July 21, 2020

'Ghost of Tsushima' transforma filmes de samurai num deslumbrante jogo para PS4

Arte conceitual do jogo 'Ghost of Tsushima' Foto: Reprodução


Louis Chilton / The Independent

"The ghost of Tsushima", um ambicioso jogo de ação e aventura num mundo aberto ambientado no Japão do século XIII, é o último grande lançamento exclusivo do PS4. O jogo surgiu a partir de um único desejo, diz Brian Fleming, co-fundador da Sucker Punch Productions: criar algo em torno do combate corpo a corpo. Especificamente luta de espadas. Todo o resto — gênero, cenário, personagens — foi desenvolvido a partir daí.

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Como toda a equipe criativa principal “tinha uma afinidade por samurais”, eles começaram a pesquisar o Japão feudal, em busca de inspiração. Acabaram encontrando um relato das invasões mongóis na ilha japonesa de Tsushima, em 1274.

"Cara, isso é uma história de videogame", pensou Fleming, enquanto lia sobre "os 80 samurais que defenderam a ilha contra os Invasores mongóis”. A partir daquele momento, cerca de seis anos atrás, ficou claro para todos na Sucker Punch o que eles fariam a seguir — um jogo priorizando o combate acima de tudo.

Antes de "Ghost of Tsushima", a Sucker Punch era conhecida pelo popular "Infamous". O novo jogo mantém certas ideias dessa série — principalmente o ambiente de mundo aberto lindamente projetado —, mas é construído em torno de um sistema de combate totalmente diferente.

— Refinamos o sistema de combate ao longo de seis anos — diz Fleming.

Influência ou apropriação?

O trabalho seguia intenso até 2020. Quando a pandemia de coronavírus chegou, continuou com os desenvolvedores isolados em suas casas. Mesmo após o lançamento do jogo ser adiado, em junho, por três semanas, ele foi concluído "em cima do laço".

Parte da discussão em torno de "Ghost of Tsushima" gira em torno da apropriação cultural. O que dá a uma equipe de desenvolvedores americanos o direito de abordar e ganhar dinheiro com essa história especificamente japonesa? Mas Fleming logo aponta que o jogo não foi feito exclusivamente no oeste.

A Sucker Punch foi adquirida pela Sony em 2011 e ele descreve o relacionamento do estúdio com Shuhei Yoshida, ex-presidente da SIE Worldwide Studios da Sony, como "nossa vantagem mais importante".

— Entramos em contato com Shu primeiro e depois com a equipe da Sony Japão e dissemos: 'Temos essa ideia que queremos fazer. Isso é razoável:? Vocês podem nos ajudar a fazer isso?

O braço japonês da empresa participou de todo o projeto, revisando o conteúdo do jogo e "mantendo a Sucker Punch em um caminho que seria bem-sucedido e respeitoso, mantendo qualidade e sensibilidade". Como Fleming coloca, a equipe estava ansiosa para evitar "erros de ignorância".

Uma das críticas é a superficialidade de sua representação da cultura japonesa. Trata-se de uma queixa feita há alguns anos em relação ao filme "Ilha de cachorros", de Wes Anderson, também ambientado em uma versão fictícia do Japão. O jogo realmente quer entender e explicar a cultura japonesa? Ou está interessado apenas na estética: a caligrafia atraente, as roupas desconhecidas, a arquitetura idiossincrática?

Como em "Ilha de cachorros", a crítica é difícil de descartar, porque a estética é, além do combate, o ponto de venda mais forte do jogo.

É um jogo muito bonito — diz Fleming, com razão. — As flores roxas, o pôr do sol laranja, o verde ... É engraçado: um conselho que recebemos de nossos parceiros no Japão foi o quão importante era que o mundo fosse verde.

Modo Kurosawa

Jogo
Jogo 'Ghost of Tsushima' tem modo em preto e branco, em homenagem a Akira Kurosawa Foto: Reprodução

Os cantos de pássaros e sons ambiente vieram da própria ilha, graças à parceria com o braço japonês da Sony. Mas liberdades foram tomadas em outros aspectos do jogo. O mapa, por exemplo, é apenas parcialmente baseado em Tsushima, emprestando elementos visuais de outras áreas do Japão.

— Mesmo as espadas são de um período um pouco posterior à invasão específica que retratamos — admite Fleming. — É preciso ficar claro que isso não é um documentário, é um produto de entretenimento. Claro que existem algumas liberdades.

Os jogadores têm a opção de usar um filtro preto e branco, uma configuração conhecida como "modo Kurosawa". Para usar o nome, eles receberam as bênçãos e conselhos do espólio de Akira Kurosawa, o lendário diretor de cinema japonês. Fleming garante que a ideia vai bem além de uma citação vazia.

— É uma tentativa legítima de homenagear o trabalho dele. O jogo usa o nome dele, não um termo genérico, porque consideramos que ele teve um papel muito importante no desenvolvimento.

LegadoAkira Kurosawa ainda tem força de levar os samurais e o cinema para o futuro

O nome do modo preto e branco gerou críticas de cinéfilos nas redes sociais, uma vez que qualquer pessoa que tenha visto as obras de final de carreira de Kurosawa, como "Sonhos", sabe que alguns de seus filmes são cheios de cores.

Faz sentido que "Ghost of Tsushima" tente se aproximar de alguma maneira do legado de Kurosawa: o cineasta também teve uma relação complicada com empréstimos interculturais. Durante sua vida, foi frequentemente acusado de fazer os filmes mais americanizados entre seus contemporâneos no Japão. Sua obra era comparada em eespecial com a de Yasujiro Ozu, cujo estilo mais lento e temas domésticos supostamente comunicavam uma sensibilidade mais autenticamente japonesa. Era uma via de mão dupla, é claro: as marcas de Kurosawa podem ser vistas em todo o cinema de Hollywood durante a segunda metade do século XX.

Por mais redutivo que seja, o uso do nome Kurosawa é uma manobra deliberada, uma maneira de divulgar o jogo para a (maioria das) pessoas que não viram "Ran". Aqueles que conhecem Kurosawa apenas por "Os sete samurais" ou, indiretamente por filmes como "Guerra nas Estrelas". Mas não é como se os desenvolvedores da Sucker Punch não tivessem feito sua pesquisa — Fleming cita "Ran" como uma das influências centrais do jogo.

Entre outras influências estão "Yojimbo", o clássico de Kurosawa de 1961, e jogos como "Skyrim", "Red dead redemption" e "The Legend of Zelda: The Breath of the Wild". Fleming não menciona Assassin's Creed, com o qual o Ghost foi comparado regularmente na preparação para o lançamento do jogo, ou jogos recentes ambientados no Japão, como "Nioh" ou "Sekiro: Shadows Die Twice". Diferente desses jogos, "Ghost of Tsushima" rejeita elementos sobrenaturais; o plano sempre foi mantê-lo o mais realista possível.

— Nunca consideramos outra opção. A ideia era tratar de problemas e reações humanas.

Em um nível estético, Ghost of Tsushima é um triunfo; só isso já o coloca como um sucesso em potencial. A Sucker Punch pode ter escolhido Tsushima como uma conveniência, um pretexto para estudar a mecânica do combate com espadas. Mas se o título apresentar uma pequena fração de seus jogadores ao gênio de Akira Kurosawa, então o trabalho já terá sido justificado.

O GLOBO

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