

November 30, 2025

Vince Gilligan Is Breaking Good

 

 

 Vince Gilligan knows better than to try to explain where his stories come from. Like the extraterrestrial transmission that kicks off his new Apple TV series, Pluribus, their origin is a mystery. But the writer, producer, and director best known for creating the era-defining crime drama Breaking Bad can approximate where and when he started mulling the idea for the sci-fi epic that would become his first major project since leaving the Walter White universe.

It was probably 2016, in Burbank, where Gilligan had convened the writers’ room for Season 3 of Better Call Saul, the Breaking Bad spinoff he created with Peter Gould. “We would take lunch breaks that seemed to stretch longer and longer,” he recalls. “I’d walk around the neighborhood, and my mind would wander.” Eventually, his thoughts coalesced around the concept of wish fulfillment. “I thought: What if everyone in the world got along? And, specifically, what if everyone in the world was suddenly really, really nice to me personally?” When he took himself out of the scenario, the question became: “Why would one guy be that interesting to people?”

The answer forms the wild premise of Pluribus, whose particulars are being kept under wraps until Apple unveils its first two episodes on Nov. 7. But as for that irresistibly interesting guy, well, he turned out not to be a guy at all. Gilligan recruited Rhea Seehorn, who earned two Emmy nominations for playing the beloved Saul character Kim Wexler, to anchor the show as his first female protagonist, Carol Sturka. Despite press materials that introduce Carol as “the most miserable person on Earth,” she is also his first bona fide hero.

For a creator synonymous with the rise of antihero television, who made his name telling what he famously called “a story about a man who transforms himself from Mr. Chips into Scarface,” this is a seismic shift. Yet it’s also a reflection of the keen moral sensibility that has always permeated Gilligan’s work, as well as the kindness for which he has long been known throughout his industry. Though he remains proud of Breaking Bad and Better Call Saul, both of which aired on AMC, the once avowedly apolitical storyteller has become convinced that pop culture’s recent supersaturation with antiheroes has been unhealthy for society. His most ambitious series to date, Pluribus can be seen as a corrective of sorts—a grand, artful, mind-bendingly philosophical, darkly funny, sometimes heartbreaking, but consistently humane vindication of our fractious species.

When Gilligan reflects on his trajectory, from a kid making Super 8 movies in the Richmond, Va., area to, at 58, one of the small screen’s most acclaimed creators, the word that comes up most is luck. “I really feel like I’m the Kramer of the TV-writing world,” he says when we meet in October at a boutique hotel in New York City. “I fell ass-backward into good luck time and time again.” This self-assessment egregiously undersells the talent of a man who has made two of the medium’s greatest dramas. But rather than false modesty, it comes across as the genuine humility of a guy who, throughout our conversation, reflexively credits his collaborators.

It’s about a month before Pluribus is slated to debut, and Gilligan, who lives in New Mexico—his new show, like the Breaking Bad universe, is set in Albuquerque—is in town for a round of press and a preview screening during New York Comic Con. Dressed in a bright blue T-shirt that happens to match the hotel room’s azure-and-white decor, in an accidental echo of the meticulous production design for which his series are known, he speaks largely in anecdotes, with a soft Southern twang. As if to mark a new phase of his career, he has shaved the goatee that was his signature throughout the AMC years. 

He’s been through several eras already. Gilligan was studying film at NYU when, in 1989, he won the Virginia Governor’s Screenwriting Award for the screenplay that would become the movie Home Fries. He spent the next few years writing feature scripts. But by 1994 screenwriting work was drying up; he was broke and had lost his Writers Guild insurance. When his agent got him a meeting with The X-Files creator Chris Carter, Gilligan only intended to compliment him. But Carter asked for ideas, Gilligan pitched an episode about a character whose shadow came to life, and the man who’d soon become his boss hired him on the spot to write it. 

Gilligan’s three-decade tenure in television has paralleled the rapid evolution of the medium. In the mid-’90s, broadcast networks dominated prime time with megahits like Seinfeld, ER, and The X-Files, whose viewership on Fox peaked at a now-inconceivable 20 million. Breaking Bad and Better Call Saul emerged into what has been called the Third Golden Age of Television, a renaissance in audacious, cinematic cable programming for adult audiences, spurred by the success of The Sopranos and sustained by Netflix’s need to build a streaming library. Now he’s making Pluribus for Apple, one of the few companies still reliably funding expensive streaming series—especially science-fiction titles like Foundation and Severance—at a time of consolidation and austerity in Hollywood.

And yet Gilligan initially doubted he could make it as a TV writer. “The thing I was most trepidatious about is, I am so lazy,” he says. Surely, he figured, a guy whose process involved frequent video-game breaks wouldn’t last past his 13-week X-Files probation. “I thought, I don’t really need to clean out my fridge in Virginia. The ketchup will keep 13 weeks.” But to his surprise, he took to the hard work. “The two things about TV that are so great,” he discovered, are that “your writing actually gets produced”—unlike film scripts, which can take years to reach the screen, if they do at all—and “working with smart, talented people you can stand to be in a room with for 12 hours a day, five or six days a week

Another aimless period followed The X-Files’ 2002 finale. But Gilligan counts himself, yes, lucky to have been pitching Breaking Bad amid a boom in cable networks making bespoke scripted series, an escape hatch from broadcast’s grueling 22-plus-episode seasons. The 2008 premiere of the show, which follows a terminally ill teacher (Bryan Cranston) who cooks meth to stockpile money for his family, failed to generate the same buzz as AMC’s flagship original, Mad Men. A 2011 New York Times Magazine profile ventured, in an observation that has aged awkwardly, that Gilligan might be “TV’s first true red-state auteur.” Just when it looked as if that crowd might not be enough to sustain it, Netflix licensed the show during its fourth season, driving millions of new viewers to AMC for new episodes. 

