Por Guilherme Boulos
A denúncia de que um pastor ligado ao Ministro da Educação negociou a propina de 1 quilo de ouro em troca da liberação de verbas culminou nesta semana na queda do ministro Milton Ribeiro. Somadas as pastas da Saúde e Educação, Bolsonaro acumula a marca inédita de sete ministros e zero iniciativas nacionais relevantes para o ensino público e o Sistema Único de Saúde. Um feito histórico.
A Polícia Federal abriu inquérito para investigar favorecimentos na liberação de recursos do ministério. Até a PGR, controlada pelo amigo Augusto Aras, até hoje calado sobre as investigações da CPI da Covid, afirmou ter identificado indícios dos crimes de corrupção passiva, tráfico de influência, prevaricação e advocacia administrativa. Foi apontado que o tráfico de influência era comandado nos últimos dois anos pelos pastores Gilmar Santos e Arilton Moura, sem nenhum cargo oficial no MEC. Transformaram um hotel e um restaurante em gabinete paralelo para liberar verbas da Educação a prefeitos do Brasil inteiro em troca de propinas.
As digitais de Bolsonaro estão nos cri-
mes do MEC. Um levantamento mostrou
que um dos pastores se reuniu quatro ve-
zes com Bolsonaro. Três desses encon-
tros foram no Palácio do Planalto. A pro-
va cabal foi a gravação que mostra o ex-
-ministro afirmando com todas as letras:
“Foi um pedido especial que o presidente
da República fez para mim sobre a ques-
tão do Gilmar”. O próprio presidente dis-
se que colocaria a cara no fogo por Milton
Ribeiro. Dias depois, derrubou o ministro.
As revelações sobre os esquemas no
MEC, ministério com orçamento de qua-
se 140 bilhões de reais anuais, são mais
um prego no caixão da imagem daque-
le que se elegeu à custa do lavajatismo e
da manipulação do sentimento contra a
corrupção. O quilo de ouro é só a cereja
do bolo de lama de um governo que teve
flagra de 30 mil reais na cueca do então
vice-líder do governo no Senado, denún-
cia de um esquema de 1 bilhão de reais na
compra das vacinas contra a Covid, com-
pra de mansão do filho Flávio Bolsonaro
no valor de 6 milhões de reais e inquérito
de “rachadinhas” com 29 milhões em des-
vios de salários de assessores fantasmas.
Todos os escândalos têm o DNA dos
esquemas milicianos da família Bolso-
naro. Esquemas a conta-gotas, capazes
de enriquecer individualmente, mas que
passariam abaixo do radar de investiga-
ções sobre corrupção no País. O ouro pe-
dido na propina, por exemplo, equivale-
ria hoje a algo em torno de 300 mil reais.
É o tipo de corrupção de quem naturali-
za a cobrança de taxas de gás e internet
em comunidades, de quem faz grilagem
e extorsão a moradores. Enfim, a corrup-
ção miliciana que Bolsonaro, os filhos e
amigos como Queiroz conhecem de per-
to há muitos anos. A diferença é que, ago-
ra, os milicianos ocupam o Planalto e ne-
gociam com novas mercadorias.
Bolsonaro opera seus esquemas à boca
pequena, colocando intermediários que
julga competentes na arte de sequestrar
a máquina pública. Também conta com
a assessoria técnica do experimentado
Centrão para barganhar apoio político
e implementar mecanismos de drena-
gem de recursos públicos. No início do
seu governo, por exemplo, o MEC anun-
ciou o edital de compra de 1,3 milhão de
computadores com 3 bilhões de reais por
meio do Fundo Nacional de Desenvolvi-
mento da Educação, controlado pelo Cen-
trão. Mas era um esquema para acender
os alertas até de quem não é acostumado
a sentir o cheiro de maracutaia: uma úni-
ca escola em Minas Gerais com 255 alu-
nos receberia 30 mil notebooks. Seriam
117 equipamentos por aluno.
Mesmo com a captura das instituições
de fiscalização e os sucessivos ataques
contra a autonomia das investigações,
várias revelações de corrupção deste go-
verno foram feitas. O povo brasileiro vai
conhecendo a posteriori o verdadeiro ca-
ráter daqueles que ganharam uma eleição
em nome do “fim da mamata”. A reunião
da propina do ouro foi revelada em mar-
ço de 2022, mas ocorreu em abril de 2021.
Quantas ocorreram desde então? Quan-
tos quilos de ouro foram desviados das sa-
las de aula de milhões de crianças brasi-
leiras, indo parar nos paletós de merca-
dores da fé? O preço desses quatro anos
de governo é incalculável.
A eleição de 2022 será duríssima, é
verdade, mas com uma grande diferen-
ça em relação a 2018. Os heróis do “com-
bate à corrupção” foram desmascarados
em toda a sua hipocrisia. Sergio Moro te-
ve suas decisões parciais anuladas e Lu-
la – vendido pela Lava Jato e pela mídia
como vilão nacional – foi absolvido de um
processo após o outro. Bolsonaro e seus
filhotes estão envolvidos até o pescoço
com casos de corrupção no governo, fa-
zendo com que o Brasil pudesse ver com
nitidez o modus operandi da corrupção
miliciana. Os moralistas sem moral es-
tão nus diante da nação.
miliciana. Os moralistas sem moral es-
A batalha será em dois tempos. O pri-
A batalha será em dois tempos. O pri-
meiro é derrotá-lo nas urnas e virar a pá-
gina do pesadelo dos últimos anos. Eleger
Lula com a maior margem possível e neu-
tralizar qualquer tentativa golpista que
questione a vontade popular. A segunda
será responsabilizar criminalmente a cor-
ja de milicianos que se apropriou da Repú-
blica. Não basta retirar Bolsonaro, seus fi-
lhos e seus cúmplices do poder. É preci-
so que paguem por todos os males que fi-
zeram ao País, do genocídio na pandemia
à milicianização do Estado brasileiro. •
CARTA CAPITAL
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