August 9, 2018

Congresso Antifeminista une cristãs, 'amiga pessoal' de Bolsonaro e 'homem mais machista'


Beijaço na Candelária contra a homofobia e a defesa de um Estado laico, em 2014; na foto, Bia Spring (cabelo escuro) e Sara Winter (cabelo claro)
Beijaço na Candelária contra a homofobia e a defesa de um Estado laico, em 2014; na foto, Bia Spring (cabelo escuro) e Sara Winter (cabelo claro) - Paulo Araújo - 8.ago.2018/ Agência O Dia


Anna Virginia Balloussier
Rio de Janeiro 
 
“Todo mundo aqui já viu a foto de duas meninas peladas se beijando na frente da [igreja da] Candelária? Sou eu, gente.”

Sara Winter não tem orgulho em admitir, mas sim: era ela, gente. Aquela feminista que fundou o Femen Brasil, braço do grupo de origem ucraniana famoso por protestar de topless. Causas pelas quais militou por três anos e que hoje vão contra tudo o que a jovem de 26 anos acredita.

“Graças a Deus”, Sara não é mais a mesma. No sábado (4), assumiu um papel bem distinto daquele que a colocou no radar da mídia em tempos de ativismo nudista: organizadora do 1º Congresso Antifeminista, numa igreja com o nome da avó de Jesus, Sant’Ana.

No rol de palestrantes, nomes como Ana Caroline Campagnolo, autodefinida “antimarxista, antifeminista e cristã”. Ela ganhou a estima de conservadores ao processar a orientadora de mestrado, que desistiu de supervisionar seu projeto “Virgindade e Família: A Mudança de Costumes e o Papel da Mulher Percebido Através da Análise de Discursos em Inquéritos Policiais da Comarca de Chapecó”.
Pura perseguição religiosa, segundo Ana Caroline (a docente nega).
Outro: o aluno de filosofia Felippe Chaves, de frases como “homens afeminados buscam ideologias como o feminismo pois, nelas, encontram justificativas para sua própria falta de masculinidade”. Pelo WhatsApp, Sara o descreve assim: “Conhecido pelas feministas como ‘o homem mais machista do Brasil’, kkkkk”.
Já o tema central do encontro não é motivo de risos para ela: o aborto,  que seria discutido nos próximos dias no Supremo Tribunal Federal. Sara já fez um. Arrepende-se amargamente. “Vou contar um pouquinho da história da Sarinha para vocês.” (Chegaremos lá.)
Ocupam os bancos da igreja muitos homens, com camisetas de rock (Ramones), lemas “pró-vida” e, no caso do militar Luiz Cesar da Silva, 36, o slogan “waves sea” (ondas, mar).
Para explicar por que é “radicalmente contra o aborto”, saca um “exemplo pessoal”. Sua cunhada, grávida, tinha um tumor no intestino. Os médicos aconselharam o procedimento para que começasse o tratamento o quanto antes.
Ela bateu o pé: preferia a gravidez. “O médico falou que assim não conheceria o filho. Com a graça de Deus, conseguiu” parir a criança, conta Luiz. A cunhada iniciou recentemente a quimioterapia para deter um câncer que acabou se espalhando pelo corpo.
Para o militar, o feminismo, com seu mote “meu corpo, minhas regras”, promove “ataques contrários aos homens”, ao pregar que “todo homem é nocivo”. Não teve, diz, “o desprazer de passar por isso”, mas amigos já foram criticados por “se dirigir a uma mulher e ela achar que é flerte, até um bom dia vira flerte”.
Entre as mulheres, pouco menos da metade do público de cerca de 300 pessoas, está Jessica Souza, 28, mulher “do lar” que carrega no colo seu caçula Nicolas, de sete meses.
“Quase fui vítima de feminicídio”, conta a mãe de três filhos, “cada um de um pai”. Com o último companheiro, “apanhei, tive cortes na perna”, diz a moradora de Nova Iguaçu (RJ). Hoje ela se define como “militante “pró-vida”, após “pensar em dar ou tirar meu filho, a querer o mal dele”.
O que o feminismo significa para ela, num encontro que traz bonequinhos de fetos na mesa do coffee break e trata o termo como palavrão? “Acredito que pode ser algo bom”, Jéssica afirma e depois se desculpa. “Não conheço muito bem essa palavra.”
Sara conhece, e bem. “Somos só pessoas que se opõem radicalmente à ideologia feminista, que quer promover uma agenda ideológica de esquerda”, diz à Folha a candidata a deputada federal pelo DEM-RJ e “amiga pessoal” de Jair Bolsonaro.
Reproduz argumentos corriqueiros do presidenciável do PSL, como ao defender o armamento civil: "Uma arma na bolsa da mulher faz mais diferença do que a lei do feminicídio”.
Também rejeita que as transexuais usem os banheiros femininos. “Essas pessoas sofrem? Sofrem. Mas, no conceito de aristotelismo, democracia é o bem comum para a maioria. E a maioria das mulheres de verdade tem glândulas mamárias, os cromossomos XX.”
“Vemos feminista lutando pra deixar pelo do sovaco crescer, usar roupa curta, pelo aborto. Mas não para tirar prostitutas da rua”, afirma.
Ela já se prostituiu. À “história de Sarinha”, pois.
No microfone, conta que foi expulsa de casa por um irmão do PCC e, aos 16, trocava sexo por uns trocados. “Há muitas pessoas que defendem a prostituição como empoderamento. A feminista que diz isso nunca precisou vender seu corpo para ter dinheiro pra comer.”
Seis anos depois, já engajada no feminismo, engravidou de um rapaz que deu no pé. Ficou “desesperada”, pois “vivia como hippie, dormindo em ocupações”. Procurou ajuda numa comunidade virtual feminista e lá, diz, foi aconselhada a abortar. Argumentos para convencê-la: seria uma “boa experiência empírica” e “você vai ficar gorda, com peito caído” caso tivesse o bebê.
Tomou quatro comprimidos abortivos, teve complicações com o procedimento e por pouco não ficou infértil. Hoje é mãe de Hector, 3, e noiva do militar Augusto. “Deus foi tão esperto que me deu um filho homem e um sargento do Exército para por um pouco de disciplina na minha vida.”

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