Breaking Bad not only ended its five-season run with a record-breaking 10.3 million viewers tuning in for Walter White’s Shakespearean sendoff, but also yielded a more ruminative companion show in Saul, about Walt’s crooked lawyer (Bob Odenkirk), and a feature-length Netflix sequel, El Camino, that followed Walt’s puppyish partner in crime, Jesse Pinkman (Aaron Paul). Gilligan isn’t wrong that he benefited from serendipitous timing. Yet it’s equally true that none of Breaking Bad’s rivals maintained both the huge audiences (Mad Men never averaged more than 2.6 million) and the consistent quality (see: Game of Thrones) of what became basic cable’s crown jewel of the 2010s.


Pluribus, which arrives three years after the final episode of Saul, opens by having a bit of fun with the clichés of prestige apocalypse dramas, from The Walking Dead to The Last of Us to 3 Body Problem. The premiere hints at many types of extinction events before pivoting to a cataclysm so surprising, it’s useless to guess. All you really need to know is that, within the first half-hour, the world we know is transformed beyond recognition. I wouldn’t want to reveal more even if I hadn’t been asked not to, because the show works best when you’re just as clueless as poor Carol.

What is clear from the outset is Pluribus’ global scale, which required a much larger canvas than Gilligan had ever been given. Portions of the nine-episode season were shot in the Canary Islands and northern Spain. There are scenes set at a Norwegian ice hotel and in the hills of Tangier, Morocco. The production built Carol’s entire neighborhood in the desert outside Albuquerque: “We picked a spot with this beautiful view of the Sandia Mountains,” Gilligan says. “And we said, ‘OK, in however many months we’re gonna have a whole cul-de-sac here.’” It wasn’t just a flex. “We knew we couldn’t shoot in a real neighborhood,” he explains, “because the neighbors would kick us out after the second episode.” Suffice to say, a lot of weird stuff happens at Carol’s house.

This cul-de-sac at the end of civilization feels like a physical manifestation of the loneliness Carol radiates even before the cataclysmic incident. A best-selling romantasy author with a perma-grimace, she dismisses her own books as “mindless crap” and hates her fans in what Gilligan says is a projection of self-loathing. Her manager and romantic partner, Helen (Miriam Shor), serves as a buffer between Carol and everyone else. When your hero has so many flaws that they initially obscure positive traits like independence and grit, it doesn’t hurt to cast an actor your loyal audience already adores. For Gilligan, who wrote the character specifically for Seehorn, the reunion also meant getting to spend more time with a performer who was “as sweet and kind and pleasant to be around as anyone I’ve ever worked with.”

He didn’t take the challenge of crafting his first female protagonist lightly. (While Kim, a chronically underestimated lawyer torn between law and morality, was so popular that viewers lived in fear she’d be killed off, Walt’s long-suffering wife, Skyler, played by Anna Gunn, was widely despised for her perceived shrillness.) “I always worry about writing female characters,” he says. “A lesbian character as well, because that’s not my experience.” But women are well represented among the series’ writers and directors. Besides, what makes Carol, like Kim, a great character is that she isn’t defined by gender or sexuality; she’s a person first. “It doesn’t feel like [Gilligan] had an agenda of, ‘I’m going to write a female-empowerment story,’” Seehorn says. “He wrote a fascinating, complex, incredibly reluctant hero with a lot of flaws but a lot of strengths, some of which she didn’t know she had.” “I wasn’t thinking in terms of masculine versus feminine,” Gilligan confirms. “I was just writing this character who’s got a lot of issues and is struggling to find happiness” but somehow feels even worse once society reorients itself around her whims. Only in hindsight did he realize that her anxious, misanthropic tendencies—“standard writer problems”—mirrored his own.

Still, for all that Pluribus constitutes a departure from male-antihero crime capers, it’s also unmistakably a Vince Gilligan creation: mournful undertones cut by dark humor; visual grandeur and distinctive characters. Gilligan’s trademark cold opens, which can transport us halfway around the world or introduce new characters, remain a masterly way of calibrating suspense. Exiting the New York screening, I heard one giddy attendee regale her companion with a list of Breaking Bad Easter eggs I hadn’t even noticed. In many ways, returning to speculative storytelling has felt like a homecoming to Gilligan, even as swerving away from crime presents a chance to expand his legacy. “I’m lucky as hell to be known for Breaking Bad. That’ll be the first thing on my tombstone,” he reflects. “But I don’t want to be a one-trick pony. If I have any life left in me, I want to do a few other things before I’m done.”


Between the second and third seasons of Better Call Saul, in 2016, the news broke that Gilligan was developing a drama about the Jonestown massacre. But the project never got off the ground, in what he looks back on as “a real failure on my part.” Gilligan found himself paralyzed by the task of doing justice to the victims and their families without elevating the perspective of their “scumbag” leader. “So I realized I better stay in my lane,” he says. “I’m better at making up stories. Then I don’t have to feel responsible” for dramatizing real people’s pain.

As adaptations and franchises crowd out the original storytelling of a bygone Golden Age, Gilligan is notable for what he doesn’t do as well as what he does. You’re not likely to find him helming the next Andor or The Penguin or any other prestige-branded series based on monolithic IP. “We’ve got modern mythologies now, with Star Wars and Star Trek and Marvel and DC—and all that stuff’s great,” he says. “But that stuff was created for people who are now in their 60s and 70s. In terms of DC Comics, it was created for people who are now long deceased. It’s good that they continue. It shows that they have a fundamental worth in terms of myth.” He just thinks it’s vital for pop culture to keep producing stories organic to the times we’re living in: “Every generation deserves its own mythology.

Another lucrative option that would surely be open to Gilligan is the megaproducer route, in which a big-name creator like Ryan Murphy or Shonda Rhimes develops a stable of series, each with their valuable imprimatur but its own showrunner. “I probably should figure out how to do that, because there’s a lot more money,” he muses. But the idea of parachuting into a writers’ room, dispensing high-level feedback, then moving on to the next? “That sounds like hell on Earth,” he says.

