September 1, 2018

Morrer de véspera


TEREZA CRUVINEL

“Pressões enormes” atuaram, entre a noite de quinta-feira e a tarde de ontem, para que o TSE antecipasse o julgamento dos pedidos de impugnação da candidatura do ex-presidente Lula, barrando, por tabela, seu acesso ao horário eleitoral de hoje. Com a degola antecipada de Lula, antes dos cinco dias de prazo para as alegações finais dos impugnantes, o TSE atingiu em cheio a estratégia eleitoral petista da transferência de votos, ao impedir a aparição de Lula no programa eleitoral de hoje. Essa foi a razão da pressa e das pressões.

Na noite de quinta, o tribunal chegou a divulgar uma pauta para a sessão de ontem, que não continha qualquer matéria relacionada a Lula. Ontem a presidente da corte, Rosa Weber, atendeu aos apelos do relator, ministro Roberto Barroso, para incluir as impugnações na pauta. A candidatura de Lula seria impugnado mais cedo ou mais tarde, mas o TSE aceitou o risco de desgastar-se, atropelando a lei e os prazos, para impedir que ele falasse como candidato, hoje, no rádio e na TV. Seriam aparições provisórias, mas poderiam ser fortemente indutoras de voto no substituto. A decisão antecipada pode aumentar as desconfianças internas e externas sobre o Judiciário brasileiro e também fortalecer a narrativa do Lula perseguido, favorecendo o novo candidato do PT.

De pressões falavam até os corredores do TSE antes do início do julgamento. Quem garantiu que fossem atendidas foi Barroso, ao convencer Rosa a incluir o caso na pauta, de última hora. Dificilmente os ministros terão tido tempo para ler a defesa de 200 páginas, apresentada pelos advogados de Lula perto da meia noite de quinta-feira. Rosa baixou os olhos quando um deles, Luiz Fernando Pereira, recordou o que ela disse ao refugar, há algumas semanas, o pedido de impugnação antecipada do MBL: “Vamos observar os ritos e os prazos. O direito tem seu tempo”. Ontem ela mudou de ideia.
Dois alvos

A lei sempre garantiu aos candidatos sub judice o acesso ao horário eleitoral e o direito de praticar atos de campanha enquanto o tribunal não decidisse sobre suas candidaturas. Barrar previamente o acesso de Lula à TV seria, portanto, uma ilegalidade e um casuísmo gritantes demais. O jeito foi antecipar o julgamento da própria inelegibilidade, queimando o prazo que ainda havia pela frente.

A defesa fez sustentações brilhantes porém inúteis. Barroso foi um verdugo frio e preciso. Sapateou sobre a determinação do Comitê de Direitos Humanos da ONU, negando-lhe o efeito vinculante. E desculpou-se, antes de enfiar a faca e torcer: não se movia por razões pessoais, políticas ou ideológicas. Pensava nas instituições, na Constituição e na democracia. Queria garantir que o eleitorado conhecesse logo o quadro definitivo de candidatos e não via razões para aguardar mais cinco dias para apresentar seu voto. A decisão devia acontecer antes do início do horário eleitoral, para evitar a situação em que “no meio do caminho haja uma substituição”.

Exatamente a situação desejada pelo PT. Com esta ultima frase, Barroso explicitou cristalinamente que tinha um duplo alvo: antecipar a degola de Lula e também impedir que o PT tirasse proveito de seu favoritismo em favor do candidato substituto.

Surpreendente foi o voto do ministro Luiz Fachin, ao votar pelo acolhimento da recomendação do comitê da ONU, até que Lula tenha esgotados os recursos contra sua condenação penal. Se houver recurso ao STF, haverá lá outros ministros que pensam como ele? Mas depois dele, votaram com o relator os ministros Jorge Mussi, Og Fernandes e Admar Gonzaga, perfazendo a maioria de 4 a 1, a favor da impugnação.

O PT agora terá que reajustar sua estratégia. Nada será decidido antes da reunião que Haddad e outros terão com Lula na segunda-feira. A transferência de votos talvez ocorra do mesmo modo. Talvez seja mais complicado agora executá-la. Já a sessão de ontem do TSE ficará na história como um rasgado exercício do casuísmo eleitoral.

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