March 20, 2016

Quando as casas caírem


Celso Rocha de Barros

 

É natural que petistas se sintam abalados com a delação de Delcídio do Amaral e com o depoimento de Lula na última sexta. Já a comemoração da oposição é um mistério: ou concordam com os petistas exaltados, que dizem que a Lava Jato é só uma jogada contra o PT, ou não andam prestando atenção no que está acontecendo ao seu redor. Se a Lava Jato for até o fim, muitas outras casas cairão.

Segundo a reportagem da "Istoé", Delcídio denunciou um acordo entre governo e oposição para livrar Lula no Mensalão. Se houve um acordo desses, não foi feito com nenhum peso-leve. Sargento não assina armistício.

Pessoalmente, duvido que Delcídio tenha provas do acordo (se as tinha, deve ter sido o dono da República nos últimos anos). Mas tampouco vimos provas contra Dilma, e a maioria dos analistas está tratando as denúncias incomparavelmente menos graves contra a Presidente como já demonstradas.
Além disso, há uma boa chance de que a investigação sobre as contribuições de campanha cheguem na oposição. Fontes próximas a Marcelo Odebrecht revelaram à coluna de Mônica Bergamo de 1º de março que, se o empresário optar pela delação, entregará tanto o PT quanto a oposição. Hoje sabemos que contribuir para as campanhas do PT era um investimento muito lucrativo. Investir na alternativa (doar para a oposição, como foi feito) era crise de consciência? Os investigadores da Lava Jato devem estar perguntando isso aos delatores, suponho.

É importante saber isso, porque não ser otário sempre vale alguma coisa. Eduardo Cunha é só o caso mais claro, mas tem muita gente querendo entregar o PT para a opinião pública na esperança de que isso arrefeça os ânimos e permita mudar de assunto antes que o resto da turma seja pego. O discurso que coloca o PT como único participante do esquema das empreiteiras é um plano de fuga, exatamente como o túnel do traficante mexicano El Chapo.

A política brasileira sempre foi financiada por empreiteiras e outras empresas que tinham negócios com o governo. É ótimo que os órgãos de fiscalização finalmente tenham atacado esse problema. Mas o que fazer diante da crise do sistema?

Minha sugestão: prendam quem tiver que ser preso, mas preservem os partidos. Os únicos partidos fáceis de fundar são os picaretas. Os que nasceram nas disputas concretas da sociedade civil são construções fáceis de quebrar, mas difíceis de construir. Se o PT afundar porque petistas roubaram, outros ladrões aparecerão, mas talvez não haja outro movimento sindical como o do ABC. Se PSDB, PMDB e DEM afundarem por motivo análogo, outros ladrões aparecerão, mas, se Deus quiser, não vai ser necessário lutar contra a ditadura.

Tratem com cuidado o que a sociedade civil já conseguiu fazer em termos de auto-organização. Se novos partidos igualmente legítimos se fortalecerem, como a Rede, ou o Partido Novo, que se aliem aos que já existem, ou tentem substituí-los após uma série de vitórias eleitorais. Com uma polícia e um Judiciário eficientes, com o que já temos de sociedade civil e imprensa livre, é só deixar que o sistema político evolua naturalmente.

Fazer o contrário é ser feito de otário por gente que até mesmo o sistema atual achou picareta ou demagógica demais.


FOLHA DE SÃO PAULO, 7 DE MARÇO DE 2016

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