A economia interna do setor cultural é toda montada nisso (em notas de favor).
Quando você vai contratar o contrarregra, a camareira, o operador de luz, o cara que constrói o adereço, como eles não são pessoa jurídica compram nota dessas empresas.
Se você for pagar com RPA — prestação de serviço — tem que descontar Imposto de Renda, INSS etc.
Até três, quatro anos atrás, a gente não conferia a procedência da nota, por falta de informação. Hoje, quando chega uma nota fiscal, a gente confere. A gente tira certidão negativa de dívida de INSS e vê o contrato social.
Houve uma profissionalização obrigatória no setor.
Hoje em dia não dá mais para ser como era, porque vai ter análise pelo MinC e depois pelo Tribunal de Contas.
Mas não posso ter uma investigação sobre a procedência da nota. Preciso é saber se a pessoa está apta a prestar o serviço daquela função e se a empresa não está devedora do INSS. Muitas vezes chegam notas que nem sabemos que são compradas.
Lembro de um diretor famoso que tinha empresa, mas não queria dar nota fiscal dele.
Então ele comprou. Depois ele descobriu que era fria, o endereço era de um salão de beleza. E ainda por cima no lugar funcionava uma gráfica. Recebi essa nota, mas na época, há oito anos, eu não tinha ideia de que poderia receber uma nota fria.
Essa conferência que nós, produtores, fazemos dá muita brigalhada. Às vezes, são mais de 500 pagamentos no universo de uma peça. Só vou pagar quando vir o contrato social e depois de tirar a certidão do INSS. Isso pode demorar dias.
O contratado reclama, xinga, diz: “Seu bandido, não está me pagando.” Tem gente que acaba pagando logo a esse sujeito, por não aguentar mais a reclamação.
O produtor quer se resguardar, e o contratado quer receber logo e pagar menos imposto. Ele acaba o trabalho dele e quer receber imediatamente.
O grande problema é o caso de técnicos, costureiros, camareiras etc, mas há alguns artistas renomados e diretores famosos que também compram nota. Muita gente conhecida nacionalmente compra nota.
Com essa alta tributação, o setor não tem como se formalizar.
E é preciso a formalização.
A solução é o setor todo poder ser Supersimples. Além disso, abrir uma empresa custa caro, e é preciso pagar contador todo mês. Como é que um operador de luz vai poder fazer isso? Teria que ter uma forma diferenciada para essas profissões técnicas ou então se formarem cooperativas.
Não dá para entender o produtor que contrata essas empresas para receber patrocínio.
É uma burrice, o dinheiro vai para a conta dessas pessoas, e quem garante que vão repassar? Só se empresa dele estiver inabilitada no MinC. Ou então só se não tiver lei de incentivo.
Aí, se eu der a minha nota, pago 17,9%; mas se dou a nota de 6%, economizo.
O governo sabe que isso existe, mas, como não vê solução, deixa ficar dessa forma.
Sabe que é assim, mas, se todo mundo fizer o correto, vai desmontar o setor.
O Globo, 2 de agosto de 2009
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