ÁLVARO PEREIRA JÚNIOR
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Brasil, século 20, fim dos anos 70, começo dos 80. Um fim de mundo,
isolado e sem informação, onde ninguém sabe nada de nada. No resto do
planeta, um terremoto revoluciona a música: o punk e o pós-punk enterram
com fúria o movimento hippie.
Mas não por aqui. O Brasil ainda era o mundo do Clube da Esquina, da canção de protesto, de zumbis baianos sobreviventes do tropicalismo.
E o rock local? Uma desgraça, misto de progressivo com heavy metal bicho-grilo. Discos estrangeiros chegavam com anos de atraso, quando chegavam.
Em meio a esse panorama musical tão sombrio, alguns pontos de luz brilhavam. O radialista e músico Kid Vinil, morto nesta sexta (19) aos 62 anos, era o maior deles.
Ultrainformado, era um raro emissário, neste imenso caipiródromo chamado São Paulo, do que de mais interessante se fazia em música no exterior.
Trabalhava em gravadoras, TVs, escrevia para jornais (inclusive para a "Ilustrada"), atuava em rádios. E foi no rádio que deixou suas maiores contribuições, como o programa "New Beat", domingo à tarde, numa emissora para playboys chamada Antena 1.
Só o Kid para ter coragem de conseguir um programa numa estação que não tinha nada a ver com o som que ele tocava.
A essas alturas, é um clichê descrever a cena, mas, para a minha geração, ela foi muito real: dedo a postos no botão de "rec" do gravador de fita cassete, esperando o "New Beat" começar.
Porque era só lá que a gente podia ouvir –e registrar– desde o punk mais ortodoxo, tipo Sex Pistols e Dead Kennedys, até as inovações insanas vindas principalmente do rock inglês: Alian Sex Fiend, Sisters of Mercy, June Brides, Sex Gang Children, Smiths.
Naquele mundo off-line, Kid Vinil era a nossa internet, nosso canal de conexão com o que de realmente importante acontecia no mundo musical.
Como pessoa, não poderia ser mais doce. Boa praça, conciliador, amigo. No começo deste século, trabalhamos (vamos dizer assim) por algum tempo numa mesma rádio, a Brasil 2000, onde ele dominava o final de tarde e eu fazia o programa "Garagem", às segundas, com os amigos André Barcinski e Paulo César Martin. Nós três aprontamos algumas por lá e Kid, um gentleman que tinha entrada com a direção, sempre segurou a nossa onda.
Quando ficou doente, há cerca de um mês, amigos e fãs precisaram fazer uma vaquinha para trazê-lo, do interior de Minas, onde tinha sofrido um colapso, para um hospital um pouco mais bem equipado de São Paulo.
Isso diz muito sobre o estilo de vida que o Kid seguiu: seu negócio era música, a mais nova e mais instigante possível, em fluxo permanente. Dinheiro não era a dele.
Como músico, teve um sucesso avassalador, o roquinho new wave "Sou Boy". Em qualquer país decente, só essa música seria suficiente para garantir a ele uma vida muito confortável por muito tempo. Mas o Brasil é isso o que a gente está vendo. E ele ainda ralava pelo interior destes tristes trópicos, que agora se dão ao luxo de perder, tão cedo, o grande Kid Vinil.
Mas não por aqui. O Brasil ainda era o mundo do Clube da Esquina, da canção de protesto, de zumbis baianos sobreviventes do tropicalismo.
E o rock local? Uma desgraça, misto de progressivo com heavy metal bicho-grilo. Discos estrangeiros chegavam com anos de atraso, quando chegavam.
Em meio a esse panorama musical tão sombrio, alguns pontos de luz brilhavam. O radialista e músico Kid Vinil, morto nesta sexta (19) aos 62 anos, era o maior deles.
Ultrainformado, era um raro emissário, neste imenso caipiródromo chamado São Paulo, do que de mais interessante se fazia em música no exterior.
Trabalhava em gravadoras, TVs, escrevia para jornais (inclusive para a "Ilustrada"), atuava em rádios. E foi no rádio que deixou suas maiores contribuições, como o programa "New Beat", domingo à tarde, numa emissora para playboys chamada Antena 1.
Só o Kid para ter coragem de conseguir um programa numa estação que não tinha nada a ver com o som que ele tocava.
A essas alturas, é um clichê descrever a cena, mas, para a minha geração, ela foi muito real: dedo a postos no botão de "rec" do gravador de fita cassete, esperando o "New Beat" começar.
Porque era só lá que a gente podia ouvir –e registrar– desde o punk mais ortodoxo, tipo Sex Pistols e Dead Kennedys, até as inovações insanas vindas principalmente do rock inglês: Alian Sex Fiend, Sisters of Mercy, June Brides, Sex Gang Children, Smiths.
Naquele mundo off-line, Kid Vinil era a nossa internet, nosso canal de conexão com o que de realmente importante acontecia no mundo musical.
Como pessoa, não poderia ser mais doce. Boa praça, conciliador, amigo. No começo deste século, trabalhamos (vamos dizer assim) por algum tempo numa mesma rádio, a Brasil 2000, onde ele dominava o final de tarde e eu fazia o programa "Garagem", às segundas, com os amigos André Barcinski e Paulo César Martin. Nós três aprontamos algumas por lá e Kid, um gentleman que tinha entrada com a direção, sempre segurou a nossa onda.
Quando ficou doente, há cerca de um mês, amigos e fãs precisaram fazer uma vaquinha para trazê-lo, do interior de Minas, onde tinha sofrido um colapso, para um hospital um pouco mais bem equipado de São Paulo.
Isso diz muito sobre o estilo de vida que o Kid seguiu: seu negócio era música, a mais nova e mais instigante possível, em fluxo permanente. Dinheiro não era a dele.
Como músico, teve um sucesso avassalador, o roquinho new wave "Sou Boy". Em qualquer país decente, só essa música seria suficiente para garantir a ele uma vida muito confortável por muito tempo. Mas o Brasil é isso o que a gente está vendo. E ele ainda ralava pelo interior destes tristes trópicos, que agora se dão ao luxo de perder, tão cedo, o grande Kid Vinil.
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