Though often described as an auteur—a term he has rejected—Gilligan continues to thrive on the collaborative spirit of the writers’ room as well as the production process. “There are writers who write every episode of a TV show, and my hat is off to them,” he says. (Think Mike White’s The White Lotus.) Not only does he appreciate camaraderie; he also believes that, were he to script every episode solo, he’d have “a poorer show creatively.” Seehorn describes him as “the composer in the middle of the orchestra,” working to realize “this beautiful story in his mind” but also leaving room for each musician to contribute. Perhaps unsurprisingly, Gilligan alums were represented in almost every department of the Pluribus crew.

In his 2013 book Difficult Men, which profiled the mostly prickly personalities behind contemporaries like The Sopranos and Mad Men, Brett Martin observed that Gilligan “was known as a good man to work for—someone who managed to balance the vision and microscopic control of the most autocratic showrunner with the open and supportive spirit of the most relaxed.” This reputation has persisted; as Shor noted at the preview screening, he’s been called the nicest guy in Hollywood. (Even the mildest criticisms are difficult, though not impossible, to find.) This fosters creativity. When Seehorn joined Saul, she found herself surrounded by “people that are all working at the very top of their game.” What was even more remarkable, she says, is that it was “all in service to the story, not ego. And you come on and they cannot wait for your contribution.”


Standing before a crowd of peers in February to accept a lifetime achievement award from the Writers Guild, Gilligan argued that pop culture needed to move on from bad guys like Walter White. “We are living in an era where bad guys, the real-life kind, are running amok,” he said. “Bad guys who make their own rules, bad guys who, no matter what they tell you, are only out for themselves. Who am I talking about? Well, this is Hollywood, so guess.” It was time, he believed, for heroes to make a comeback.

Gilligan has been expressing similar sentiments since at least 2018. What changed to make a creator who spent the better part of the Obama years cultivating his own Scarface nostalgic for Mr. Chips? Gilligan doesn’t mention names. But Donald Trump took office in 2017, so guess. “I’ve been studiously apolitical my whole career,” he says, because he found that polemic “instantly turned off half the potential audience.” Breaking Bad and Saul were concerned with larger moral truths: “At their heart, both say: actions have consequences.” Simple though it is, Gilligan points out that this message eluded TV for years, as characters in the episodic fare that predominated before DVR and streaming enabled serialized storytelling could commit murder in one episode and never speak of it again. 

Now, Gilligan feels compelled to reexamine the kinds of characters he’s creating because “what’s going on does not seem like it’s about left or right anymore. It feels like it’s about maintaining a democracy, maintaining a civil republic and the rule of law and the right to free speech versus giving it all away.” Though it seems, to him, like the U.S. is “right on the edge of civil war,” he’s convinced that no one actually desires that outcome.

We’ve got to find a way to talk to each other,” he says. Gilligan wants to see people from across the partisan spectrum interact face to face, instead of taunting each other online. He’s as stumped as anyone about how to make that happen. But he does hope Pluribus, a show too removed from our reality to explicitly address current political debates that is nonetheless “about people struggling to do the right thing,” can play a small part in facilitating those conversations.

Despite its speculative premise, the series captures the loneliness that has pervaded society since the COVID pandemic and the dread of a future in which artificial intelligence might render human interaction obsolete. (Gilligan didn’t have LLMs in mind when he conceived Pluribus but says he’s “happy if this show, in any way, shape, or form, could turn people off to AI.”) And in the imperfect hero who is Carol Sturka, viewers get a role model who doesn’t let her own anger or grief stop her from trying to save the world.

Gilligan is probably incapable of saccharine. Pluribus is as dry, ironic, brutal, and alert to the horrors festering in no small number of human souls as anything he’s made. Yet, as the season goes on, Carol’s quest becomes kind of inspiring. This reflects not just Seehorn’s charm and Gilligan’s frustrations with antiheroes, but also his anxiety about the prevalence of postapocalyptic sci-fi stories. “It started to worry me that we were writing so many of them,” he says. “It was like it was priming people for the apocalypse, instead of priming them to avoid the apocalypse at all cost.” Distilled to its essence, the message of Pluribus might be: Humanity is worth fighting for.

By the time Pluribus premieres, Gilligan will be back in the writers’ room, at work on a second season that was greenlighted along with the first. He’s relieved to have gone into the project knowing he’d have time to tell his story, as viewers who get invested in its expansive world-building surely will be, too. Does it bother him that he won’t get to hear audience feedback first? No, he says, because “I don’t think that’s the job.” Ever since The X-Files became one of the first shows to engage the online commentariat, he’s avoided fan chatter. “Fellow writers would say: ‘You need to check out this chat room. They’re talking about your episode,’” he recalls. “I instinctively knew to never do that.” Now he jokes to friends that they should euthanize him if he ever makes a social media account.

Not that he’s closed off to all input. “He never, ever shuts me down,” Seehorn says. And as meticulous as he is in constructing his richly detailed stories, Gilligan also values dynamism and spontaneity. As a showrunner, “you have to be ready to jettison ideas at the drop of a hat,” he says. Breaking Bad lore is littered with major plot changes made on the fly, alternate endings tossed around the writers’ room, characters as major as Jesse that Gilligan kept around much longer than he’d intended because he liked the actors’ performances so much. He has a clearer sense of how he wants to wrap up Pluribus than he did for previous shows at this point in their runs but makes no guarantees that he’ll stick to it.

“I want to stay open to the possibilities of going a different way,” Gilligan explains. “It’s like if you get in your car and you say, ‘I’m in Virginia, I want to head out to California. So I know, basically, the direction I need to head.’ But there’s all these little side trips and backroads you can take along the way—and that makes the trip more exciting.” Luck is part of that ride. You may get a flat tire, or you may run into a long-lost friend at a rest stop. But if the destination is appealing and the driver adept, the journey is bound to be worth taking.

