June 15, 2021

Série 'Meu amigo Bussunda' reconstrói trajetória e morte do humorista

  Bussunda: os pais do homorista achavam que ele

Maria Fortuna

 A série “Meu amigo Bussunda” é recheada de histórias hilárias sobre o mais carismático integrante da turma do Casseta & Planeta. Mas a passagem mais forte do documentário, que estreia no Globoplay quinta-feira, data dos 15 anos de sua morte, vai fazer muita gente chorar. Com direção geral do parceiro de grupo Claudio Manoel, o programa reconstrói o dia da súbita partida do humorista Cláudio Besserman Vianna durante a cobertura da Copa do Mundo da Alemanha, em 2006.

 Em depoimentos emocionados, amigos e equipe de trabalho relembram as gravações do programa na cidade de Parsdorf e a pelada no campo de futebol do hotel, que Bussunda encarou após traçar um joelho de porco regado a tulipas de cerveja. Também relatam o instante em que ele sofreu uma parada cardíaca.

— Não é que vi o Bussunda, o cara que eu mais gostava na vida, morrer metaforicamente. Foi literalmente mesmo — lamenta Claudio Manoel. — Enfrentar a dor esmagadora não foi possível. Então, durante muito tempo, tentei fugir ou me fazer de invisível diante dela.

Júlia Besserman: 'Quando meu pai morreu, eu fiquei míope', diz filha de Bussunda

Na série, Claudio, que é ao mesmo tempo entrevistador e testemunha, conta que sequer conseguia tocar no assunto. Carregava a culpa por ter sido o autor da ideia da tal partida de futebol. Se o tempo não cura tudo, ameniza. E, agora, ele não só fala sobre o tema como rodou um documentário, produzido por Emoções Baratas e Kromaki, que funciona como catarse. Claudio joga ali toda a carga sentimental de suas perdas nos últimos 15 anos. Seis meses depois da morte de Bussunda, ele perdeu o irmão. Em seguida, o pai. Um dia antes de começar a gravar programa, ano passado, foi a vez de sua mãe. O diretor dedica o trabalho aos três.

Fora as dores, a série é, sobretudo, uma bonita celebração da existência de Bussunda, dividida em quatro episódios. Os três primeiros, com direção e roteiro de Claudio e Micael Langer, lançam mão de imagens inéditas e de arquivo, entrevistas com parentes e amigos, colegas e integrantes do Casseta para narrar a trajetória do humorista, da infância à juventude. É quando surge o famoso apelido, resultado da aglutinação dos nomes Besserman e sujismundo. Por causa da falta de banho na colônia de férias que frequentava, acabou virando o “Besserman Sujismundo”. Depois, a alcunha evoluiu para “Bessermundo” e, por fim, “Bussunda”.

Parceria: Micael Langer e Claudio Manoel dirigem
Parceria: Micael Langer e Claudio Manoel dirigem 'Meu amigo Bussunda' Foto: Lucas Seixas

Pouco antes do sucesso do “Casseta & Planeta Urgente” na TV Globo, os pais do humorista reuniram os outros dois filhos (o economista Sergio e o médico Marcos) para pedir que sustentassem o irmão que “não daria em nada”. Mal sabiam que o estudante de Comunicação da UFRJ, que fora jubilado da faculdade, se tornaria o mais famoso dos três. E continuaria nem aí para dinheiro. Chegou até a esquecer o cheque de seu primeiro salário na Globo por meses na mesa de cabeceira. “Só lembrou quando recebeu o segundo pagamento. Aí comprou uma fatiadora, porque queria comer mortadela”, lembra a viúva, Angélica Nascimento.

Bussunda com a filha, Júlia Foto: arquivo / Arquivo pessoal
Bussunda com a filha, Júlia Foto: arquivo / Arquivo pessoal

O quarto episódio tem direção da filha de Bussunda, Júlia Besserman (leia entrevista exclusiva com ela) de 27 anos. Incomodada com o tom de certas graças do pai, Júlia problematiza piadas convidando humoristas da nova geração a debaterem o assunto. Desta forma, ela traz um olhar e reflexões atuais para a série. O público fica sabendo que mesmo naqueles tempos de humor politicamente incorreto, os Cassetas tiveram que lidar com críticas por batizarem de “preto com um buraco no meio” o vinil lançado com composições do grupo. O próprio Bussunda lembra a madrugada em que teve que dar explicações à feminista Lélia Gonzalez sobre a letra “mãe é mãe, paca é paca.../ mulher é tudo vaca”.

Júlia Besserman, filha de Bussunda, dirigiu um episódio do documentário sobre o pai Foto: Lucas Seixas
Júlia Besserman, filha de Bussunda, dirigiu um episódio do documentário sobre o pai Foto: Lucas Seixas

Além de saber da influência do Casseta na comédia atual e testemunhar debate sobre mudanças no humor ao longo do tempo, o espectador se diverte com “causos” de Bussunda, “verdadeiro isca de polícia”. Um dia, barbado, cabeludo e vestindo Havaianas, como sempre, foi parado em blitz na estrada. O policial encontrou papel de seda no porta-luvas e o perguntou: “Cadê a maconha?”. Resposta: “Vou comprar lá em Teresópolis”. E o guarda: “Mas não sabe que é proibido?”. No que Bussunda encerrou: “Ah, então, pode deixar que não vou comprar, não”.

Teve a vez em que encarnou Tim Maia no “Faustão”. O cantor deu o cano no programa, e Bussunda entrou em cena com enchimentos que aumentavam suas já generosas medidas. Foi o bastante para provocar a ira de Tim, que o ameaçou com uma surra. “Só não tenho medo porque sei que, na hora da porrada, ele não vai aparecer”, divertiu-se o humorista, ao comentar o episódio em uma entrevista.

Fingir-se de cego no ônibus para arrecadar dinheiro e depois torrar no bar era uma de suas gaiatices. Em outro golpe, fazia de conta que era péssimo na sinuca. Assim que um desavisado se aproximava, dizia que só jogava a dinheiro. Pensando estar diante de uma barbada, o inocente apostava e... tomava uma coça.

Por trás dessas gaiatices, havia uma pessoa doce, que ficava possesso com exemplos de falta de civilidade, como o tráfego em acostamentos. Única mulher do Casseta, Maria Paula define Bussunda como “um ursinho de pelúcia que cuidava de mim”. Hélio de La Peña destaca o otimismo (“sempre achava que tudo ia dar certo”), reforçado por Beto Silva: “Quando todo mundo ficava nervoso, a gente olhava para ele para saber se estava tudo bem assim como olha a aeromoça na hora que avião começa a balançar”.

— Quem assistir à série vai se apaixonar pelo ser humano encantador, justo, equilibrado, sarcástico, companheiro. Um cara que gostaríamos de ter como amigo, de quem ninguém fala mal — diz Micael Langer. — Quando li a biografia do Bussunda, só pensava em como minha vida era sem graça.

O GLOBO

 

 

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