Rodrigo March
ilustração de Cruz
Cuidado com o que você anda escrevendo no Twitter, Facebook, MySpace, comunidades da qual participa no Orkut, vídeos que divulga no YouTube, fotos em blogs etc. A exposição de empresas, funcionários e clientes nas chamadas redes sociais já provoca demissões. Os casos são polêmicos, porque vão desde situações claras para dispensa a outras nem tão óbvias assim, ou quando o empregado não tem a intenção de prejudicar terceiros. Além disso, a discussão envolve questões como privacidade e anonimato.
Nos Estados Unidos, uma professora de artes do Texas teve sua aposentadoria antecipada, depois que alunos descobriram fotos dela nua no Flickr. Ela disse que se tratava de arte. Mas veja esse exemplo que aconteceu em Passo Fundo, no Rio Grande do Sul. Um motorista de uma empresa de ônibus foi demitido, em 2007, sob o argumento de que integrava uma comunidade que hostilizava a companhia no Orkut, onde também teria feito um comentário ofensivo contra a mesma.
O motorista tenta reverter a demissão por justa causa na Justiça do Trabalho, mas já perdeu em duas instâncias. Ele alega que qualquer pessoa poderia ter cadastrado o seu nome de forma indevida na comunidade.
Em dezembro, os desembargadores da região confirmaram a decisão do juiz de primeiro grau, que entendeu que havia provas suficientes para responsabilizá-lo. Ele se identificava com o mesmo ícone que aparecia em seu perfil no Orkut, no qual havia informações detalhadas sobre sua vida, inclusive fotos de família.
Nada de falar de colega ou cliente
— Hoje temos muitos casos como esse nos tribunais. Não são poucos não — observa o advogado Leandro Bissoli, sócio do escritório Patrícia Peck Pinheiro Advogados.
Segundo Bissoli, empregados que criam comunidades da empresa onde trabalham ou que falam mal de algum colega nas redes sociais estão entre os mais demitidos: — Normalmente, essas são as situações mais comuns. Temos ainda funcionários, como operadores de telemarketing, que fazem chacota de clientes em fóruns de discussão.
Marcia Galdino, gerente da ARK, rede distribuidora de óculos, demitiu um estoquista que estava fazendo um blog em nome da empresa sem autorização. O fato foi considerado um agravante, já que ele vinha faltando seguidamente, ressalta ela: — Acho até bacana a iniciativa, mas ele deveria ter nos comunicado, para que o orientássemos. O blog trazia fotos em que apareciam armações de concorrentes nossos.
Poderia ter nos prejudicado.
A consultora de RH Ana Carolina Mafra, diretora da Equipe Certa, acha que o comportamento nas redes sociais é apenas um fator que colabora para a demissão: — Ainda não vi um caso de um ótimo empregado que tenha cometido um deslize nas redes sociais.
Mas há exemplos de pessoas que cometem deslizes sem intenção, conta Leandro Bissoli: — Tem gente que participa de comunidades ligadas à tecnologia ou a áreas relacionadas à empresa e acaba, até sem querer, revelando informações confidenciais.
Daniela Braun, editora-executiva do site IDG Now!, lembra que já existem ferramentas para identificar quem faz um comentário na rede, mesmo que no anonimato: — No Twitter, alguns pesquisadores descobriram como reconhecer perfis falsos. Se uma pessoa revela uma informação que poucos sabem, não é difícil descobrir quem foi.
Daniela percebe que as pessoas estão se expondo mais nas redes sociais, por causa da crise: — Em épocas assim, todos querem se mostrar, vender o seu peixe, até mesmo os empregados, que querem aparecer para ver se surge alguma nova oportunidade.
O fato é que as empresas estão cada vez mais atentas às mancadas na internet. Elas monitoram as redes por conta própria (caso de grandes organizações ou as que lidam com a segurança da informação) ou contratam o serviço. O escritório de Bissoli tem uma área específica para fazer esse trabalho: — Também damos consultoria a departamentos jurídicos e de RH, dizendo se tal conduta é ou não passível de demissão. As redes sociais são muito dinâmicas e as empresas não conseguem acompanhá-las.
Como se comportar no mundo virtual, então? Especialistas dão um conselho básico: adote a mesma postura profissional do ambiente físico.
Quanto às empresas, a sugestão é que divulguem regras claras
ROTINA CHATA: Na Inglaterra, a adolescente Kimberley Swann, de 16 anos, foi demitida este ano, três semanas após ser contratada, depois de escrever no Facebook que achava chata sua rotina na Ivell Marketing & Logistics. A mãe da jovem diz que ela sequer mencionou o nome da companhia e foi injustiçada.
COLEGAS EM PAUTA: A designer Heather Armstrong, de Utah, nos EUA, foi demitida, em 2002, um ano após começar a escrever um blog, que incluía histórias sobre pessoas da empresa. O blog ainda existe, mas agora traz um recado: “Nunca escreva sobre trabalho na internet, a menos que seu chefe saiba”.
ÓDIO AOS ALUNOS: Uma professora da CharlotteMecklenburg Schools, nos Estados Unidos, acabou sendo suspensa, no ano passado, porque declarou no Facebook que odiava seus alunos.
O Globo, 26 de abril de 2009