TIME 

 

  

 

 

 



 

Posted by Ricky at 9:01 PM No comments:

November 23, 2025

Entrevista: Paulo Artaxo vê 'vitória do lobby do petróleo' na COP30 e defende abandono da obrigação de consenso para decisões

 O físico Paulo Artaxo

 

 

Por Luis Felipe Azevedo

 O físico Paulo Artaxo é um dos pesquisadores que esteve presente na COP30 e foi signatário de uma carta do setor que lamenta a ausência do plano para descontinuação do uso de combustível fóssil no texto final da conferência. Após o fim do evento, em entrevista ao GLOBO, o cientista afirma que essa omissão se deve ao cenário no qual o "lobby da indústria do petróleo acabou vencendo os interesses da população mundial" e propõe mudanças no funcionamento de tomada de decisões estabelecido pela Organização das Nações Unidas (ONU).

A COP30 cumpriu a promessa da implementação?

É uma questão complexa. O presidente da conferência, André Corrêa do Lago, enfatizou desde o início que esta deveria ser a cúpula da implementação de ações, com a construção do “mapa do caminho” para a eliminação dos combustíveis fósseis como prioridade. O problema é que isso colide com os mecanismos de decisão da ONU, que prevê a necessidade de consensos e, obviamente, o mundo está muito complexo hoje em dia e a dificuldade geopolítica complica as negociações. Basta um grupo de países bloquearem uma decisão para que ela não possa ser incluída no documento final.

O senhor acredita que essa exigência de consenso atrapalha avanços nas COPs?

Sim. Os países ali não estão defendendo exclusivamente as questões científicas. Eles pensam em interesses econômicos das indústrias de petróleo, por exemplo, o que torna muito difícil se obter consenso. É um cenário no qual cada país só olha para o que pode ganhar e o que pode perder, sem levar em conta que bilhões de pessoas do planeta terão uma vida muito mais complicada com o agravamento das mudanças climáticas. Um dos caminhos para frear isso seria a COP trabalhar com maioria e não com consenso na tomada de decisões.

O senhor acredita que a ausência de ao menos uma citação aos combustíveis fósseis no documento final indica um retrocesso com relação a COP28, quando isso ocorreu, no texto?

Uma vez que esse tema foi aprovado na COP28, ele permanece aprovado. Então, não há retrocesso. O que se tentou fazer na COP30 é implementar ações para que a gente possa abrir mão dos fósseis com uma rota ajustada e segura. E, com isso, se implementar a transição energética que, de uma forma ou outra, os países já estão fazendo. No caso brasileiro, a ciência aponta que precisamos acelerar esse processo e acabar com a exploração de combustíveis fósseis até 2040. Quanto mais cedo isso ocorrer melhor para o clima do planeta, com menos danos às populações vulneráveis e trará melhoria nas economias de cada país.

Quais foram os erros e acertos da presidência brasileira na COP30?

A equipe brasileira acertou ao focar na agenda de ação e ao destacar que essa deveria ser a COP da implementação de medidas. Agora, o Brasil é um entre os 196 países signatários da Convenção do Clima, e não decide sozinho. O lobby da indústria do petróleo acabou vencendo os interesses da população mundial, que deseja um clima previsível e estável, no qual se possa produzir alimentos com alta produtividade e assim por diante. A indústria do petróleo bloqueou essa possibilidade para que eles consigam um lucro máximo possível em um menor espaço de tempo.

Qual o saldo final da COP30? A ciência foi ouvida?

A questão climática é certamente a mais complexa que a humanidade terá de lidar nas próximas décadas. Eu preferia que essa COP tivesse sido encerrada com o “mapa do caminho” acordado, mas o mecanismo de funcionamento da ONU impediu que essa decisão constasse no documento final. Isso precisa mudar, mas a resistência é muito grande. Como ponto positivo, por outro lado, posso dizer que essa foi a primeira COP na qual a questão dos combustíveis fósseis foi uma questão central, sendo que sequer foi discutida em Baku, no ano passado. 

GLOBO 

 

Posted by Ricky at 8:55 PM No comments:

Aos 85 anos, Tia Surica comenta fama de marrenta: 'É só não mexer comigo'

 

 Tia Surica posa no quintal de sua casa, em Madureira

Matriarca relembra casos como noivado terminado por causa da Portela e conta que sonha em conhecer Portugal

Por Eduardo Vanini  
 
 Minutos depois de gravar uma entrevista sobre gastronomia, Tia Surica chega à sua casa, a poucos metros da quadra da Portela, em Madureira, na Zona Norte do Rio. Senta-se sob a parte coberta do quintal, acende um cigarro e desabafa: “Envelhecer é uma merda”. Quatro dias depois (na última segunda-feira), comemorou, naquele mesmo endereço, 85 anos de vida com uma superfesta. Uma farra que, segundo a sambista portelense, vinha sendo organizada de modo quase involuntário. “Não estou planejando nada. Já gostei de comemorar. Agora, não gosto mais”, comenta, na tarde em que recebe a reportagem. “Não era só dizer que não queria?”, pergunto. “Que nada! Iam fazer mesmo assim.”

Aviso que faremos uma foto, e a fotógrafa Ana Branco tenta tranquilizá-la. “Sei que você já não aguenta mais posar...”, comenta, ao passo que a aniversariante responde: “Puta que pariu, estou saturada”. Mas não se trata de grosseria ou estrelismo. Quem conhece a matriarca da azul e branco sabe que a falta de cerimônia é sua marca registrada, um jeito peculiar de exercer o carisma. “É só não mexer comigo. Não gosto de paparicação. Gosto de ser bem tratada.”

