March 2, 2019

Mengele, Stroessner e Bolsonaro


MAURO VENTURA

Josef Mengele foi o mais cruel dos médicos nazistas. Conhecido como o “Anjo da morte”, era metódico e pragmático, como mostra reportagem de Maurício Horta na revista "Superinteressante". Por conta de uma epidemia de tifo no campo de concentração Auschwitz-Birkenau, mandou matar todas as 600 mulheres de um bloco. Em outra ocasião, resolveu da seguinte forma uma crise de desabastecimento de comida: em vez de ampliar a oferta, reduziu a procura. Durante dez dias, enviou diariamente para a câmara de gás cerca de 4 mil mulheres.
São apenas dois casos da longa lista de atrocidades de Mengele. Ele tinha especial predileção por cobaias humanas. Praticou em escala industrial experimentos de “higiene racial”, como escreve Horta. Usava crianças, anões, pessoas com deficiências. Numa ocasião, na tentativa de reproduzir olhos azuis, suas injeções deixaram crianças cegas. Seu maior foco de interesse eram os gêmeos. Promovia, por exemplo, amputações e infectava os irmãos com doenças. "Depois, o médico matava os dois e comparava os corpos", escreve o jornalista.
Com a derrota de Hitler, ele conseguiu fugir da Alemanha para a Argentina. Mas os caçadores de nazistas estavam em seu encalço e, quando o governo alemão pediu sua extradição, escapou para o Paraguai do ditador Alfredo Stroessner. Foi acolhido de braços abertos. Stroessner concedeu nacionalidade paraguaia a Mengele. Não foi o único. Como contam os jornalistas Ariel Palacios e Daniel Salgado na revista "Época", o país recebeu nos anos 1950 centenas de outros criminosos de guerra, como Eduard Roschmann, o “Açougueiro de Riga”, que executou 30 mil judeus. Mengele ficou por lá até que, com medo de ser capturado pelos israelenses, fugiu para Brasil.
A receptividade calorosa que os nazistas desfrutavam em solo paraguaio não é o único dos defeitos de Stroessner. Como listou a “Época”, eis alguns outros:
1. Stroessner era um pedófilo em série. Criou um harém para que ele e seus colegas cometessem estupros, em especial de meninas virgens entre 10 e 15 anos. Segundo cálculos dos investigadores, somente ele teria violado mais de 1.600 crianças em 35 anos de ditadura, de 1954 a 1989.
2. Durante o regime totalitário, o Paraguai, sob suas bençãos, tornou-se um paraíso do contrabando de cigarros, bebidas, carros de luxo, eletrônicos e drogas.
3. Como em toda ditadura, a oposição era censurada e silenciada, e ele costumava vencer as “eleições” com 90% dos votos - em 1958 o percentual atingiu 97,3%.
4. Na ditadura militar paraguaia, foram assassinados entre 4 mil e 5 mil civis. E quase 19 mil pessoas foram vítimas de torturas físicas, sexuais e psicológicas. O general chegou a criar um campo de concentração. Durante as sessões, Stroessner gostava de ouvir pelo telefone os gritos dos presos políticos sendo torturados. Como conta a revista, o presidente e o principal torturador do regime, Pastor Coronel, "apreciavam o uso da serra elétrica e do maçarico para torturar. Vários opositores foram cortados ao meio com a serra elétrica. Outros eram queimados lentamente, e de forma localizada, com um maçarico".
5. O ditador enriqueceu com a corrupção. Após ser deposto por um golpe de estado, ele se exilou no Brasil. O juiz que tentou extraditá-lo estimou sua fortuna em US$ 500 milhões. Na mesma reportagem da "Época", o professor Mauricio Santoro, cientista político e professor do departamento de relações internacionais da UERJ, diz: "A ditadura de Stroessner foi bastante corrupta, incluindo propinas que ele cobrou dos brasileiros para a construção de Itaipu.”
Aos olhos do mundo, o ditador paraguaio era narcotraficante, estuprador, pedófilo, corrupto, torturador, sádico, sanguinário, assassino e acolhedor de nazistas. Para Bolsonaro, que fez questão de homenagear "o nosso general Alfredo Stroessner" na posse do novo diretor da hidrelétrica de Itaipu, ele era um "estadista" e um "homem com visão".

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