Lendas: Com Monarco (1933-2021), na quadra da Portela, em 2019 — Foto: Marcelo Regua
Lendas: Com Monarco (1933-2021), na quadra da Portela, em 2019 — Foto: Marcelo Regua

Dominada a situação, ela solta as primeiras risadas e diz: “Enquanto tiver força e saúde, estou na estrada”. Foram muitos quilômetros rodados e milhas voadas até aqui. Semanas atrás, por exemplo, foi a Paris para uma apresentação. Quando fita o horizonte, reconhece que já começou a “contar o tempo”, mas ainda há territórios a serem desbravados. Sonha em conhecer Portugal e tem, entre as possibilidades, a produção de um documentário sobre a própria história. “Com disposição, mesmo com dor, vou aonde tiver que ir”, comenta ela, que faz fisioterapia para amenizar a artrite e a artrose. A matriarca também perdeu uns quilinhos. A dieta, avisa, passa longe das canetas emagrecedoras. “Parei de jantar”, conta a sambista, que anda abrindo mão até da cerveja. “Quando chegamos a uma certa idade, precisamos nos poupar.”

Entre os segredos por trás da vitalidade, Tia Surica cita a importância de manter os pés no chão. “Tem que ter carisma, tratar todo mundo bem e não deixar o sucesso subir à cabeça. Eu me sinto lisonjeada com as homenagens, mas não tem essa de ficar com o nariz empinado. Sou a mesma pessoa de sempre”, diz, evocando uma história de oito décadas. Afinal, começou a desfilar na Portela quando tinha 4 anos, ao lado da mãe. “Não tenho outra escola. É a minha segunda família.”

Entre Aline Calixto e Lucinha Nobre em ensaio para a Revista Ela, em 2019 — Foto: Leandro Tumenas
Entre Aline Calixto e Lucinha Nobre em ensaio para a Revista Ela, em 2019 — Foto: Leandro Tumenas

Trata-se, na verdade, de um casamento. Surica fez história na agremiação quando foi uma das intérpretes do samba-enredo “Memórias de um Sargento de Milícias” na Avenida, em 1966. Na época, tinha um noivo que não via com bons olhos o protagonismo da companheira, mas ela deu de ombros para as advertências do moço. “Só me esqueci que aparecia na TV, ainda em preto e branco. Dias depois, ele desfez o noivado. Estou casada com a Portela até hoje”, conta a baluarte, que tatuou no braço a águia da agremiação, quando fez 80 anos. Desfeito o enlace, tampouco quis saber de filhos. “Com essa rotina, ia ter criança para ficar nas mãos dos outros? Que nada! Esse negócio de filho é uma ilusão.”

Sozinha, de todo modo, jamais esteve. Além de promover badaladas feijoadas, divide há anos a casa onde mora com a amiga Tia Irani. Uma parceria selada na Lavanderia Confiança, que funcionava na Rua Senador Furtado, no Maracanã, onde trabalhavam juntas. Além de serem boas de papo, as duas compartilham a mesma ideia sobre casamento. “Tive dois noivos, mas eles implicavam com a minha cerveja. Imagina só? Bebo desde os 13 anos”, diverte-se Irani, que mandou às favas os pretendentes. “Casei com a Surica, minha irmã de coração. Brigamos, ela é bravinha, mas é muito leal. Se disser que estou com dor de cabeça, manda logo eu ir ao médico.”

A feijoada feita pela matriarca é uma das mais apreciadas na cidade — Foto: Ana Branco
A feijoada feita pela matriarca é uma das mais apreciadas na cidade — Foto: Ana Branco

Amiga com aura de nobreza. Entre os títulos que ostenta está o de Cidadã Benemérita do Município, concedido pela Câmara dos Vereadores do Rio, em 2023. É também queridinha do prefeito Eduardo Paes, ao lado de quem aparece com frequência. “Tia Surica carrega as raízes e a alma carioca no jeito de ser, de cantar, de receber a gente”, ele diz. “É aquele sorriso generoso que a cidade conhece.”

Autora do samba “Cafofo da Surica”, Teresa Cristina lembra que, acima de tudo, a portelense é patrimônio vivo da nossa cultura. “Ela tem a vivência de ter conhecido todas as pessoas pertencentes a uma classe que não vamos ter no futuro, que são as pastoras”, diz, em referência ao nome dado às sambistas da Portela. “Embora alguns ainda tenham um olhar secundário sobre elas, eram fundamentais para que um samba desse certo. Se não balançassem o lencinho ou aprendessem a letra na hora, a composição não se conectava à quadra.”

É por essas e outras que o temperamento da matriarca é, na verdade, mero detalhe, segundo Teresa. “Ela me esculhamba ao vivo, mas é um amor de pessoa. Detesta, por exemplo, quando desfilo em outra escola. Se pudesse, me dava uma banda”, diverte-se a cantora. “Já imaginou se tivesse 10cm a mais (ela tem 1,47m de altura). Pode reparar: a Surica tem essa marra toda e nunca olha para cima. Quem quiser falar com ela, que abaixe a cabeça.” 

GLOBO  

 

Posted by Ricky at 8:43 PM No comments:

November 18, 2025

Morre Jards Macalé, artista transgressor que marcou a MPB

 

  • Autor de arranjos de 'Transa' uniu a bossa nova aos morros
  • Ele ajudou a modernizar música brasileira nos anos 196

 Homem de perfil com cabelo afro e óculos redondos, vestindo camiseta branca, segura um cigarro aceso próximo ao rosto, com fumaça visível.

 Morreu nesta segunda-feira (17), aos 82 anos, o músico Jards Macalé. O artista estava internado no hospital Unimed, no bairro da Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro, desde o dia 1º de novembro. Ele enfrentava complicações nos pulmões e teve uma parada cardíaca em decorrência de uma infecção generalizada e uma insuficiência renal.

"Jards Macalé nos deixou hoje", publicou sua equipe nas redes sociais. "Chegou a acordar de uma cirurgia cantando 'Meu Nome é Gal', com toda a energia e bom humor que sempre teve.

O velório do artista será na sala Sidney Muller, no Palácio Gustavo Capanema, centro do Rio, nesta terça (18), de 10h às 15h. Logo em seguida, às 16h, o sepultamento acontece no Cemitério São João Batista, na zona sul da cidade.

Caetano Veloso lamentou a morte. "Sem Macalé não haveria 'Transa'. Estou chorando porque ele morreu hoje. Foi meu primeiro amigo carioca da música. Antes de Bethânia imaginar que seria chamada para 'Opinião', Alvaro Guimarães, diretor teatral baiano, me trouxe ao Rio para montar e mixar o curta para o qual eu tinha feito a trilha. Fui parar na casa de Macalé. E ele tocou violão. Me encantei", disse. "Ele tocou com Beta, lançou composições, chamei-o para Londres e 'Transa'. Na volta, ele e eu seguimos na música. Que a música siga mantendo a essência desse ipanemense amado."

Uma das últimas aparições de Macalé nos palcos foi no fim de setembro, no festival carioca Doce Maravilha. O músico levou o público ainda tímido à emoção apresentando as canções de seu disco homônimo de 1972. Lançado no período mais repressivo da ditadura militar, versos como "não me calo", "já comi muito da farinha do desprezo" e "também posso chorar" soam atuais quando entoados por jovens de roupas coloridas.

Há dois anos, o músico lançou "Coração Bifurcado", álbum com participações de Maria Bethânia e Ná Ozzetti. Com 12 canções, o trabalho tratava das diferentes formas do amor. "Diante do cenário de genocídio emocional, pai brigando com filho, marido brigando com a sogra, uma 'porradaria' horrorosa, ninguém falava de amor", ele afirmou na ocasião do lançamento. "Estava na hora de retomar o amor que eu tenho para dar e fazer um disco de amor como gesto político."

Em "Besta Fera", de 2019, Macalé retratou o governo de Jair Bolsonaro como um período de trevas. Depois, ele se engajou na tentativa de pacificar o país, ainda dividido pela ideologia política. O cantor disse que se sentia confiante, depois de ter feito um show na posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, do PT, em 2023. "Quando Lula subiu a rampa com a Janja e aquela vira-lata, eu me senti o próprio vira-lata."

Nascido no bairro carioca da Tijuca, Jards Anet da Silva passou a juventude entre Copacabana e Ipanema, nas mesas da Churrascaria Pirajá e do restaurante La Fiorentina. Com Nara Leão, a afinidade foi instantânea. Ela havia rompido com o lirismo descompromissado da época, unindo a bossa nova à música dos morros. Na época, chegou a acompanhar a cantora ao violão em shows no clube Caiçaras, localizado na Lagoa.

Jards Macalé em cena do filme 'Macaleia', dirigido por Rejane Zilles
Jards Macalé em cena do filme 'Macaleia', dirigido por Rejane Zilles - Anna Kahn/Anna Kahn

No ensaio biográfico "Eu Só Faço o que Quero", Fred Coelho assinala que, em diversos momentos da carreira, Macalé andava em grupos, mas nunca fez parte deles. Ele se preocupava em fundar sua própria linguagem artística.

Assim, na era dos festivais, ficou deslocado, porque ainda se detinha à poética viniciana. Nos anos 1970, foi um dos agentes do processo de eletrificação da música brasileira, adquirindo a face mórbida e romântica dos sucessos "Só Morto" e "Hotel das Estrelas", de 1970 e 1972, respectivamente.

Embora não se considerasse um tropicalista, Macalé colaborou de maneira definitiva com o movimento. Enquanto Caetano e Gilberto Gil estavam exilados em Londres, ele foi um parceiro importante para Gal Costa —que àquela altura se tornou a principal representante da música tropicalista na ausência da dupla.

Macalé não só fez arranjos para o disco "Legal", de 1970, como compôs para a cantora, incluindo músicas como "Mal Secreto" e "Vapor Barato", ambas em parceria com o poeta baiano Waly Salomão. A segunda delas, aliás, se tornou uma das principais músicas do repertório da cantora e de Macalé.

Em 1971, ele estava no Carnaval em Salvador quando Maria Bethânia apareceu para dizer que o irmão ligaria de Londres. Foi quando veio a convocação para reunir uma banda, embarcar para a capital inglesa e ser o diretor musical de "Transa", um dos discos mais cultuados de Caetano.

É ele quem toca o violão na abertura de "Nine Out of Ten", música que começa narrando um passeio por Portobello Road, então reduto da comunidade jamaicana na metrópole. Foi nessa região que Macalé tomou conhecimento do reggae, gênero que é lembrado na letra e do qual ele se apropriou no violão.

À Folha, o carioca contou que trocou um samba por um reggae. "O cara disse ‘te ensino a batida do reggae se você me ensinar a do samba’. Aí aprendi aquela célula. Ensinei a do samba, e ele ficou lá tentando. Acho que está tentando até hoje."

De volta ao Brasil, Macalé fez seu disco mais importante —o que leva o seu nome artístico, de 1972. A obra encapsula seu estilo de tocar violão, seu principal instrumento —e uma das marcas fundamentais de sua música.

Ele aprendeu a tocar com o pernambucano Jayme Florence, o Meira, que deu aulas a Baden Powell, e também Jodacil Damaceno, mais ligado à música erudita de Heitor Villa-Lobos. Fã, e depois amigo, de João Gilberto, Macalé partiu da percussividade e das harmonias da bossa nova, mas rejeitou o decoro dos ícones do estilo.

Se João era metódico e perfeccionista com o violão, Macalé era puro despojamento. O dedilhado rústico remete às "marteladas" nas cordas de Nelson Cavaquinho, mas nas mãos de Macalé o instrumento era ainda mais sujo, e mantinha certo diálogo com a guitarra elétrica e roqueira de Jimi Hendrix —que àquela altura estava sendo incorporada à música popular brasileira.

Em "Jards Macalé", de 1972, essa espontaneidade escorre do violão para toda a estética do álbum, recheado de experimentalismos, mudanças repentinas de andamento, falsetes errantes e letras espirituosas. Ele colaborou com letristas parceiros do tropicalistas, como Torquato Neto, José Carlos Capinam e Waly Salomão.

Tanto o canto quanto o violão, e até mesmo as levadas das faixas de "Jards Macalé" são trôpegos, dispensando o polimento da música brasileira mais respeitada da época. Mas esse desleixo era proposital e não significava que sua abordagem da música era frívola ou pueril.

Macalé tratava de temas existenciais em músicas como "Movimento dos Barcos", hoje no panteão das grandes composições da MPB, um hino sobre se deixar levar pela vida gravado também por Maria Bethânia. Brincava com a morte e o drama em "Farrapo Humano" e se derramava de dor em "Meu Amor me Agarra e Geme e Treme e Chora e Mata".

O álbum foi um desenrolar do EP "Só Morto/Burning Night", de 1970, que era ainda mais experimental, com maior destaque para a guitarra e os gritos do cantor. Sua produção nessa época o posicionou como um expoente da contracultura, com canções moldadas pelo clima de repressão da ditadura militar.

Em 1974, o disco "Aprender a Nadar" trouxe na capa a definição que Waly Salomão deu para a música de Macalé —"morbedeza romântica". O termo, que nem o próprio cantor sabia explicar direito, é um neologismo que misturava "morbidez" e "beleza", elementos contrastantes que se encontravam na obra do artist

Morbidamente belo, ou belamente mórbido, Macalé preferia provocar a expressar sentimentos de maneira simplória. Em "Aprender a Nadar", fez isso a partir da capa. A arte, com uma caricatura no estilo HQ, foi imposta pela gravadora ao músico, que achou a imagem muito ingênua para o conteúdo do disco e pediu para ele próprio escolher como seria a contracapa.

No documentário "Macaléia", dirigido pela mulher do músico, a cineasta Rejane Zilles, ele diz que fez uma "contra a capa". "Pedi uma cartolina branca, uma tinta vermelha, uma caixa de fósforos, fluido de isqueiro e fotógrafo. Joguei a cartolina no chão, botei fogo na capa e tinta vermelha em cima. Daí pedi ao fotógrafo para fotografar."

Em "Aprender a Nadar", Macalé brinca com a tradição romântica do cancioneiro brasileiro —e latino-americano—, não sem boas doses da morbidez destacada por Salomão. "Veja/ Jatos de sangue/ Espetáculos de beleza/ Ah, vale a pena ser poeta/ Escutar você torcer de volta/ A chave na fechadura da porta", ela canta em "Rua Real Grandeza".

Mais afeito a questões ligadas ao fazer artístico do que à indústria fonográfica ou à ideia de uma carreira musical, Macalé entrou em rota de colisão com as gravadoras. Sua produção foi rareando a partir dos anos 1980, quando ele se somou à lista dos artistas esquecidos e entrou em ocaso.

O cantor brinca com sua condição de "maldito" em "Conto do Pintor", composição de Miguel Gustavo. A letra é uma crônica na qual Macalé se disfarça de pintor e faz sucesso no mundo das artes plásticas. "Pintei um quadro só por fora das molduras/ Eu joguei tinta nas paredes, todo mundo achou legal/ Eu comi rosas e as madames exclamaram/ ‘Esse Macalé é um artista genial!’", diz o refrão.

A faixa está presente em "Contrastes", disco de 1976 em que Macalé se aventura pelo forró ("Sim ou Não") e pelo reggae ("Negra Melodia"), canta Ismael Silva ("Contrastes") e faz a versão mais melancólica de uma de suas típicas baladas sombrias, "Sem Essa".

Macalé ficou sem lançar um disco até 1987, quando fez "Quatro Batutas e um Coringa", cantando sambas de Paulinho da Viola, Geraldo Pereira, Nelson Cavaquinho e Lupicínio Rodrigues. Depois, ficou novamente mais de uma década sem novos álbuns até lançar, em 1998, o disco "O Que Faço é Música".

Uma pérola de sua discografia é o álbum "Let’s Play That", gravado em 1984 mas lançado somente na década seguinte. O LP registra o encontro em estúdio de Macalé com o lendário músico pernambucano Naná Vasconcelos, que se juntou ao cantor e violonista numa jam.

Nos últimos anos, Macalé ganhou destaque com os discos "Besta Fera", de 2019, e "Síntese do Lance", de 2021. São obras que espelham, respectivamente, as facetas mórbida e bela do cantor. O primeiro resulta do encontro do carioca com o guitarrista paulistano Kiko Dinucci —talento da geração atual fortemente influenciado por ele. O segundo é uma ode à vida simples e à bossa nova em parceria com o mago dos pianos, João Donato.

Apesar da longa trajetória musical, ele também contemplou várias outras expressões artísticas ao longo de sua vida. Em seis décadas de carreira, atuou no cinema, na televisão, no teatro e nas artes plásticas. A música, porém, se mantinha enquanto elo comum de sua carreira multifacetada.

Entre suas credenciais, compôs trilhas sonoras e atuou em diferentes filmes do cineasta Nelson Pereira do Santos, como "O Amuleto de Ogum" e "Tenda dos Milagres". Macalé também compôs para ativações e apresentações artísticas de nomes centrais da arte contemporânea brasileira, como Lygia Clark e Helio Oiticica.

A relação entre Macalé e Oiticica, aliás, é o centro do documentário "Macaléia", que apresenta a trajetória anárquica da dupla e as obras experimentais produzidas por eles, que desafiaram os padrões artísticos da época.

A "Macaléia" do título, inclusive, se refere a uma obra que Oiticica desenvolveu especialmente para Macalé em 1978, um de seus "penetráveis" — termo utilizado pelo artista para se referir às instalações artísticas.

Com o poeta José Carlos Capinam, compôs "Gotham City", incorporando a linguagem dos quadrinhos. A canção foi defendida por Macalé no 4º Festival Internacional da Canção, em 1969. "Cuidado! Há um morcego na porta principal!/ Cuidado" há um abismo na porta principal", dizem os famosos versos exclamativos, repetidos pelo público nas apresentações do compositor. À figura do morcego, soma-se, na letra, a descrição de uma metrópole acinzentada e sombria, bem ao estilo Macalé, como uma crítica à repressão vigente naquele tempo.

Marcada pela ruptura de padrões e costumes culturais da época, a trajetória de Macalé associou a ele, durante muito tempo, o apelido de artista "maldito". Com o passar das décadas, por outro lado, a sua influência sobre a MPB foi reconhecida como elementar e ele abandonou essa posição secundária.

A recusa de Macalé em relação ao apelido de "maldito" o levou a ser reconhecido pelo título de "anjo torto", figura que aparece na letra de sua música "Let's Play That", do álbum Jards Macalé, lançado em 1972. Na canção, Macalé faz referência ao anjo torto de Carlos Drummond de Andrade, que aparece em "Poema de Sete Faces", de 1930. A figura em questão é um ser desajustado cuja personalidade o mantém à margem. Macalé ocupou, porém, o centro da moderna música popular brasileira.

Ele deixa a mulher, a cineasta Rejane Zilles.

Lucas Brêda , Davi Galantier Krasilchik , Eduardo Moura e Gustavo Zeitel

FOLHA 

Posted by Ricky at 4:40 PM No comments:
Older Posts Home
Subscribe to: Comments (Atom)

Followers

Blog Archive

  • ▼  2025 (113)
    • ▼  December (1)
      • Como Níquel Náusea, primo punk do Mickey, cutuca a...
    • ►  November (10)
    • ►  October (18)
    • ►  September (12)
    • ►  August (6)
    • ►  July (9)
    • ►  June (13)
    • ►  May (10)
    • ►  April (8)
    • ►  March (9)
    • ►  February (12)
    • ►  January (5)
  • ►  2024 (191)
    • ►  December (13)
    • ►  November (8)
    • ►  October (20)
    • ►  September (18)
    • ►  August (11)
    • ►  July (16)
    • ►  June (21)
    • ►  May (20)
    • ►  April (17)
    • ►  March (28)
    • ►  February (9)
    • ►  January (10)
  • ►  2023 (154)
    • ►  December (10)
    • ►  November (13)
    • ►  October (20)
    • ►  September (18)
    • ►  August (15)
    • ►  July (11)
    • ►  June (9)
    • ►  May (7)
    • ►  April (19)
    • ►  March (14)
    • ►  February (9)
    • ►  January (9)
  • ►  2022 (188)
    • ►  December (8)
    • ►  November (14)
    • ►  October (18)
    • ►  September (13)
    • ►  August (9)
    • ►  July (21)
    • ►  June (22)
    • ►  May (10)
    • ►  April (21)
    • ►  March (22)
    • ►  February (16)
    • ►  January (14)
  • ►  2021 (92)
    • ►  December (7)
    • ►  November (16)
    • ►  October (7)
    • ►  September (9)
    • ►  August (7)
    • ►  July (7)
    • ►  June (7)
    • ►  May (6)
    • ►  April (9)
    • ►  March (6)
    • ►  February (5)
    • ►  January (6)
  • ►  2020 (182)
    • ►  December (12)
    • ►  November (18)
    • ►  October (17)
    • ►  September (16)
    • ►  August (15)
    • ►  July (15)
    • ►  June (13)
    • ►  May (10)
    • ►  April (16)
    • ►  March (26)
    • ►  February (13)
    • ►  January (11)
  • ►  2019 (188)
    • ►  December (13)
    • ►  November (10)
    • ►  October (14)
    • ►  September (8)
    • ►  August (19)
    • ►  July (15)
    • ►  June (18)
    • ►  May (19)
    • ►  April (27)
    • ►  March (17)
    • ►  February (12)
    • ►  January (16)
  • ►  2018 (199)
    • ►  December (13)
    • ►  November (11)
    • ►  October (26)
    • ►  September (11)
    • ►  August (19)
    • ►  July (13)
    • ►  June (20)
    • ►  May (16)
    • ►  April (23)
    • ►  March (18)
    • ►  February (11)
    • ►  January (18)
  • ►  2017 (180)
    • ►  December (11)
    • ►  November (8)
    • ►  October (14)
    • ►  September (16)
    • ►  August (12)
    • ►  July (20)
    • ►  June (18)
    • ►  May (11)
    • ►  April (18)
    • ►  March (25)
    • ►  February (22)
    • ►  January (5)
  • ►  2016 (61)
    • ►  December (1)
    • ►  November (1)
    • ►  October (1)
    • ►  August (2)
    • ►  May (6)
    • ►  April (14)
    • ►  March (22)
    • ►  February (6)
    • ►  January (8)
  • ►  2015 (20)
    • ►  December (2)
    • ►  November (1)
    • ►  October (7)
    • ►  September (3)
    • ►  June (1)
    • ►  May (4)
    • ►  April (2)
  • ►  2014 (3)
    • ►  September (1)
    • ►  January (2)
  • ►  2013 (2)
    • ►  August (1)
    • ►  February (1)
  • ►  2012 (1)
    • ►  March (1)
  • ►  2011 (3)
    • ►  July (1)
    • ►  June (1)
    • ►  February (1)
  • ►  2010 (25)
    • ►  December (4)
    • ►  September (1)
    • ►  August (3)
    • ►  July (2)
    • ►  May (2)
    • ►  March (3)
    • ►  February (3)
    • ►  January (7)
  • ►  2009 (83)
    • ►  December (7)
    • ►  November (5)
    • ►  October (6)
    • ►  September (3)
    • ►  August (13)
    • ►  July (10)
    • ►  June (20)
    • ►  May (7)
    • ►  April (2)
    • ►  March (3)
    • ►  February (3)
    • ►  January (4)
  • ►  2008 (13)
    • ►  December (8)
    • ►  November (3)
    • ►  October (2)

About Me

Ricky
View my complete profile